Centeno: “As falhas na supervisão não podem voltar a ser desculpa”
O ministro das Finanças, Mário Centeno, disse que hoje que as falhas na supervisão financeira "não podem voltar a ser desculpa", considerando que uma das lições da crise é a necessidade de os supervisores coordenarem decisões e acções.
“As falhas na supervisão não podem voltar a ser desculpa. As decisões têm de ser partilhadas. Os supervisores têm de se sentar à mesma mesa e entender-se, porque passam a ser corresponsáveis nas decisões de supervisão financeira”, disse no encerramento da conferência ‘Portugal: Crescimento e reformas no contexto da zona euro’, organizada pelo Banco de Portugal, em Lisboa.
O governante defendeu a proposta do Governo de reforma da supervisão financeira, actualmente no Parlamento, considerando que “reforça a interdependência dos supervisores financeiros”
O ministro das Finanças explicou ainda que a proposta de reforma da supervisão financeira reforça a independência do Banco de Portugal e que o diploma apenas clarifica a sua sujeição à fiscalização da Inspecção-Geral de Finanças (IGF).
“No que se refere à IGF, o Banco de Portugal, enquanto pessoa colectiva de direito público, já está sujeito à fiscalização da IGF. A proposta de lei vem mesmo esclarecer que a fiscalização da IGF não incide sobre as funções de banco central, aquelas que estão protegidas pelo Tratado da União Europeia”, disse Centeno na intervenção de encerramento de uma conferência organizada pelo banco central, em Lisboa, em resposta às críticas do Banco de Portugal conhecidas na semana passada.
Para Mário Centeno, a “fiscalização da IGF terá, assim, o mesmo âmbito que a jurisdição do Tribunal de Contas”.
Segundo o governante, o diploma proposto pelo executivo “até reforça todas as prorrogativas de independência de que beneficiam os supervisores financeiros e, em particular, o Banco de Portugal”.
A proposta do Governo para reforma da supervisão financeira chegou na semana passada ao parlamento e, com a publicação dos pareceres de cada supervisor, ficaram a conhecer-se as críticas, desde logo do Banco de Portugal, que acusa o executivo de querer reduzir a sua independência.
No parecer divulgado no site da Assembleia da República, a entidade liderada por Carlos Costa considera que a proposta de especificação na sua lei orgânica da intervenção da IGF, ainda que não nas funções de política monetária, “colide, de forma relevante, com o estatuto de independência do Banco de Portugal, atendendo à natureza daquela Inspeção-Geral como serviço da Administração Direta do Estado e situado, por isso, na esfera dos poderes de direção do Ministro das Finanças”.
Segundo o banco central, isso seria uma sujeição ao Governo, o que põe em causa a sua “autonomia de gestão”, uma vez que a IGF é um “serviço da Administração Direta do Estado, subordinada aos poderes hierárquicos de um membro do Governo”.
Actualmente, como controlo externo, o Banco de Portugal tem um auditor (a Deloitte, de momento) e pode ser inspeccionado pelo Tribunal de Contas.
Já a 7 de março, na conferência que se seguiu à aprovação da proposta em Conselho de Ministros, Centeno disse aos jornalistas que a possibilidade de a Inspecção-Geral de Finanças fiscalizar a gestão financeira do Banco de Portugal, à excepção das acções que estão relacionadas com as funções monetárias, já existe e que “não há nenhuma alteração do quadro legal do envolvimento da IGF”, que pode fiscalizar o uso de dinheiros públicos e a contratualização financeira do BdP.
O parecer do Banco de Portugal, conhecido na semana passada, considera ainda que a alteração feita às causas da exoneração do governador significa “um limite à independência dos bancos centrais”, uma vez que traz “especificidades nacionais” para os motivos de afastamento do líder máximo do banco central.
Apesar de a proposta do Governo já estar na Comissão parlamentar de Orçamento e Finanças, ainda faltar o parecer do Banco Central Europeu (BCE), que pode considerar que algumas normas colidem com o estatuto europeu dos bancos centrais, sobretudo relativas à independência do Banco de Portugal, segundo fonte próxima do processo.
Apesar de esse parecer não ser vinculativo, caso considere que algumas normas são ilegais ao abrigo do Tratado da União Europeia e Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais, Portugal fica numa situação difícil, porque mesmo que decida avançar com a legislação com essas normas pode ficar sujeito a um processo por incumprimento por parte da Comissão Europeia, que poderia mesmo chegar ao Tribunal de Justiça da União Europeia.