Ordem dos Advogados de costas para os advogados

Saberá o Senhor Bastonário que serão muitos os que este ano se verão obrigados a desistir do acesso à profissão porque não têm como sustentar-se ao longo de um ano e meio de estágio não remunerado?

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Neste Dia do Advogado, que se assinala a 19 de Maio, nada houve que festejar ou celebrar para além dos costumeiros cumprimentos alicerçados numa comunidade cada vez mais restrita e restritiva. Como advogado estagiário e sem qualquer pretensiosismo assumo e transponho em palavras as centenas de reivindicações que muitos advogados e estagiários têm por responder.

Saberá o Senhor Bastonário que serão muitos os que este ano se verão obrigados a desistir do acesso à profissão porque não têm como sustentar-se ao longo de um ano e meio de estágio não remunerado?

Pelo seu silêncio em torno desta questão sou forçado a concluir que desconhece por completo as dificuldades que o português comum enfrenta para obter um bilhete de platina para este grupo dourado que não olha a meios para manter o status quo e evitar que se proletarize a profissão. Não saberá, portanto, que a proletarização da advocacia é uma realidade e por sinal uma realidade positiva que acompanha o desenvolvimento normal da sociedade e das relações de trabalho. Infelizmente, a Ordem dos Advogados tem-se virado contra os próprios, constituindo um dos principais entraves ao acesso e prática desta nobre profissão, precisamente quando o seu papel deveria representar uma defesa intransigente de todos aqueles que dedicaram anos da sua vida ao estudo do direito.

Deste mandato que agora termina não resultou nada de diferenciador ou inovador em relação aos anteriores. O mais problemático é que nenhum dos programas dos já assumidos candidatos a Bastonário tece uma palavra sobre os estágios e a sua arquitectura e muito menos sobre realidade complexa que os jovens advogados enfrentam para se imporem no mundo profissional.

Saberá o Senhor Bastonário que os advogados inscritos no Sistema de Acesso ao Direito e sem grandes avenças têm enormes dificuldades em manter-se na profissão tendo em conta as compensações pagas e a sua morosidade? Saberá também que o ingresso nesta profissão está, desde logo, associado ao estrangulamento económico pelas contribuições para a CPAS?

Como Bastonário, devia estar empenhado na resolução de todos estes problemas que afectam fundamentalmente os advogados provenientes de outro lado que não de uma família de advogados. São muitos os colegas que exercem a profissão, ou seja, que se assumem como agentes da justiça democrática, com a sombra da pobreza a pairar sobre eles, padecendo dos mesmos males que qualquer outro trabalhador: empobrecer apesar de trabalhar.

O Senhor Bastonário e seu eventual sucessor deveriam estar preocupados com a cartelização da advocacia por parte das grandes sociedades e do tratamento que estas propiciam aos seus trabalhadores ao invés de se debruçarem sobre métodos de afirmação da nobreza da classe. É nobre, de facto, mas nos seus princípios e objectivos e não na sua composição. Creio que muitas vezes se confunde a nobreza da profissão com a nobreza de quem a exerce e representa. Tenho a certeza que são muitos os advogados e advogados estagiários que se revêem nestas palavras e que nutrem um sentimento de mudança e frustração que há muito tem sido ignorado.

Seria já altura de trazer a Ordem dos Advogados do pedestal onde jaz inerte para o chão onde todos pisamos e somos pisados. Esta é uma declaração de intenções com a pretensão de ser transposta para a realidade. O Dia do Advogado não é dia de ir à missa mas de ir à luta.

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