“A evolução humana é uma fotografia em constante mudança”

Armand Mijares é um dos líderes da investigação que desvendou a existência de uma nova espécie de humanos: o Homo luzonensis.

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Armand Mijares com um dos ossos da nova espécie de humanos Cheryl Ravelo/Reuters

O arqueólogo Armand Mijares quer saber mais sobre as espécies humanas que viveram no Sudeste asiático. Para isso, o cientista da Universidade das Filipinas participa actualmente em escavações na gruta de Callao, no Norte de Luzón, onde foram encontrados ossos e dentes de três indivíduos de uma nova espécie de humanos antigos anunciada esta quarta-feira na revista científica Nature. Durante as escavações – e com acesso mínimo à Internet –, Armand Mijares responde por e-mail a algumas questões do PÚBLICO sobre a descoberta do Homo luzonensis.

Com a descoberta do Homo luzonensis, o que ficamos a saber mais sobre a evolução humana?

A evolução humana é uma fotografia em constante mudança. Com novas espécies a serem descobertas e com novos fósseis a serem datados de novo – fazendo com que a idade de espécies recue –, essa fotografia mostra-nos que a adaptação evolutiva foi diversificada

Penso que esta descoberta em concreto nos mostra como o nosso género tentou adaptar-se a diferentes situações e ambientes. Mas também nos mostra que não sobreviveu durante muito tempo. A partir daqui podemos fazer uma reflexão para a nossa espécie: embora seja a espécie mais bem-sucedida, também nos estamos a confrontar com problemas à escala mundial como as alterações climáticas.

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O arqueólogo Armand Mijares DR

Onde se situa o Homo luzonensis na “árvore de família” do género Homo?

Nesta fase, é difícil ter a certeza sobre qual é a posição filogenética do Homo luzonensis. O meu colega Florent Détroit (do Museu Nacional de História Natural, em Paris, e que também liderou este estudo) continuará a analisar os vestígios do Homo luzonensis, enquanto eu continuarei a participar em escavações na gruta de Callao e noutras grutas em busca de mais fósseis.

Qual é a importância deste estudo para a evolução humana no Sudeste asiático?

Até há pelo menos 20 anos, a evolução humana na Ásia era contada de forma muito simples. Sabíamos que o Homo erectus tinha saído de África, se tinha estabelecido no Leste e Sudeste asiático, mas não sabíamos muito mais sobre a evolução humana até ao Homo sapiens ter chegado à região há entre 40 mil e 50 mil anos e ter depois conquistado todo o planeta.

Tanto graças a descobertas de fósseis em escavações como à genética nos laboratórios, sabemos agora que a história evolutiva dos humanos no Sudeste asiático foi muito mais complexa. Houve diferentes espécies contemporâneas do Homo sapiens, situações de reprodução cruzada ou extinções. E isso não aconteceu apenas com o Homo neanderthalensis no lado ocidental do continente asiático. O lado Leste é agora o centro de atenção devido a novas descobertas fascinantes feitas nos últimos anos.  

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Gruta de Callao, onde foram descobertos ossos e dentes de uma nova espécie de humanos Projecto Arqueológico da Gruta de Callao

O Homo luzonensis é uma dessas espécies recentemente descobertas que foi contemporânea do Homo sapiens. Temos ainda registos fósseis na China – incluindo vestígios descobertos há pouco tempo e ainda não publicados – ou episódios de hibridização com os ainda misteriosos denisovanos (outra espécie humana já extinta). Pode então perceber-se que até há poucos milhares de anos o Homo sapiens não estava definitivamente sozinho no planeta e que o cenário na Ásia era bem mais complexo do que a simples substituição do Homo sapiens pelo Homo erectus.

A descoberta do Homo luzonensis é ainda uma peça adicional que prova os possíveis efeitos do endemismo insular nos hominídeos. Mostra ainda que os hominídeos que não são da espécie Homo sapiens também foram capazes de atravessar o mar em diversas ocasiões no passado, embora não saibamos ainda como e porque o fizeram.

Quais são as semelhanças entre o Homo luzonensis e o Homo sapiens?

Os molares do Homo luzonensis assemelham-se muito aos dos do Homo sapiens. As falanges proximais dos pés das duas espécies também são visualmente muito parecidas.   

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