“Chegámos ao fim do que podíamos fazer para vos ajudar”, diz Barnier a Londres
Horas antes de nova votação na Câmara dos Comuns, europeus lembram que os graves prejuízos do "no-deal" não devem ser subestimados, mas garantem estar preparados.
Eis a mensagem da União Europeia para o Reino Unido, horas antes de os deputados britânicos votarem sobre se preferem que o “Brexit” decorra de uma forma disciplinada ou se arriscam deixar a União Europeia, dentro de duas semanas, sem assinar qualquer acordo com os parceiros continentais: a escolha é vossa e nós não vamos fazer mais nada para resolver esta crise. “Já chegámos ao fim do que podíamos fazer para vos ajudar”.
“O momento é muito grave, mas a União Europeia está preparada para lidar com a situação”, garantiu Michel Barnier, o negociador chefe para o “Brexit”, na manhã desta quarta-feira no Parlamento Europeu de Estrasburgo.
O diplomata foi muito claro na sua avaliação do resultado da votação de terça-feira à noite na Câmara dos Comuns, que culminou com uma nova rejeição do acordo de saída negociado entre o Reino Unido e a UE. “O risco de uma saída acidental, de forma desordenada e sem acordo, nunca foi tão elevado”, afirmou. “Peço que não subestimem esse risco e as suas consequências”, acrescentou.
Para que não restem dúvidas — ou ilusões — em Londres de que a UE chegou ao fim da linha, Barnier repetiu aquilo que os europeus têm vindo a dizer há mais de cem dias, desde que foi fechado o acordo de saída do Reino Unido da UE. “Se a vontade é sair de forma ordenada, este é o único acordo disponível”, lembrou Barnier acenando o calhamaço de quase 600 páginas do tratado jurídico que fixa os termos do divórcio, desde os direitos dos cidadãos às contribuições financeiras e à delicada questão das fronteiras na ilha da Irlanda.
Ao seu lado, o vice-presidente da Comissão Europeia, Frans Timmermans, reforçou essa ideia. “A nossa posição não vai mudar”, avisou os britânicos. “Nós continuamos na mesma linha que é de, num processo que vai provocar enormes prejuízos, procurar fazer o mínimo dano possível aos nossos cidadãos”, recordou.
“Encontrámos aquela que é única solução possível, tendo em conta as linhas vermelhas do Reino Unido, e a nossa exigência de evitar o regresso dos controlos de fronteira na Irlanda e proteger o mercado único”, considerou. “Agora estamos nas mãos do sistema político britânico. A solução tem de vir de Londres”, insistiu.
“Se procuram respostas, têm de olhar para Londres e não para Bruxelas”, sugeriu Margaritis Schinas, o porta-voz do presidente da Comissão Europeia, minutos depois.
Depois de rejeitarem, pela segunda vez, o acordo de divórcio negociado pela primeira-ministra, Theresa May, os deputados britânicos votam esta noite uma moção para afastar a possibilidade de uma saída da União Europeia sem acordo. A líder conservadora deu liberdade de voto à sua bancada — apesar do seu eurocepticismo, os tories deverão recusar o salto no precipício que seria um “no-deal ‘Brexit’”.
Partindo do princípio que essa posição prevalece, na quinta-feira será realizada nova votação na Câmara dos Comuns, para que o Governo britânico continue a negociar com a UE. Para isso, Downing Street terá que avançar com um pedido formal de extensão do prazo de aplicação do artigo 50.º do Tratado de Lisboa — os 27 chefes de Estado e governo da UE decidirão (por unanimidade), no Conselho Europeu da próxima semana, se aceitam.
Esta manhã, tanto o negociador chefe da UE, como o vice-presidente da Comissão como a secretária de Estado dos Assuntos Europeus da Roménia, que detém a presidência da UE neste semestre, lançaram um balde de água fria às pretensões dos britânicos. “Estamos abertos a conversar desde que haja um fim à vista”, sublinhou Melania Ciot. “Prolongar as negociações para quê”, perguntou Michel Barnier. “A negociação sobre o artigo 50º está feita. Temos um acordo, que é este que está aqui”, apontou.
O líder da bancada do Partido Popular Europeu e candidato a presidente da Comissão, Manfred Weber, pediu aos líderes para condicionar a sua decisão à apresentação pelo Reino Unido de uma “razão lógica” que justifique o adiamento da data do “Brexit”. “Não podemos continuar eternamente reféns da indecisão britânica. Sem uma clarificação de Londres, não há motivo nenhum para prolongar a negociação”, defendeu.
Manifestando sintomas agudos de “fadiga” do “Brexit”, o eurodeputado alemão lamentou que o processo de divórcio continue a desviar as atenções dos líderes e a dominar os trabalhos das instituições, em detrimento de outros temas. “No próximo Conselho Europeu continuaremos a discutir o ‘Brexit’ e não a China e os outros problemas e desafios para o nosso futuro”, criticou. “Que desastre”, desabafou.