Portugal mantém todos os direitos para britânicos residentes e exige de Londres igual tratamento
Governo entregou no Parlamento proposta de lei do plano de contingência para o “Brexit”. Britânicos terão de trocar de carta de condução. Estudantes que se inscrevam no ensino superior até final de 2020 não precisam de mudar para o estatuto internacional.
O aviso vem só no penúltimo artigo mas é elucidativo: Portugal só manterá um conjunto de direitos aos cidadãos condicionante da aplicação recíproca de todas as medidas de contingência aos cidadãos do Reino Unido que aqui vivem, se do outro lado do Canal da Mancha as autoridades britânicas tratarem os portugueses da mesma maneira. E isso inclui regras sobre o acesso ao ensino superior e aos cuidados no Serviço Nacional de Saúde, actividade profissional ou até a simples utilização da carta de condução.
“Caso os cidadãos portugueses residentes no Reino Unido não sejam objecto de tratamento equivalente em matéria de direitos de residência, a aplicação da presente lei é suspensa”, lê-se na proposta de lei que o Governo entregou há dias na Assembleia da República, depois de em Janeiro ter anunciado um plano de ajuda para os empresários portugueses. O diploma descreve a forma como serão tratados em Portugal os cidadãos britânicos depois da saída do Reno Unido da União Europeia e estipula esse princípio da reciprocidade. Se não houver adiamento, o "Brexit" está marcado para as 23h de dia 29 de Março. Nesse momento, os britânicos deixarão de estar abrangidos pelo direito de residência conferidos aos cidadãos dos Estados-membros da União Europeia (que lhes permite morar livremente no território).
Todos os actuais direitos ficarão assegurados aos britânicos que residam legalmente em Portugal à data do "Brexit". Cria-se um regime especial que lhes atribui o direito de residência e o reconhecimento da totalidade da sua duração e permitindo a “transição do certificado de registo para a autorização de residência”, seja temporária ou permanente.
Quem aqui more há menos de cinco anos terá direito a uma autorização de residência temporária, ao passo que os residentes mais antigos ficam com uma “autorização de residência permanente ou estatuto de residente de longa duração”. Porém, todos terão de fazer o pedido de emissão de título de residência até 31 de Dezembro de 2020 (o fim do período de transição) e provar que moravam em Portugal à data do “Brexit”. Esse processo será tratado nas câmaras municipais e conservatórias, sob responsabilidade do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.
Além disso, se um britânico quiser continuar a conduzir em Portugal também terá que trocar a sua carta de condução até 31 de Dezembro do próximo ano.
Em 2018 estavam registados como residentes em Portugal 26.516 cidadãos de nacionalidade britânica, mais cerca de 4200 do que no ano anterior, de acordo com dados do Governo.
Os britânicos que já estudam numa instituição de ensino superior portuguesa ou se inscrevam até 31 de Dezembro de 2020 ficam excluídos do estatuto de estudante internacional até concluírem o ciclo de estudos em que se inscreveram ou para o qual transitem. Esse estatuto passará a aplicar-se às novas situações a partir de 1 de Janeiro de 2021.
Os reformados e pensionistas britânicos que vivem em Portugal mantêm todos os direitos à sua pensão; os funcionários públicos originários do Reino Unido têm o seu vínculo de trabalho “constitucionalmente protegido (…) pelo princípio da equiparação”; e todos mantêm o acesso aos cuidados de saúde prestados em todos os serviços e estabelecimentos do SNS.
Para os cidadãos britânicos que desenvolvem actividades profissionais em Portugal (“desde que exercidas legalmente”) também nada muda – mesmo para os que têm uma autorização por um curto período de tempo -, incluindo o reconhecimento das suas qualificações profissionais. No Algarve, por exemplo, há muitos britânicos a operar no sector do turismo e do imobiliário.
O deputado do PSD eleito pelo círculo da Europa, Carlos Alberto Gonçalves, diz que o plano é "excessivamente generoso" por se basear na "expectativa da reciprocidade" e realça que o Reino Unido podia ter optado por permitir o registo automático aos cidadãos dos outros Estados-membros e não o fez. O que preocupa o deputado é a falta de apoio do Estado português à enorme comunidade de cerca de 400 mil portugueses no Reino Unido, sobretudo em matéria de documentação pessoal - que será essencial neste processo.