Há futebol depois de um enfarte? Há quem diga que Casillas pode voltar e quem não o aconselhe

Iker Casilas tem pela frente meses de reabilitação e observação e um ano de tratamento. Médicos dizem que ainda é cedo para perceber o que vai acontecer.

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LUSA/IKER CASILLAS TWITTER HANDOUT

Num enfarte agudo de miocárdio, a primeira hora é de ouro, habituaram-se a repetir os cardiologistas. Se o tratamento for rápido, as sequelas podem ser diminutas ou nulas. Foi justamente isto que aconteceu com Iker Casillas, que foi socorrido de imediato e tratado com rapidez quando se sentiu mal durante um treino na quarta-feira. Mas só após uma avaliação e o longo período de reabilitação e tratamento se poderá dizer se o guarda-redes do FC Porto, que planeava retirar-se aos 40 anos, voltará ou não aos relvados. Há quem defenda que o espanhol que completa 38 anos este mês o pode fazer sem problemas de maior, mas há quem desaconselhe o seu regresso à alta competição.

Mal se percebeu que algo de errado se passava, Iker Casillas foi rapidamente encaminhado para um hospital privado onde foi prontamente submetido a um cateterismo para desobstruir a artéria direita, tapada com um coágulo, e colocaram-lhe um stent, uma espécie de anel em rede para evitar que a artéria volte a fechar.  “Aparentemente, foi tudo muito rápido. Houve logo uma equipa pronta a actuar. E está demonstrado que se abrirmos a artéria [obstruída] em menos de uma hora quase não haverá sequelas. O tempo é músculo”, explica Hélder Pereira, o responsável europeu pela iniciativa Stent Save a Life da Sociedade Europeia de Cardiologia, que se escusa a alvitrar, porém, se ele poderá ou não voltar a jogar. “Depende da avaliação dos próximos dias. Não é de todo impossível. Mas a carreira de um atleta de alta competição é extremamente exigente”, nota o médico ao PÚBLICO.

Quando acontece um enfarte agudo do miocárdio, há uma zona do coração que deixa de ser irrigada, provocando a morte de células. “É como se tivéssemos uma horta no Alentejo no Verão que regamos todos os dias e está bem verde, mas que pode ter ao lado um canteiro não regado, e fica amarelo”, ilustra Manuel Carrageta, presidente da Fundação Portuguesa de Cardiologia.

Mas como pode uma pessoa aparentemente de tão baixo risco ter tido um problema destes? O enfarte agudo de miocárdio é raro em pessoas jovens – em média, em Portugal, as pessoas têm enfartes aos 64 anos — mas acontece. Há alguns anos, Manuel Carrageta participou num estudo que identificou cerca de meia centena de casos de enfarte agudo de miocárdio em pessoas com menos de 40 anos internadas em serviços hospitalares. Todos eles, destaca o cardiologista, tinham factores de risco – eram grandes fumadores ou tinham perturbações dos mecanismos lipídicos (colesterol), elenca.

Já num atleta de alta competição, que em princípio não terá os factores de risco mais comuns – além do tabagismo e dislipidemia, a hipertensão e diabetes –, eventualmente podem estar em causa antecedentes familiares. Merece destaque também um problema suplementar: “Há cientistas que defendem que o esforço excessivo pode provocar alterações no coração”, diz Manuel Carrageta, sublinhando “um enfarte não surge do nada”.

Sem dúvidas, o médico da equipa principal do Futebol Clube do Porto, Nelson Puga, já garantiu que Casillas vai ficar “completamente recuperado de saúde”. Apesar de considerar que ainda é cedo para se falar nisso, o médico não rejeita a hipótese do seu regresso à alta competição. “É muito cedo para nos pronunciarmos. Vai depender de muitos factores, da medicação que vai precisar tomar, da avaliação que faremos de como tudo vai acontecer, não só em situações de repouso, mas também de stress e no exercício físico. E vai depender também da vontade dele em continuar”, enfatizou.

Com Iker Casillas em observação, o seu futuro é, pois, uma incógnita. “Esperam-no três meses em observação e um ano de tratamento”, antecipou ao El Mundo José María Castellano, cardiologista no CIEC (Centro Integral de Doenças Cardiovasculares), alertando para os riscos que o futebol profissional representa. “Iker vai ter que estar no mínimo três meses em observação e um ano em duplo tratamento antiplaquetário, com um medicamento que terá que tomar para sempre. O risco nestas circunstâncias é que algum golpe possa provocar uma hemorragia excessiva. Por isso recomendamos, pelo menos no primeiro ano, que se evitem os desportos de contacto”. 

Já o cardiologista Vasco da Gama, dos hospitais da Cruz Vermelha em Portugal, defende que o guarda-redes deve descansar até ao fim da temporada, mas acredita que tem condições para poder voltar a jogar futebol como até agora. “Tudo depende do tamanho do músculo afectado e do tempo que a circulação sanguínea esteve parada. Precisamente por ser um desportista de alta competição, o seu músculo é mais forte e, se foi tratado com rapidez, não ficou com qualquer lesão no coração”, afirmou o médico português ao El Pais.

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