Cães e gatos também sofrem com as alterações climáticas
As gatas estão com mais um ciclo de gestação ao longo do ano. As doenças parasitárias de cães e gatos e o seu risco de transmissão estão a aumentar. A sazonalidade das pulgas e carraças está cada vez mais esbatida e os tratamentos já não são tão eficazes e duradouros como antes. Tudo isto devido ao aumento da temperatura global do planeta.
A depressão Kyllian activa o alerta vermelho nos Açores, mas no continente são esperados 26 graus para o fim-de-semana. Nas redes sociais a euforia de ter uma amostra do Verão a meio do Inverno faz-se notar de imediato. Os termómetros estão completamente descontrolados e em vez de termos medo, ficarmos alarmados ou entrarmos em pânico, achamos o máximo. Fazemos planos para ir à praia, à esplanada, ao parque ou a outros locais onde possamos levar os nossos queridos animais de estimação. Porque não 26 graus em Fevereiro? O sol sempre é mais agradável do que a chuva, o vento ou a neve nas terras altas.
O humano é realmente um ser curioso. Sempre que pode corre na direcção oposta, resiste à mudança ou desacredita num futuro pouco risonho. São precisamente estes comportamentos que uma boa parte de nós tem em relação às alterações climáticas. Pensar que as mudanças do clima podem ser uma ameaça à nossa existência, à da nossa família, amigos, colegas de trabalho e conhecidos acciona um conjunto de mecanismos de defesa como a negação, a repressão ou a distância psicológica. Em 2030? Em 2050? Xiiiii, ainda falta tanto tempo.
Esta apatia tão peculiarmente humana pode ser causada pela falta de alinhamento entre o conhecimento, a emoção e a acção. Como as histórias sobre alterações climáticas são quase sempre herméticas e complexas, o desinteresse aumenta e a curiosidade e conhecimento mantêm-se inalteráveis. Sem noção do impacto das alterações climáticas no seu dia-a-dia, o humano fica abnegado e não reage. Conhecimento, emoção e acção. Poderão os animais de estimação assumir um papel fundamental neste alinhamento? Consta que sim.
Ficamos emotivos quando sabemos que as baleias morrem com plástico no estômago: mais de 1000 objectos, mais de 80 pedaços, 80 sacos, 30 sacos, 29 quilos, oito quilos, seis quilos. Ficamos possuídos quando um cavalo-marinho “passeia”, no seu habitat, com uma cotonete presa à cauda. Ficamos indignados quando as tartarugas são encontradas presas às redes de pesca ou com plástico preso na carapaça, pernas ou nariz. As imagens são chocantes e ferem o mais íntimo do nosso ser. Acertam, como setas, no “eu interior”. Parece que a tendência básica do humano para a compaixão atinge o auge quando se trata de animais em perigo.
Na verdade, os animais são tão lesados pelas alterações climáticas quanto as pessoas. As inundações da Argentina, em 2016, afectaram mais de 30 mil pessoas e vitimizaram quase 24 mil cães, cavalos e bois. Durante e após os episódios de secas, tempestades, inundações, fogos, ondas de calor e de frio, milhões de animais domésticos e selvagens morrem ou sofrem com a falta de comida, água e abrigo, ficando vulneráveis a doenças e ao abandono.
Estará o ser humano mais disposto a combater as alterações climáticas se a ameaça envolver os seus animais preferidos? Será mais empático com os animais do que consigo próprio? Há já alguns estudos que indicam que sim. A ser verdade, não podemos deixar escapar a oportunidade de explorar respostas empáticas. Descrever os impactos das alterações climáticas nos animais pode suscitar compaixão, sensação de perda potencial, desejo de proteger e noção da necessidade de acção colectiva. Ou seja, levar o ser humano à acção.
No caso de Portugal, onde 56% dos lares têm pelo menos um animal de companhia, podemos começar pelos cães, gatos, peixes e pássaros, os nossos preferidos. As gatas, por exemplo, estão com mais um ciclo de gestação ao longo do ano. As doenças parasitárias de cães e gatos e o seu risco de transmissão estão a aumentar. A sazonalidade das pulgas e carraças está cada vez mais esbatida e os tratamentos já não são tão eficazes e duradouros como antes. Tudo isto devido ao aumento da temperatura global do planeta. Será que as famílias sabem disto e estão a proteger os seus animais convenientemente?
Pode ser melhor explorar esta linha de emoção do que apregoar que as grandes cidades do Médio Oriente e do sul da Ásia se vão tornar letalmente quentes antes de 2050, que durante o Verão o gelo do Árctico pode desaparecer totalmente provocando inundações nas cidades costeiras de todo o mundo ou que os 140 milhões de refugiados climáticos esperados em 2050, em resultado destas e de outras catástrofes, continuarão a fugir do calor extremo, das secas e inundações.
Seja pelos animais ou pelas pessoas, a complacência não pode ser a resposta. As alterações climáticas estão a acontecer em tempo real, com impactos para nós e para os nossos animais de estimação. Deixamos que os eventos climáticos extremos se multipliquem ou alinhamos o nosso conhecimento, emoção e acção?