Há mais de três mil doentes à espera de uma consulta de obesidade

Segundo o Portal do SNS, há 2229 pessoas à espera de cirurgia. No ano passado os hospitais operaram quase três mil doentes. Mas por ano o número de pessoas que cumpre critérios para cirurgia ronda os 10 mil.

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Mais de 50% da população portuguesa tem excesso de peso ou obesidade Pedro Elias

São 3667 os doentes com obesidade que aguardam por uma consulta e 2229 os que estão na lista de espera para uma cirurgia, segundo os dados disponíveis no Portal do SNS (dados de Novembro de 2018 a Janeiro deste ano). Em várias unidades o tempo de espera continua muito acima do recomendado para a prioridade normal. No ano passado realizaram-se 2810 cirurgias. Este sábado assinala-se o Dia Nacional e Europeu da Luta Contra a Obesidade.

Segundo o Portal do SNS, os 120 dias de tempo máximo de resposta garantido (TMRG) para uma consulta de prioridade normal são largamente ultrapassados em vários hospitais. É o caso do hospital de Évora com 1004 dias de espera, do São João (Porto) com 853 dias, Guimarães com 258 dias e do Hospital Universitário de Coimbra com 204. Também nas cirurgias de prioridade normal — a lei define um máximo de 180 dias para resposta — acontece o mesmo. No hospital de Évora a espera média está em 843 dias, em Coimbra está nos 307 dias, no São João são 321 e no Santo António 402 dias.

“Continuamos a ter queixas de doentes. A resposta está atrasada. Basta ver os estudos da Entidade Reguladora da Saúde”, afirma Carlos Oliveira, presidente da associação de doentes com obesidade ADEXO, acrescentando que o programa criado pelo Governo para combate às listas de espera para cirurgia “não tem tido resultados”.

No início de Março, a Entidade Reguladora da Saúde publicou o estudo sobre Cuidados de Saúde Prestados no SNS na Área da Obesidade, no qual referia que os doentes esperavam em média oito meses pela primeira consulta e período igual pela realização da operação.

Dez mil com critério para cirurgia

O médico John Preto, da Sociedade Portuguesa de Cirurgia para a Obesidade, admite que “é inegável que existem tempos de espera dilatados”, mas explica que “esta é uma área com grande procura em todas as unidades que fazem este tipo de tratamento” e que há doentes que têm mais do que uma inscrição.

“Não é que o programa não esteja a funcionar — temos centros de referência a aparecer —, é que temos muitos doentes. Uma análise de 2017 da Direcção-Geral da Saúde mostrava que temos 54% da população com excesso de peso ou obesidade. Entre público e privado, por ano, o número de doentes operados não chega aos 3000 e o número de doentes que cumpre critérios para cirurgia, por ano, ronda os 10 mil”, aponta.

Em resposta ao PÚBLICO, a Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) diz que em 2018 “foram realizadas 2810 cirurgias de obesidade a nível nacional”, mais 3,4% do que em 2017. A mediana de tempo de espera para cirurgia no final do ano passado estava em seis meses.

“O acesso ao programa de tratamento cirúrgico da obesidade no SNS tem vindo a aumentar nos últimos anos, tendo-se registado, em 2018, um total de 2950 novos utentes inscritos para este programa”, refere a ACSS, salientando que o SNS tem actualmente dois centros de responsabilidade integrada que visam aumentar a capacidade de resposta na área da obesidade.

Falta de comparticipação

Outra preocupação dos especialistas é o tratamento disponível para os doentes que ainda não precisam de cirurgia e que se pretende evitar que cheguem à fase mais grave da doença. A solução passa por um tratamento multidisciplinar com recurso à nutrição, exercício físico e medicação. Mas a falta de comparticipação acaba por ser um entrave.

Os preços por embalagem, dependendo do medicamento em causa, variam entre os 72 euros e os 250 euros. “Vários estudos mostram que a obesidade é mais prevalente nos estratos sociais mais baixos e estes são os doentes que não conseguem ter acesso à medicação”, diz Paula Freitas, presidente da Sociedade Portuguesa para o Estudo da Obesidade.

“Temos mais de 200 condições associadas à obesidade. O SNS paga o tratamento da hipertensão, da obesidade, da apneia do sono, mas não comparticipa o tratamento do que está na génese que é a obesidade. Não se percebe”, lamenta a médica. O PÚBLICO questionou o Ministério da Saúde e a ACSS sobre se prevê a comparticipação da medicação para obesidade, mas não obteve resposta a esta questão especifica.

Ainda na resposta que enviou ao PÚBLICO, a ACSS refere que, no âmbito da estratégia de reforço da promoção da saúde e prevenção da doença, “no final de 2018, encontravam-se a desempenhar funções no SNS um total de 180 nutricionistas (86 nos cuidados de saúde primários e 94 nos hospitais) e que, actualmente, encontra-se a decorrer um concurso para a contração de mais 40 nutricionistas para o SNS”.

O acréscimo destes profissionais é considerado fundamental por Paula Freitas. “Os nutricionistas fazem parte do programa nos centros de referência [para o tratamento da obesidade], mas estão sobrecarregados. A nutrição é transversal a muitas doenças. Precisamos de muitos mais para dar as consultas necessárias. Sabemos que quanto maior for o contacto entre os doentes e os profissionais, melhores são os resultados”, salienta a médica.

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