“Mais aviões só a brincar.” Foi assim que quatro pessoas interromperam o discurso de António Costa, no 46.º aniversário do Partido Socialista (PS). Surpreendido pelo protesto, o primeiro-ministro não cedeu o palco — nem o microfone — e aguardou pelos seguranças, que expulsaram o grupo do palco. Tudo isto em menos de um minuto. Mas o protesto não é isolado. O grupo português integra um movimento de activismo ecológico internacional que durante a última semana se tem repetido em vários países, com especial expressão no Reino Unido.
“Lamentamos estragar a vossa festa, mas o rio Tejo, aqui ao lado, a nossa cidade e as gerações futuras não têm nada para celebrar”, lê-se no discurso partilhado pelo grupo.
Esta foi uma das mais mediáticas, mas já não é o primeiro protesto pacífico do grupo. Na realidade, é já a décima acção. Na última semana, como o P3 noticiou, o grupo português já tinha interrompido a emissão matinal da CMTV com cartazes e faixas que criticavam a “permanente deturpação que alguns órgãos praticam quando relegam a questão das alterações climáticas para segundo ou terceiro grau”.
O grupo também já tinha estado na sede da EDP, em Lisboa, para apelar ao encerramento centrais a carvão de Sines e de Aboño, “"as maiores emissoras de gases com efeito de estufa de Portugal e de Espanha”.
No protesto desta segunda-feira, dirigiu as críticas ao projecto que pretende aumentar o aeroporto da Portela, com a construção de um novo aeroporto no Montijo, “em plena reserva natural”.
“O aumento do tráfego aéreo é um dos grandes responsáveis pelo aumento de emissões. As emissões dos aviões têm o dobro do poder de efeito de estufa. Não há meio de transporte tão poluente como este. Um voo é responsável por 30 vezes mais emissões do que a mesma viagem em comboio de alta velocidade”, aponta o grupo no seu discurso.
“A temperatura global está a subir e os fenómenos climáticos extremos a aumentar. Caminhamos para a sexta extinção em massa. Para os nossos filhos poderem viver neste planeta, temos de reduzir drasticamente as emissões nos próximos dez anos.”
“Trazemos até vós o ruído dos aviões, para vos lembrar de que um aeroporto no Montijo comprometeria a saúde e a qualidade de vida de 30 mil pessoas. O aumento na Portela afectaria centenas de milhares de habitantes, trabalhadores, estudantes e visitantes. A poluição atmosférica e sonora dos aeroportos é causa de AVCs, doenças cardiovasculares e respiratórias, cancros, perturbações no sono e cognitivas”, continua o documento.
E deixou um desafio a António Costa: “Diga a verdade sobre as relações entre o poder político, a Vinci e as empresas que lucrarão com este projecto. Diga a verdade sobre a legislação europeia e nacional - relativa à protecção de ecossistemas, à saúde pública, ao direito a um ambiente são e a processos adequados de avaliação ambiental - que está a ser violada neste processo.”
Uma rebelião internacional
O grupo que interrompeu o primeiro-ministro inspirou-se no movimento Extinction Rebellion (Rebelião de Extinção), que defende acções de desobediência civil pacíficas como estratégia para sensibilizar os responsáveis políticos para a crise ambiental.
O movimento arrancou a 15 de Abril e aposta em protestos internacionais contra as políticas ecológicas implementadas pelos organismos governamentais. Para estes ambientalistas, as escolhas dos governos são responsáveis pelo “actual estado de emergência climática”.
Na última semana, o grupo bloqueou ruas, plantou árvores na praça do Parlamento britânico e invadiu o Museu de História Natural.
No Reino Unido, só até às 10h de segunda-feira as autoridades britânicas já tinham detido 1065 pessoas, conta o Guardian.
O movimento tem reunido a presença de várias figuras públicas, que pretendem ajudar na divulgação do protesto. É o caso da actriz Emma Thompson e da banda Massive Attack, que actuou no campo Marble Arch, em Londres.
É também na capital de Inglaterra que está a jovem activista de 16 anos, Greta Thunberg. A “heroína do clima”, como é apelidada, juntou-se aos protestos esta segunda-feira.