Um milhão de pessoas nas ruas de Londres contra o “Brexit”
Capital britânica recebe protestos que pedem uma segunda votação sobre saída da União Europeia. Mayor de Londres diz que é preciso tirar a decisão "da mão dos políticos". Portugueses levantaram bandeira nacional na manifestação a favor de novo referendo.
Um milhão de pessoas saiu este sábado para as ruas de Londres para pedir um segundo referendo sobre a saída do Reino Unido da União Europeia.
A marcha no centro da capital inglesa realizou-se depois de o prazo estipulado para a saída ter sido empurrado de 29 de Março para 12 de Abril.
Os organizadores esperavam que a manifestação ultrapassasse a de 2018, que reuniu cerca de 700 mil manifestantes. A marcha terminou em frente ao Parlamento, onde alguns deputados ainda discursavam ao início da tarde.
Sadiq Khan, presidente da câmara de Londres, anunciou a sua participação na manifestação, afirmando que o Reino Unido tem de agir rapidamente: “Estamos a dias de cair num precipício com consequências catastróficas. É tempo de tirar [esta decisão] das mãos dos políticos e dá-la de novo ao povo. Não importa como votaram no referendo, podemos todos concordar que o caminho que nos estão a obrigar a seguir não é do interesse nacional.”
Também a primeira-ministra escocesa, Nicola Surgeon, fez parte dos protestos. A governante diz que a Escócia — onde 62% dos votos foram favoráveis à permanência na UE — foi esquecida nas negociações para o “Brexit”. “A primeira-ministra e o seu governo provaram ser completamente incapazes de concretizar o resultado da votação de 2016, e é por isso que o correcto é que [a decisão] volte para as pessoas.”
O número dois do Partido Trabalhista, Tom Watson, insistiu que Theresa May tem ignorado as propostas da oposição para “pôr de lado as diferenças partidárias” e chegar a um acordo sobre as negociações do “Brexit”. “[Theresa May] tornou impossível a qualquer pessoa que se preocupa com os postos de trabalho, com a solidariedade dentro e fora do Reino Unido, com a amizade além fronteiras e entre comunidades, apoiar este ‘Brexit’”, afirmou perante a multidão. E concluiu: “Primeira-ministra, você perdeu o controlo. Deixe as pessoas recuperarem o controlo.”
Do outro lado, Nigel Farage, antigo líder do partido independentista do UKIP, esteve numa manifestação que tem a mensagem oposta da que se vive em Londres. Em frente a 200 apoiantes reunidos em Sunderland, no nordeste do país, Farage afirmou que Theresa May reduziu a nação a um “estado de vergonha”. O político garantiu, ainda, que os manifestantes de Londres não eram uma maioria.
Aproximadamente 17,4 milhões de britânicos — cerca de 52% dos votos — optaram por deixar a União Europeia no referendo de 2016, enquanto 48% votaram a favor da permanência.
O processo de saída do Reino Unido da UE está actualmente num impasse devido à falta de uma maioria de deputados que aprove o acordo negociado pelo governo com Bruxelas, tendo a UE aceitado adiar a data de saída prevista para 29 de Março por duas semanas, até 12 de Abril. Este prazo poderá estender-se até 22 de Maio se o parlamento britânico entretanto aprovar um acordo.
Portugueses levantaram bandeira nacional na manifestação a favor de novo referendo
Um grupo de portugueses levantou a bandeira nacional durante a manifestação em Londres a favor de um novo referendo ao “Brexit”, argumentando que os britânicos agora estão mais informados e que têm o direito de mudar de opinião.
“Eu acho que o momento em que fizeram o primeiro referendo foi muito inoportuno e agora é uma altura em que as pessoas estão mais informadas. Acho que é a altura para nós, que não tomámos uma posição anteriormente, tomarmos uma posição agora”, afirmou o luso-angolano Lando Armada à agência Lusa.
Ao levar uma bandeira portuguesa, o grupo quis sinalizar a presença e a solidariedade dos portugueses com os restantes manifestantes, que, segundo os organizadores, rondou um milhão de pessoas.
“Temos alguma preocupação porque poderá afectar-nos directamente e devemos como companheiros de país e de cidade estar do lado deles e preocuparmo-nos e apoiarmos e participar”, justificou António Borges, natural de Lisboa e no Reino Unido há quatro anos.
Este profissional da hotelaria concorda que as pessoas estão mais informadas e que na altura do primeiro referendo, em 2016, existia muita imigração que influenciou grande parte dos 17,4 milhões de britânicos que votaram pela saída do Reino Unido da União Europeia.
“Neste momento o povo está mais informado e deviam dar uma nova oportunidade ao povo de decidir novamente sobre o “Brexit”. Eu acho que neste momento o povo terá uma outra opinião”, acredita.
Miguel Alves lembra que a própria primeira-ministra, actualmente empenhada em cumprir a “instrução” dada pelos eleitores em 2016, fez inicialmente campanha pela permanência na UE. “É importante mostrar à Theresa May que o que ela está a fazer é um disparate de todo o tamanho e que deve dar a oportunidade aos eleitores para, se tiverem de mudar o sentido de voto, para poderem mudar porque, no caso dela, ela mudou também o sentido de voto. Se ela pode mudar de campo, nós também podemos, e os eleitores britânicos também podem”, disse à Lusa este motorista, natural de Viseu.
Já Guilherme Rosa, antigo autarca em Londres, não acredita que a manifestação de hoje consiga convencer o governo a promover um novo referendo que reverta o resultado anterior, mas espera que seja importante para pressionar a favor de um “Brexit" mais suave.
“É de facto uma forma de pressionar e de os decisores políticos verem que cada vez mais pessoas estão alerta. Esta maioria silenciosa de pessoas que são contra um “Brexit” tresloucado e altamente prejudicial é mais uma ajuda, mas de facto não será capital”, admitiu.
Juntamente com a petição a favor da revogação do artigo 50.º, que hoje já soma 4,6 milhões de assinaturas, o protesto serve para “um chamar de atenção muito grande para a Theresa May e para o governo que as pessoas estão cada vez a insurgir-se mais contra isto”.
Sob o lema “Pergunta ao Povo”, a manifestação foi organizada pela campanha “People's Vote”, que deseja que um acordo para o “Brexit” aprovado pelo parlamento seja de novo submetido a referendo, com a opção de permanecer na UE.