Bruxelas continua a duvidar que Portugal consiga cumprir as regras europeias

Numa repetição da divergência de previsões dos últimos anos, a Comissão recomenda que sejam tomadas medidas para cumprir as metas orçamentais deste ano e do próximo.

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Pierre Moscovici, comissário europeu para os Assuntos Económicos e Financeiros LUSA/STEPHANIE LECOCQ

A Comissão Europeia voltou esta quarta-feira a revelar as suas dúvidas em relação à capacidade de Portugal atingir em 2020 o objectivo de médio prazo para o saldo orçamental estrutural, recomendando que sejam tomadas medidas de consolidação adicionais já no decorrer deste ano.

Nas recomendações específicas a cada um dos países da União Europeia, realizadas após a análise dos programas de estabilidade entregues pelos governos, os responsáveis da Comissão Europeia dizem, em relação a Portugal, que continua a verificar-se “um risco de desvio significativo” de incumprimento do ajustamento orçamental recomendado ao país tanto para 2019 como para 2020.

Em particular, a Comissão assinala que foi recomendado a Portugal que, em 2019, a taxa nominal de crescimento da despesa primária líquida (a despesa que não inclui os juros e medidas discricionárias e extraordinárias) não ultrapassasse os 0,7%, de forma a que o défice estrutural caísse 0,6 pontos percentuais. E agora, diz o relatório publicado por Bruxelas, “existe o risco de um desvio significativo face ao ajustamento recomendado em 2019”.

Para 2020, a análise da Comissão é semelhante. Neste caso, aquilo que Bruxelas diz ser necessário é uma taxa de crescimento da despesa líquida primária não superior a 1,5%, para que o saldo estrutural possa melhorar em 0,5 pontos e atingir o objectivo de médio prazo de zero que foi definido para Portugal. Também aqui, a Comissão considera que existe o “risco de desvio significativo”. Em relação a 2020, Bruxelas teme ainda que a regra de redução da dívida pública possa não ser cumprida por Portugal.

No Programa de Estabilidade, o Governo traça um cenário de cumprimento das regras orçamentais europeias, com o país a atingir o objectivo de médio prazo para o saldo estrutural.

Para explicar a diferença de opinião face ao Governo, a Comissão assinala, em particular, que “as medidas necessárias para suportar as metas para o défice de 2019 em diante não foram suficientemente especificadas”.

E, ao nível das suas finanças públicas, recomenda ao país que “atinja o objectivo orçamental de médio prazo em 2020”, “dando prioridade às despesas que contribuam para o crescimento económico, ao mesmo tempo que se fortalece o controlo global da despesa e a eficiência nos custos”. Bruxelas pede ainda que os níveis de orçamentação sejam adequados, lembrando as dívidas aos hospitais, e apela a que se melhore “a sustentabilidade financeira das empresas públicas”.

A Comissão recomenda que, na eventualidade de existência de ganhos orçamentais extraordinários, estes sejam utilizados para reduzir mais rapidamente a dívida pública.

O cumprimento das metas orçamentais pode ser feito, indica ainda o relatório, não sendo preciso incluir nessa análise a despesa que o Governo conta realizar este ano com a prevenção dos fogos. A Comissão diz que o Executivo português indicou, em carta enviada no passado dia 9 de Maio, que esta despesa, considerada de carácter excepcional irá ascender este ano a 0,04% do PIB, isto é, cerca de 80 milhões de euros.

As divergências entre a Comissão Europeia e o Governo em relação à capacidade do país para cumprir as metas orçamentais tem sido permanente ao longo da última década. Nos últimos anos, os dados finais das contas públicas têm vindo a dar razão ao governo nas suas estimativas, o que levou a que Portugal saísse do Procedimento por Défice Excessivo, mesmo depois de a Comissão ter alertado que havia um risco de desvio significativo face às metas orçamentais.

Pela positiva, este ano, Portugal volta a ocupar um papel discreto no conjunto das avaliações feitas aos países da União Europeia, tendo o maior destaque ficado para a Itália, país para o qual foi dado o primeiro passo para uma eventual abertura de um procedimento por défices excessivos.

Para além das finanças públicas, a Comissão deixa mais recomendações de política a Portugal. No mercado de trabalho pede medidas que reduzam a sua segmentação (diferença de tratamento entre as pessoas que têm contratos a termo e as pessoas com contratos sem termo) e melhorem as qualificações da população. Ao nível do investimento, Bruxelas pede uma maior aposta na área da investigação e desenvolvimento, transporte ferroviário, infra-estruturas de transporte e transição energética.

O elevado nível do crédito malparado na banca continua a ser uma preocupação, com a Comissão a recomendar “um aumento da eficiência dos procedimentos de insolvência e recuperação das empresas”.

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