Cavaco Silva condicionou a campanha de 1987, acusa Santana Lopes
Santana Lopes cabeça de lista do PSD nas primeiras europeias em 1987 revela bastidores dessa campanha e dos seus opositores: Miguel Esteves Cardoso, Maria de Lourdes Pintasilgo, Francisco Lucas Pires.
Santana Lopes, cabeça de lista do PSD nas primeiras europeias, em 1987, considera que a campanha do partido foi secundarizada nessas eleições por Cavaco Silva, que definiu como prioritária a maioria absoluta nas legislativas, realizadas no mesmo dia. “Nós, candidatos do PSD na lista europeia, não pudemos competir como deve ser com os nossos adversários”, afirmou em entrevista à Lusa Pedro Santana Lopes.
O partido conseguiu na altura o melhor resultado até agora em eleições europeias (37,5%), mas pior do que o que teve nas legislativas de então (50,2%). “O PSD acabou por ter a maioria absoluta nas legislativas, foi a primeira maioria do professor Cavaco Silva, que sempre muito prático e excelente político (...) dizia “não, o importante são as eleições legislativas e por isso as europeias têm que ser secundarizadas, sendo no mesmo dia, porque importa é conquistarmos a maioria nas legislativas”, afirmou.
Num folheto da campanha de 1987, que o cabeça de lista social-democrata guardou, surge em formato maior a fotografia do líder do PSD, Cavaco Silva, ao lado de outra com metade do tamanho onde aparecem Pedro Santana Lopes e Carlos Pimenta, que figurava como candidato “número quatro”.
“A lista de candidatos do PSD ao Parlamento Europeu é uma lista de gente para trabalhar, para trabalhar comigo”, referia a mensagem assinada por Cavaco Silva no folheto. “Foi uma campanha engraçada, porque tinha cabeças de lista de excelente nível”, realçou Santana Lopes, apontando figuras já desaparecidas como Maria de Lourdes Pintasilgo (PS), Francisco Lucas Pires (CDS) e Medeiros Ferreira (PRD).
Santana Lopes elogiou ainda a campanha do candidato do PPM, Miguel Esteves Cardoso, que acabaria por não ser eleito, conquistando 2,77% dos votos. “O Miguel não foi eleito, mas foi pena porque ele marcou aquela campanha, pôs muito o acento na vertente cultural da Europa, na questão das regiões”, lembrou o ex-primeiro-ministro do PSD e actual líder da Aliança.
Mas, para Santana Lopes, o principal adversário nessas eleições foi Francisco Lucas Pires. “O doutor Lucas Pires fez uma campanha enorme, muito personalizada. Ele tinha estado nos dois anos anteriores no Parlamento Europeu (por designação) e tinha divulgado muito bem o seu trabalho por lá”, afirmou o antigo dirigente do PSD, salientando que “o Parlamento Europeu tinha poucos poderes. Naquela altura, era mais aprovar votos a favor disto, a condenar aquilo”.
Francisco Lucas Pires “ficou com a imagem quase do “deputado europeu”. Pôde fazer campanha à vontade e o CDS nas legislativas teve um resultado fraco, mas bom nas europeias”, considerou o candidato do PSD. O CDS teve 15,4% nas europeias realizadas no dia 19 de julho de 1987, com quatro eleitos, quando nas legislativas teve apenas 4,4%. Já o PSD elegeu dez eurodeputados, todos homens.
Questionado sobre se o resultado do PSD nas europeias foi alcançado “à boleia” da maioria de Cavaco Silva nas legislativas, o antigo candidato social-democrata admitiu que essa é uma de duas leituras possíveis. “Se não tivesse coincidido com as legislativas podíamos ter tido melhor, mas tivemos também uma parte porque o PSD estava em alta graças aos resultados de Cavaco Silva”, respondeu.
Segundo Santana Lopes, na altura houve vários debates entre candidatos ao Parlamento Europeu, mas, do que recorda, os debates em estúdios televisivos ficaram para os candidatos das legislativas.
O Acto Único Europeu, que estabelecia as etapas e as medidas necessárias para a entrada em vigor do Mercado Único Europeu em 1992, foi um dos temas em destaque, tal como a questão da coesão económica e social.
Sobre a sua presença no Parlamento Europeu, Santana Lopes referiu que “foi uma experiência fascinante”, apesar dos poucos poderes que encontrou.
“Eu cumpri esse mandato que era de dois anos e pedi ao professor Cavaco Silva para não continuar (...) disse que gosto mais de trabalho executivo, não gosto tanto de trabalho parlamentar”, afirmou, lembrando que meses depois foi chamado ao Governo como secretário de Estado da Cultura.