Tribunal de Contas tem reservas sobre contabilidade do IAPMEI

Auditoria às contas de 2016 revela diversas infracções contabilísticas, pagamento ilegal de benefícios e poucas correcções aos erros mais antigos.

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Miguel Campos Cruz, actualmente na Parpública, era o presidente do IAPMEI no ano em análise pelo Tribunal de Contas nuno ferreira santos

O Tribunal de Contas deu luz verde à contabilidade de 2016 do IAPMEI, mas os auditores expressaram um juízo “favorável com reservas”, segundo o documento divulgado nesta quinta-feira (PDF aqui). Depois de analisar as contas daquele ano, o tribunal identificou diversos problemas contabilísticos: falta de fiabilidade de uma série de registos no balanço; alguma falta de controlo interno; resultado líquido negativo em 2016; ausência de prova documental contabilística sobre a dívida de terceiros; utilização indevida de uma conta bancária; e numerosos pagamentos ilegais de suplementos remuneratórios e benefícios sociais, como subsídio de lavagem de viatura ou subsídios de estudo. Mesmo assim, o parecer é favorável, com uma série de recomendações ao governo e à direcção do IAPMEI, uma instituição que já tinha sido alvo de críticas numa auditoria em 2014 e que, em relação a esses resultados, fez poucas correcções aos problemas então detectados.

“Apesar das distorções evidenciadas, e considerando que as mesmas não afectam de forma generalizada as demonstrações financeiras e a execução orçamental, as quais, no mais, se apresentam, respectivamente, como fiáveis, legais e regulares, emite-se sobre as mesmas um juízo favorável com reservas”, lê-se nas conclusões do relatório de auditoria agora divulgado.

No documento diz-se que “o IAPMEI continuou a utilizar uma conta na banca comercial para movimentos não autorizados, observando-­se, no entanto, uma melhoria significativa nesta área face à anterior auditoria sobre a gerência de 2011”. Depois de notar que o exercício de 2016 se saldou por um resultado líquido negativo que se explica “pelo aumento da maioria dos custos operacionais e pela redução das prestações de serviços”, e de apontar deficiências contabilísticas diversas relacionadas com a fiabilidade dos registos da dívida, de uma provisão de 4,7 milhões de euros e de outra no montante de dois milhões, e de anotar que o há distorções diversas nas três rubricas do balanço, as conclusões desembocam na tal série de pagamentos ilegais.

Entre Janeiro de 2016 e Março de 2018, 15 coordenadores informais, cinco trabalhadores com funções de secretariado e dois funcionários de apoio ao conselho directivo (CD) do IAPMEI beneficiaram de subsídio de função. “O montante deste subsídio acrescia à remuneração base dos trabalhadores, sendo o seu valor fixado pelo CD, não existindo uma ordem de serviço ou outro documento que regulasse as condições de atribuição destes montantes, o que leva a concluir o seu carácter discricionário”, escrevem os auditores, que apontam mesmo uma situação em que um assessor do CD ganhava mais em subsídio (2809,49 euros) do que em salário base (2043,10 euros).

Acontece que sucessivas alterações à legislação sobre trabalhadores em funções públicas, tornaram os mesmos pagamentos “contrários à lei”, dizem os auditores. No entanto, esta leitura “foi tida por controversa durante um significativo período de tempo”, como também reconhecem os autores desta análise. Diferentes organismos, incluindo o próprio Ministério Público, envolveram-se neste debate sobre a legalidade de tais pagamentos, mas para o tribunal de contas, a conclusão foi só uma: “Parece evidente que nunca existiu lei que suportasse a atribuição dos subsídios em causa e que os responsáveis foram alertados ao longo do tempo para essa situação. O próprio Ministério Público junto do Tribunal de Contas, já em 2016, não afirmou que a situação era legal ou sequer duvidosa, tendo­-se limitado a desculpar a conduta dos eventuais responsáveis com ‘um erro de direito’ da sua parte.” 

Essa posição do MP, de que se tratava de um erro, “não justifica a sua persistência posterior”, salientam os auditores. "No entanto, os gestores entenderam não fazer cessar abonos a funcionários enquanto a matéria não fosse inteiramente líquida.” Ou seja, o IAPMEI continuou a pagar subsídios, enquanto subsistiam dúvidas interpretativas. E só deixou de os pagar quando a “correcta interpretação da lei se tornou incontornável”, especialmente depois de a Inspecção-geral das Finanças ter reafirmado a “ilegalidade dos subsídios”, o que levaria a direcção do IAPMEI a fazer cessar os pagamentos “da maioria deles”. 

O tribunal identificou ainda problemas no pagamento de 40.633 euros a título de subsídio de isenção horária de trabalho a quatro trabalhadores. Estes pagamentos eram ilegais por os mesmos funcionários estarem sujeitos à Lei de Vínculos, Carreiras e remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas. A cessação do pagamento foi recomendada logo após uma auditoria de 2013, mas o IAPMEI manteve o pagamento até Março de 2018, pelo menos para dois desses trabalhadores que acumulavam ainda um subsídio de função. Em 2017, a pedido da IGF, o IAPMEI disse que iria comprovar a conformidade legal daqueles quatro casos, mas, segundo esta auditoria mais recente, isso acabou por não acontecer.

Os auditores expressam igualmente dúvidas sobre a interpretação legal que deu origem à atribuição de subsídios de estudo no valor de 43.565,16 euros. “Verificou-se que o IAPMEI pagou esse subsídio em relação a descendentes que na data da entrada em vigor do Decreto-­Lei n.° 14/2003 ainda não preenchiam os requisitos para beneficiar do mesmo, designadamente por não terem atingido a idade escolar ou até terem nascido posteriormente. Nestes casos, a violação do disposto no n.° 2 do artigo 3.° desse diploma abrangeria, no mínimo, o pagamento indevido de 11.770,01€”, lê-se no documento.

O tribunal termina com uma série de recomendações ao ministério da Economia e ao das Finanças, bem como à própria direcção do IAPMEI, no sentido de nomearem o fiscal único, distribuírem verbas que estão à guarda do IAPMEI e que pertenciam às extintas direcções regionais de economia, de reforçarem as normas de controlo interno e contabilístico, dar continuidade ao processo de extinção do fundo de pensões e de pôr fim ao pagamento de seguros de saúde, de vida e de acidentes pessoais, que custaram 384.572,24 euros entre Janeiro de 2016 e Março de 2018. 

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