O Bloco esteve “num cerco amigável” para criticar as elites e citar Chico Buarque

O Bloco de Esquerda parou em Almada, mas não respondeu aos ventos do Montijo e das Caldas da Rainha, e não comentou as declarações de socialistas nem de centristas.

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A dois dias do final da campanha, a caravana bloquista meteu prego a fundo e intensificou a agenda, atravessando o Douro e o Tejo, de Vila Nova de Famalicão até Almada. O desvio fez-se por terras alentejanas, com uma curta passagem por Évora. Contas feitas, foram mais de 570 quilómetros para “andar nas ruas, andar pelo país e falar com toda a gente”, resumia Marisa Matias. À espera da comitiva do Bloco de Esquerda em Almada estavam mais de 250 apoiantes, distribuídos por um “cerco amigável”, como apelidaria o número dois da lista, José Gusmão. A sala da Sociedade Incrível Almadense encheu-se até às galerias e ecoou os aplausos aos discursos dos candidatos, com Chico Buarque, Prémio Camões, a ser a figura mais citada da noite. 

Num dia marcado por ataques do CDS e do PS ao Bloco de Esquerda, Catarina Martins e Marisa Matias concentraram os discursos — já com sabor a balanço final — na luta contra a precariedade, nas críticas às elites e à banca, e escolheram não responder aos recados e perguntas lançadas por Nuno Melo, Pedro Marques e Paulo Rangel, horas antes do comício.

A candidata ao Parlamento Europeu pela lista do Bloco de Esquerda afirmou que não aceita que “depois do dinheiro dos contribuintes ser usado para pagar as fraudes do passado, queiram agora usar o dinheiro dos pensionistas para pagar as fraudes do futuro”.

Marisa Matias antecipou que esta quinta-feira “muita gente vá falar do relatório dos grandes devedores à banca”, que deverá ser entregue no Parlamento pelo Banco de Portugal.

“Há questões que no essencial nós já sabíamos: que os bancos portugueses têm funcionado sistematicamente como uma máquina de acumulação que favorece, sistematicamente também, as elites deste país, umas elites parasitárias e que o que vai para essas elites é aquilo que não chega a quem precisa”, apontou.

Não querendo referir-se apenas a Joe Berardo — um “charlatão rude de quem é fácil falar" —, Marisa Matias dirigiu-se “às elites de sempre, às elites antigas, a todas as elites que a cada ano têm usado o nosso dinheiro como se fosse seu”.

O discurso de Almada ignorou a provocação dos centristas acerca do apoio de Marisa Matias ao antigo vereador Ricardo Robles, que renunciou ao mandato na câmara de Lisboa depois de um negócio imobiliário de compra e venda de um edifício de habitação para alojamento local ao mesmo tempo que defendia limites àquele tipo de operação. Marisa Matias não respondeu também ao pedido de clarificação de Pedro Marques acerca da posição do Bloco de Esquerda em relação ao Euro. Em vez disso, o Bloco insistiu na luta contra a precariedade como o projecto que defendem para Bruxelas.

Sem púlpito nem microfone fixo, os discursos dos oradores aconteceram num palco central, circundados por filas de apoiantes. A casa cheia obrigou alguns simpatizantes a subir até ao balcão superior. 

Foi numa dessas intervenções que Catarina Martins, a líder bloquista, considerou que Portugal é “um país em que se diz em que toda a gente acredita na Europa”, mas ressalvou que essa Europa em que os portugueses querem acreditar “não é a Europa do salário baixo, é a Europa da dignidade”. 

“Quem disser que as eleições europeias não são sobre o emprego, está a mentir”, defendeu líder bloquista, lembrando que “quem vive na precariedade vive com medo”. O tom de Catarina Martins era sério, tão sério que à palavra medo uma criança começou a choramingar. Depois de conter o riso face ao timing do choro, a sala desfez-se em gargalhadas, rindo do momento insólito.

Sublinhando o poder do voto que Marisa Matias já tinha mencionado, a líder do Bloco de Esquerda lembrou que “o voto do trabalhador temporário no call-center vale exactamente o mesmo que o voto do CEO da Altice” e que “o voto do bolseiro vale exactamente o mesmo que o voto do reitor que não lhe quer dar um contrato de trabalho”, concluiu.

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