Esta sexta-feira, “se houver testes, eles realizam-se e se os alunos faltarem, têm falta”. É “um dia normal. Não estamos a encarar a greve de maneira especial”, garante Eduardo Lemos, director da Escola Secundária Eça de Queirós, na Póvoa de Varzim e presidente do Conselho das Escolas. A maioria dos directores que o PÚBLICO contactou diz que a rotina não será alterada por causa dos protestos relacionados com a Greve Climática Estudantil.
Os protestos estão marcados para cidades de Norte a Sul do país e nas regiões autónomas. No Facebook, estão marcados protestos em prol do ambiente em pelo menos 28 cidades. E não são apenas os estudantes portugueses que se manifestam nesta sexta-feira. Há greves marcadas em meia centena de países. Todos se inspiram na adolescente sueca Greta Thunberg, que ao longo de várias sextas-feiras fez greve às aulas para chamar a atenção para o problema das alterações climáticas.
Foi também nas redes sociais que os estudantes encarregues da organização da greve em Portugal deixaram uma mensagem sobre a justificação de faltas às aulas: “Da parte da organização da Greve Climática Estudantil não haverá faltas justificadas. No entanto, existem escolas que apoiam a greve e estão a justificar faltas.”
Mas a questão não é assim tão simples. Para o director da Eça de Queirós, “não está previsto, quando os alunos faltam às aulas para participarem numa manifestação (qualquer que seja), que isso seja uma falta justificada”. “Trata-se de uma actividade que não está prevista no nosso plano de actividades e que não está prevista na lei como uma causa para justificar faltas”, esclarece.
O entendimento de Eduardo Lemos é partilhado por vários directores. “Não temos enquadramento legal para validar uma ausência destas”, explica Júlio Santos, do Agrupamento de Escolas do Restelo. Carlos Luís, do Agrupamento de Escolas João de Deus, em Faro, até defende que “a greve é um direito dos assalariados” e não dos alunos. Da parte da Escola Secundária Clara de Resende, no Porto, “a orientação é não justificar”, reconhece Maria do Carmo Oliveira, assessora da direcção. Quanto aos testes, “se estão marcados, estão marcados”, afirma.
No Liceu Camões, em Lisboa, “a escola não tomou uma posição relativamente a esta questão porque isso seria abrir um precedente”. “Hoje é pelo clima, amanhã pela violência doméstica, depois sobre outra coisa”, diz o director João Jaime. “Um aluno que não vem à escola, nós não sabemos se foi ou não foi. Mas claro que uma carta do encarregado de educação será analisada pelo director de turma”. Acima de tudo, nota, “é uma falsa questão achar que só se pode fazer uma manifestação se se tiver falta justificada. Ninguém vai ser excluído por faltas por causa desta iniciativa.” Quanto aos testes, admite que existam. “É natural que haja testes. Há sempre entre esta semana e a próxima. Não sei se conseguiram negociar com os professores.”
A questão também foi colocada a Isabel Le Guê, professora de Inglês na Escola Secundária Rainha Dona Amélia, em Lisboa, pelos seus alunos do 7.º ano. “Eu aproveitei para ter uma conversa pedagógica sobre o assunto. Expliquei o que era uma greve, que quando as pessoas fazem greve é porque acreditam na causa e, por acreditarem, abdicam de um dia de vencimento. Fiz a pedagogia toda”, lembra. “E depois perguntei: Agora, digam-me lá vocês, os estudantes que não recebem nada, qual será o sacrifício? Eles imediatamente perceberam: São as faltas injustificadas.”
Caso a caso
Também na capital, mas no agrupamento de Escolas de Alvalade, a justificação de faltas “depende da dimensão [do protesto] e da forma como isto correr”, admite a directora Dulce Chagas. “Se percebermos que não é um aproveitamento para outras coisas e que eles estão de facto mobilizados para a causa…”
“Haverá algum fechar de olhos em algumas situações, mas acho que eles sabem que têm deveres e que sexta-feira é um dia de aulas”, diz Manuel Esperança, director do Agrupamento de Escolas de Benfica, em Lisboa.
Da parte da directora do Agrupamento de Escolas Dona Filipa de Lencastre, em Lisboa, o essencial é também perceber se “os estudantes foram à manifestação”. “Tenho a certeza absoluta que haverá sensibilidade dos professores”, garante Laura de Medeiros.
A certeza de que os alunos não serão prejudicados também é dada por Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas. E nos casos em que não há disponibilidade para alterar datas de testes ou justificar faltas, isso pode demover alguns estudantes? “Pode, mas quando há fortes convicções, as coisas fazem-se.” Já o director-executivo da Associação de Estabelecimentos de Ensino Particular, Rodrigo Queiroz e Melo, lembra a importância “da mobilização da juventude em prol de uma causa em que acreditam”, mas admite que o tratamento da questão vai “depender do estabelecimento [de ensino] e do impacto” do protesto.
Escolas “também têm de mudar”
O que querem afinal estes jovens? “Chamar a atenção do Governo para a crise climática e exigimos que a sua resolução seja uma prioridade”, lê-se na página do Facebook da Greve Climática Estudantil.
Os directores prevêem uma fraca adesão ao protesto, mas não poupam elogios à iniciativa. “Tenho um respeito absoluto por isto”, diz Laura de Medeiros. Filinto Lima também diz que “é de louvar a tomada de posição”. Da parte de João Jaime, “esta é uma causa que os vai despertar”. “Já há muito tempo que não há causas a despertar os jovens.”
A associação ambientalista Zero, que também “aplaude” a iniciativa lembra, em comunicado, que “se os jovens lutam pelo clima, as escolas também têm de mudar”. E apela à adopção de hábitos mais sustentáveis como a utilização de sistemas de energias renováveis, a implementação de menus vegetarianos nas cantinas ou acabar “obrigatoriamente” com o uso de plásticos de utilização única.
O partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN) também está do lado dos estudantes. O deputado André Silva vai juntar-se à marcha em Lisboa que vai do Largo de Camões até à Assembleia da República.