Ser ministro da Justiça ou advogado de Trump? O dilema de Barr
Senadores interrogam
O procurador especial Robert Mueller não concordou com o resumo que o Attorney General (equivalente a ministro da Justiça) William Barr fez da sua investigação de 22 meses sobre a suspeita de interferência russa nas eleições de 2016 e a eventual obstrução da justiça do Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
A posição de Mueller fica clara na carta divulgada por vários jornais norte-americanos nesta quarta-feira, o mesmo dia em que Barr teve de prestar esclarecimentos na Comissão de Justiça do Senado, onde os democratas tentaram forçá-lo a admitir que não tinha sido imparcial.
“Preferiu ser o advogado do Presidente e pôr-se do lado dele, em vez de defender os interesses do povo americano”, afirmou a senadora democrata Mazie Hirono. Disse que Barr é alguém que sacrificou “uma reputação que antes era decente pelo vigarista e mentiroso que agora se senta na Sala Oval”. Hirono pediu ao Attorney General que se demitisse.
O senador democrata Lindsey Graham, presidente da comissão e nos últimos tempos próximo de Trump, saiu em defesa do Presidente: “Está a caluniar o homem!”, declarou.
Barr mostrou-se hostil perante a agressividade dos seus interrogadores, que lhe chamaram mentiroso a ele e ao Presidente. “Não estou no sector de determinar quando é que dizem mentiras ao povo americano”, respondeu Barr, perante a insistência de alguns senadores.
Na carta divulgada por Robert Mueller esta quarta-feira – dirigida a Barr – o procurador especial menciona cartas e reuniões anteriores em que tinha pedido ao Attorney General para publicar mais algum conteúdo do seu relatório final de 448 páginas do que a carta de quatro páginas, escrita sem a participação de Mueller, que enviou ao Congresso a 24 de Março.
Com esta carta, o Presidente Donald Trump pôde cantar vitória, dizendo que foi tudo uma “caça às bruxas”, como sempre tinha dito, e até pedir que fossem investigados os que quiseram investigá-lo.
A carta de Mueller mostra grande preocupação com a forma como William Barr lidou com a divulgação do relatório – que, entretanto, foi divulgado a 18 de Abril de forma mais ampla, embora sempre com algumas partes censuradas. “Isto cria confusão pública sobre aspectos críticos dos resultados da nossa investigação”, escreve Muller”, e “ameaça pôr em causa um dos objectivos centrais do Departamento de Justiça ao nomear um procurador especial: garantir a confiança do público no resultado das investigações.”
No Senado, William Barr, que já várias vezes acusado de tentar proteger o Presidente Trump, defendeu a forma como lidou com o relatório de Mueller, com a censura de algumas passagens para proteger informação sensível e com a conclusão que tirou de que Trump não pode ser acusado de obstrução da justiça.
“Não acredito que o Governo tivesse um caso que se vingasse na justiça”, afirmou Barr, nomeado por Trump. Segundo a Reuters, pareceu frequentemente desculpar ou racionalizar a conduta do Presidente em relação a Mueller afirmando que o objectivo do chefe de Estado não era boicotar a investigação, relata a Reuters.
A reputação de Donald Trump foi manchada, de forma injusta, afirmou Barr, pelas suspeitas de que a sua campanha e os seus próximos colaboraram com a Rússia nas eleições presidenciais de 2016. “Dois anos da sua Administração foram dominados pelas alegações que agora se demonstrou que são falsas. Ao ouvir alguma da retórica que está aqui a ser usada, pensar-se-ia que o relatório Mueller tinha concluído o contrário”, afirmou no Senado.
O relatório Mueller concluíu que não havia provas suficientes sobre a existência de uma conspiração criminosa. Mueller preferiu não tirar conclusões sobre se Trump obstruiu ou não a justiça, mas claramente não o exonerou. Mas Barr, pelo contrário, disse que ele e Rod Rosenstein, o número dois do Departamento de Justiça – que se demitiu esta semana – consideraram que, com base nas conclusões de Mueller, não havia provas suficientes para determinar que Trump tinha obstruído a justiça.