Falta acompanhamento aos sobreviventes de AVC
Associação alerta para a falta de acompanhamento do doente após receber alta hospitalar. É urgente prestar apoio de equipas multidisciplinares, defende especialista.
A associação Portugal AVC alertou este sábado para a falta de acompanhamento dos sobreviventes de Acidente Vascular Cerebral (AVC), sobretudo após a alta hospitalar, e para a necessidade de tornar mais rápida a atribuição de produtos de apoio.
Em declarações à Lusa, Ana Alves, da associação, sublinhou a urgência de acompanhar sempre o sobrevivente de AVC com equipas multidisciplinares, tanto aquando do internamento, como após a alta.
“A reabilitação não é só fisioterapia (…) e deve começar logo quando o sobrevivente entra no hospital, pela ‘via verde’. Deve ser logo às 24/48 horas que o doente deve ter acesso a uma equipa de reabilitação multidisciplinar e coordenada”, afirmou a especialista.
Na véspera do Dia Nacional do Doente com AVC, que se assinala no domingo, Ana Alves explicou que, para uma abordagem completa e correcta, estas equipas deveriam ter médico fisiatra, terapeuta ocupacional, enfermeiro de reabilitação, fisioterapeuta, terapeuta da fala, assistente social, nutricionista e psicólogo.
“Estas equipas multidisciplinares devem acompanhar o sobrevivente de AVC tanto no hospital como depois de sair, para se conseguir uma reabilitação atempada”, afirmou Ana Alves, que alertou para a falta de meios humanos, mesmo nos hospitais que têm equipas deste género, “que são poucos”.
A especialista, que trabalhou oito anos numa equipa multidisciplinar no Hospital da Trofa e hoje está no Hospital de Guimarães, recorda que “as guidelines internacionais dizem que se um sobrevivente de AVC não tiver acesso a uma equipa deste género é um sobrevivente que vai ter menos potencial, que não vai conseguir a sua capacidade máxima, e isto leva a custos na sociedade”.
Para a Portugal AVC, este acompanhamento pode fazer a diferença entre ter, no futuro, “um cidadão contribuinte ou mais um peso para a Segurança Social, com complicações de saúde crescentes, encargos acrescidos para o Estado e diminuição da qualidade de vida”.
“Se um sobrevivente, a nível de hospital, não tiver acesso a essa equipa integrada, vai estar mal informado e, depois, sai para os centros de saúde, para as clínicas - pois os hospitais não têm capacidade para dar resposta à reabilitação porque não têm recursos humanos – e têm acesso só a fisioterapia, esquecendo todos os outros profissionais”, explicou
Ana Alves fala em serviços de reabilitação nos hospitais sem profissionais suficientes e diz que, mesmo as unidades de AVC, estão mal equipadas em termos de equipas deste género.
“Portugal não está a tentar ser diferente, estamos a tentar seguir as guidelines internacionais (…). Temos bons profissionais em todas estas áreas, mas temos poucos recursos”, insistiu.
Ana Alves diz ainda que se o sobrevivente, após a alta, for para um centro de reabilitação “está protegido”, caso contrário, como os hospitais não conseguem dar resposta, os doentes acabam dependentes do médico de medicina geral e familiar, “que não tem nem capacidade nem competência para avaliar as necessidades da medicina de reabilitação”.
“O máximo que podem fazer é ajudar-nos a encaminhar os doentes para as clínicas convencionadas (…)”, acrescentou a responsável, sublinhando ainda que não deve existir um limite de tempo para a reabilitação predefinido, porque “todos somos diferentes”.
Por vezes, frisou, “pensa-se, erradamente, que a reabilitação acaba ao fim de três, seis meses ou um ano. Mas sempre que o sobrevivente ficar a precisar de melhorar qualquer funcionalidade precisa de reabilitação”, seja ao nível da marcha, da fala ou da nutrição.
“Há um plano europeu contra o AVC 2018/2030 em que o objectivo é o sobrevivente ter acesso a avaliação pelo menos anual por essas equipas”, disse Ana Alves, acrescentando: “Podemos ter um AVC no mesmo local e ter necessidades diferentes”.
Outras das matérias para as quais a Portugal AVC alerta é a falta de celeridade na atribuição dos produtos de apoio, que por vezes “chegam, e já estão desajustados” das necessidades dos doentes.
“Quando o doente precisa de um medicamento, passamos receita e o doente compra na farmácia. Nos produtos de apoio, pedimos no hospital e, muitas vezes, podem demorar mais de um ano. Quando vêm já não estão adaptados à situação do doente”, alertou Ana Alves, chamando a necessidade de desburocratizar e tornar mais rápida esta fase.
“O terapeuta ocupacional faz uma avaliação dos produtos de apoio necessários, por exemplo, para comer melhor, ou para conseguir abrir uma lata (…), por vezes até se fazem adaptações em casa. Por vezes já nem se fazem as prescrições e perguntamos se o sobrevivente pode pagar”, acrescentou.