Costa tem "curiosidade" em conhecer relatório do Banco de Portugal sobre a sua actuação no BES
António Costa garante que o dinheiro a injectar no Novo Banco é "um empréstimo" e não terá custos para os contribuintes. Primeiro-ministro voltou a dizer que "agradecia" uma comissão de inquérito ao que se passou no banco.
Heloísa Apolónia, do PEV, arrancou o debate quinzenal desta quinta-feira com uma pergunta sobre o Novo Banco. “Como é que tem cara para dizer que não tem mais dinheiro para a saúde, educação e professores, mas quando se trata de injectar para a banca, neste caso para o Novo Banco, há sempre dinheiro?”, questionou, qualificando como desastrosos “o trabalho” do PS de venda simbólica à Lone Star e o contrato. O primeiro-ministro defendeu que a injecção de dinheiro é um empréstimo, mostrou disponibilidade para uma comissão de inquérito e interesse em conhecer as auditorias internas à actuação do Banco de Portugal sobre o Novo Banco.
Na resposta à deputada, o primeiro-ministro enumerou várias medidas, incluindo os descontos nos passes, para exemplificar a despesa noutras áreas. “É isso que respondo quando digo que não tenho dinheiro para coisas que não prometi fazer”, disse, vincando a diferença relativamente ao Novo Banco. Nesse caso, adiantou, “o Estado não investiu dinheiro dos contribuintes, nacionalizando, comprando, oferecendo uma garantia, o Estado simplesmente emprestou dinheiro para a 30 anos ser pago pelos bancos ao fundo de resolução”. Um valor que, garantiu, não irá além do que está estipulado: 3,9 mil milhões, num tecto máximo por ano de 850 milhões de euros.
A deputada de Os Verdes defendeu que o Novo Banco deveria “estar no controlo público para benefício do país”, já que continua a ser um sorvedouro”. António Costa voltou a dizer que se trata de um empréstimo tal como qualquer cidadão recorre a um crédito para comprar casa.
Costa "agradecia" comissão de inquérito
O PSD insistiu na questão do Novo Banco. O vice-presidente da bancada, Adão Silva pegou nas declarações de quarta-feira do primeiro-ministro – que lançou a ideia que seria "adequada" uma comissão de inquérito ao período posterior à resolução do BES e que a auditoria pedida pelo Governo apenas poderia ser sobre o período até à decisão de divisão do banco – para questionar o porquê de a auditoria não se reportar também ao processo de venda do Novo Banco (que foi feito pelo Banco de Portugal).
António Costa respondeu que não cabe ao Governo “supervisionar” o Banco de Portugal (BdP) e que, tendo o Novo Banco sido gerido pelo regulador depois da resolução, uma vez que é o banco central a entidade de resolução em Portugal, o executivo “não pode ordenar uma auditoria ao BdP sobre o pós-resolução”. Mas ao mesmo tempo não deixou de provocar o PSD lembrando que da parte do Governo não há nenhum problema e espera que a mesma disponibilidade seja dada pelo Banco de Portugal e pelo responsável pela resolução, Sérgio Monteiro, ex-secretário de Estado do PSD.
O primeiro-ministro voltou a mostrar “total disponibilidade” para que se faça uma comissão de inquérito a esse período temporal do Novo Banco: "Pela nossa parte só agradecemos que alguém promova a constituição de uma comissão de inquérito", disse. “Porque a Assembleia da República pode fazer um inquérito e apurar o que suscita curiosidade ao Presidente da República, a muitos portugueses e até a mim próprio. Eu também gostaria de conhecer as auditorias do BdP que nunca foram publicadas e conhecidas”, lançou António Costa em jeito de desafio.
Entretanto, o líder parlamentar do PS Carlos César recusou para já a constituição de um inquérito parlamentar, alegando falta de tempo. Para os socialistas, esta poderá e deverá ser feita, mas depois de ser conhecida a auditoria pedida pelo Governo.
Em causa está a auditoria interna realizada pela Boston Consulting Group a pedido do Banco de Portugal sobre a actuação do regulador no caso BES. O famoso relatório "Costa Pinto" nunca foi conhecido e que agora, PS e BE querem ter acesso via comissão de inquérito à Caixa Geral de Depósitos.
Divergência negada
Foi já em resposta a uma interpelação ao BE que António Costa rejeitou qualquer “divergência” com o Presidente da República sobre a auditoria ao BES/Novo Banco. “A curiosidade [de Marcelo Rebelo de Sousa] não é diferente da minha. Tem uma liberdade de expressão que o primeiro-ministro não tem”, disse.
Perante a insistência da coordenadora Catarina Martins sobre se ficou surpreendido com as necessidades de capital do Novo Banco, António Costa disse que conhecia o contrato, mas que o Governo não conhecia "a totalidade de contingências de capital do banco, por isso não aceitámos uma garantia nem ficar com o banco. O que aceitámos foi uma garantia limitada no tempo”, disse.
A declaração de natureza mais técnica levou Catarina Martins a gracejar: “Chamemos-lhe garantia, contingência ou Maria Albertina. São mais de 3 mil milhões de euros”. A bloquista interpelou: “O que é que mudou? Foi a proximidade das eleições? PSD, PS e CDS estão todos espantados com a factura que vamos pagar”. Os deputados sociais-democratas apontaram para a bancada do Governo.
O primeiro-ministro rebateu, dizendo que não se trata de uma questão de nome. “Se fosse uma garantia responderíamos por tudo de forma ilimitada”, relançando ainda a pergunta de Catarina Martins – “quantos mais milhões vai custar?” - e a resposta à interrogação. “Não vai custar mais de 3900 mil milhões porque esse é o tecto”, assegurou. “E é pouco?”, atiraram alguns deputados da bancada bloquista.
Governo publica norma interpretativa
Foi o PSD, pela voz de Adão Silva, a mudar a agulha de banco, para o Montepio, defendendo ser imprescindível escrutinar e “demonstrar muito bem” a idoneidade de quem está à frente deste banco mutualista. E quis saber a razão pela qual o Governo quer agora clarificar quem deve fazer escrutínio.
O primeiro-ministro lembrou que foi o seu Governo que mudou o código mutualista alterando a fiscalização para a ASF – Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões, que é quem “tem poder para avaliar todo o sistema de governação, incluindo a idoneidade”.
Porém, como a ASF tem tido dúvidas sobre esse seu poder e nos últimos meses esta autoridade e o Governo têm empurrado entre os dois essa competência, António Costa esclareceu agora que o executivo vai publicar uma “norma interpretativa que tem efeitos desde a data da entrada em vigor do diploma e que retida qualquer álibi à ASF de fazer o que lhe compete fazer que é aferir a idoneidade”.
Cristas acusa Costa de mentir
Depois de várias tentativas, sem sucesso, de fazer António Costa pronunciar-se sobre outros primeiros-ministros envolvidos em casos de corrupção, como os casos de Malta ou Roménia, e de o acusar de “silêncio conivente”, Assunção Cristas pegou também no caso do Novo Banco, questionando sobre os verdadeiros limites para as injecções do Estado.
A líder do CDS citou o ponto 146 da decisão da Comissão Europeia para questionar, por pelo menos duas vezes, se haverá mais imponderáveis que possam levar à injecção de capital para lá dos 3900 milhões de euros. António Costa negou sucessivamente e voltou a referir que o Estado apenas fez um empréstimo ao fundo de resolução que “tem um prazo e um montante máximo limitado e que os bancos têm que devolver aos contribuintes com juros ao longo dos próximos 30 anos”. E Cristas replicou sempre que a sua resposta “não corresponde à verdade”.
“O Governo não dispõe de qualquer informação que venha a exigir, directa ou indirectamente por parte do Estado, qualquer outra intervenção além daquela que se obrigou de conceder o empréstimo ao Fundo de Resolução de 3,9 mil milhões de euros”, garantiu António Costa quando a líder do CDS lhe perguntou se tem alguma indicação se os rácios vão ser cumpridos pelo Novo Banco.
Cristas criticou a “ligeireza” dos comentários de Costa que se referiu ao Novo Banco como um banco mau ou péssimo e Costa replicou com ironia. “Não sou uma agência de rating dos bancos; limito-me a registar que o banco que diziam que era bom tem as necessidades que se vê. E só nestes anos já perdeu 4 mil milhões de euros de capital. Porquê? A fazer fé não resulta da gestão da actual administração; resulta então da forma como foi feita a separação entre banco bom e mau.”
PCP alertou para os riscos da venda em 2017
O primeiro-ministro defendeu que a questão que se colocava era a de como se minimizava os riscos das várias hipóteses que estavam em cima da mesa: o falhanço de uma nova venda, o que implicava a liquidação do banco. “Não há nenhuma moratória aos bancos, há um prazo de 30 anos. Todos os anos os bancos vão ter de pagar as suas contribuições”, afirmou.
Assim que ouviu António Costa, o secretário-geral do PCP concluiu: “Não sou um artista em economia, mas no meio disto tudo quem se vai safar é a transnacional, a Lone Star”. O líder comunista chamou ainda a atenção para as carências de pessoal na Segurança Social, tal como já o tinha feito num debate há seis meses.
O primeiro-ministro voltou a referir as medidas de reforço de pessoal nos serviços e voltou a comprometer-se com um número que disse ter-lhe sido dado pelo Ministro do Trabalho: no próximo semestre, o tempo para a atribuição das pensões será reduzido para 90 dias.
Jerónimo de Sousa registou ainda como um “avanço” os descontos nos passes sociais previstos para o próximo mês, pretexto para o primeiro-ministro referir exemplos concretos de poupança: “Um casal que vive em Setúbal e vem para Lisboa com um filho com um passe Sub 23 vai poupar 360 euros por mês.” António Costa prometeu “a alargar” a medida “a todo o país para que todos possam beneficiar”, um alargamento que foi pedido por Jerónimo de Sousa.
Nem banca nem saúde nem Segurança Social. O deputado André Silva, do PAN, fechou o debate a falar do risco de pobreza das mulheres e lembrou a manifestação de amanhã para assinalar o Dia Internacional da Mulher. O primeiro-ministro aproveitou a deixa para fazer um anúncio: “Amanhã enquanto cidadão também me manifestarei na rua porque é importante sinalizar este combate”.