Jornalistas da RDP escrevem à ministra da Cultura: “Já não é sério dizer que há um serviço público de rádio”
A falta de profissionais e de meios técnicos está a deteriorar a qualidade da informação produzida pela rádio pública e a pôr em causa o cumprimento das obrigações de serviço público, avisam os jornalistas.
O quadro descrito pelo Conselho de Redacção (CR) da rádio de serviço público numa carta enviada à ministra da Cultura é preocupante. Os jornalistas que representam a redacção escreveram a Graça Fonseca pedindo-lhe que intervenha para “salvar o serviço público de rádio” e que não se limite ao papel de mais uma governante que “encolheu os ombros e nada fez perante uma realidade [de crise grave] que já não consegue ser disfarçada”.
Na missiva que enviou há poucos dias à ministra, o conselho de redacção afirma que mesmo depois da “verdadeira sangria de jornalistas” durante os anos da troika, a redacção continua actualmente a “encolher”, numa prova do “descontentamento com as condições de trabalho e a falta de perspectivas futuras”, e com a transferência de jornalistas da rádio para a televisão - como o recente caso de Maria Flor Pedroso, que era editora de política da rádio e passou a directora de informação da televisão. E perante este esvaziamento - que nem a integração de jovens precários conseguiu realmente contrariar -, a administração teima em não reforçar os quadros da rádio, realça o CR.
Além da crise de recursos humanos, a área técnica também atravessa graves dificuldades, afirmam. “Debatemo-nos diariamente com problemas técnicos e falta de material, resultado do fraco investimento nas condições de emissão radiofónica. Os estúdios estão obsoletos e a própria construção dos actuais não teve em conta todas as necessidades de quem lá trabalha diariamente; os equipamentos técnicos falham com frequência e as prometidas melhorias nunca chegam.”
Por isso, os jornalistas questionam: "O Estado português e o Governo querem ter, de facto, um serviço público de rádio com uma indispensável e forte componente de informação, que corresponda aos expectáveis padrões de excelência de um verdadeiro serviço público, ou a intenção é ir deixando definhar a rádio até que a sua existência seja considerada irrelevante?” E insistem: “O Estado português e o Governo querem continuar a fazer de conta que esse serviço público existe, ou querem reverter todo este caos e mudar o rumo seguido nos últimos anos?”
Há mês e meio, por ocasião do dia mundial da rádio, os jornalistas da RDP fizeram um plenário em que manifestaram insatisfação quanto à escassez de recursos e reclamaram junto da administração da RTP dignidade no tratamento da rádio, exigindo medidas para a salvaguarda do serviço público de rádio. Porém, nada mudou desde então.
Na carta, o CR vinca que a forma de trabalhar da redacção é de tal forma crítica que “já não é sério dizer às pessoas que existe, de facto, um serviço público de rádio”. E lembra os alertas sucessivos do provedor do ouvinte para a “falta de condições da informação do serviço público de rádio" que torna “impossível" que se preste um serviço “digno e de referência”.
O problema de raiz é que a rádio foi sempre o “parente pobre” na RTP e “habituou-se a viver na sombra da televisão”. Contudo, este cenário agudizou-se na última década: “O que não pode acontecer é deixar apagar-se por completo como nos dias de hoje”, avisa, por isso, o CR, que recorre à ironia para comparar a produção de informação da rádio às urgências de um hospital - que se limita a responder às necessidades básicas dos utentes.