Como aumentam os salários de 70 mil funcionários públicos em 2019
Cerca de 70 mil trabalhadores do Estado verão o seu salário subir entre 3,43 e 55 euros em 2019, mas alguns perdem os pontos que acumularam na avaliação. Governo explica a medida aos sindicatos nesta sexta-feira.
A forma como o Governo quer aplicar o Decreto-lei que aumenta o salário base da função pública para 635,07 euros é contestada pelos sindicatos, que prometem avançar para os tribunais e recorrer às instâncias europeias. Na origem da contestação está o facto de todos os trabalhadores que tiverem um aumento igual ou superior a 28 euros perderem os pontos na avaliação.
Quem é abrangido pelo aumento da base remuneratória da função pública de 580 para 635,07 euros?
O Decreto-lei 29/2019 aplica-se a todos os trabalhadores da Administração Pública que têm um salário inferior a 635,07 euros.
Os trabalhadores com contratos celebrados ao abrigo do Código do Trabalho também são abrangidos?
Sim. A medida destina-se também aos trabalhadores com contrato individual que exercem funções nas entidades públicas empresariais e nas entidades administrativas independentes com funções de regulação da actividade económica dos sectores privados, público e cooperativo.
Quantas pessoas estão em causa?
O governo assegura que serão beneficiados pelo aumento da remuneração mínima à volta de 70 mil trabalhadores, mas nunca esclareceu quantos destes já iriam avançar para os 635,07 euros por efeitos da progressão na carreira. Olhando para o universo total de mais de 683.000 trabalhadores nas administrações públicas em 2018, serão abrangidos 10% dos funcionários do Estado, deixando sem aumento mais de 600 mil pessoas.
Os trabalhadores adquirem o direito à nova remuneração a partir de que data?
A partir de 1 de Janeiro de 2019. A secretária de Estado da Administração e do Emprego Público, Fátima Fonseca, disse na terça-feira que o Governo deu orientações aos serviços para fazerem um processamento extraordinário de modo a garantir que o acréscimo seja pago ainda em Fevereiro. As escolas, por exemplo, já receberam indicações do Ministério da Educação para actualizarem os ordenados dos cerca de dez mil assistentes operacionais que recebem agora 580 euros.
O acréscimo salarial é pago por inteiro ou por fases?
Por inteiro. Como esclarece a Direcção-Geral da Administração e do Emprego Público (DGAEP), o trabalhador tem direito ao pagamento integral da nova remuneração a partir de 1 de Janeiro de 2019.
Em que posição remuneratória serão colocados os trabalhadores?
Os trabalhadores serão posicionados na escala remuneratória da respectiva carreira ou categoria que corresponda ao 4.º nível da Tabela Remuneratória Única (TRU).
A colocação na nova posição remuneratória depende da detenção de um determinado número de pontos na avaliação?
Uma nota da DGAEP assegura que não e explica que “a colocação na nova posição opera-se por força da actualização da base remuneratória da Administração Pública e não está dependente da posse de quaisquer pontos”. Ou seja, tendo ou não tendo pontos acumulados na avaliação, todos os trabalhadores do Estado que agora têm um salário base inferior aos 635,07 euros transitam para este nível remuneratório.
Há trabalhadores abrangidos pela actualização que perdem os pontos?
Sim. Embora a DGAEP assegure que o aumento da remuneração base não depende da detenção de um determinado número de pontos, certo é que alguns trabalhadores perdem os pontos que acumularam na avaliação de desempenho.
Estão nesta situação os funcionários que agora têm um salário base entre os 580 e os 601,30 euros e que têm um impulso salarial igual ou superior a 28 euros.
Isto significa que um trabalhador que agora tenha oito pontos e que tinha a expectativa de progredir na carreira em 2021 (ano em que, com o final do ciclo avaliativo de 2019/2020, ganharia mais dois pontos) não o poderá fazer. Na prática, este funcionário terá de esperar até 2029 para ter os dez pontos necessários à progressão obrigatória.
Quem é que mantém os pontos?
Quem tem um salário entre 609,32 euros e 631,64 euros manterá os pontos, porque o impulso salarial decorrente da aplicação do diploma é inferior a 28 euros. Trata-se de funcionários situados em posições remuneratórias “virtuais”, ou seja, que na transição para a TRU ficaram com remunerações sem correspondência directa nessa tabela. Nesses casos os “pontos e menções qualitativas relevam para efeitos de futura alteração de posicionamento remuneratória”.
Os trabalhadores que mantêm os pontos podem ter outra alteração de posicionamento remuneratório em 2019?
Sim. Estes trabalhadores, desde que tenham acumulado dez pontos na avaliação de desempenho, passam para a posição remuneratória seguinte, que corresponde a 683 euros. Isso só se concretizará quando o ciclo avaliativo de 2017/2018 estiver concluído, ou seja, em Abril ou Maio. As pessoas nestas condições terão um acréscimo salarial que poderá chegar aos 74 euros.
Quanto custa a medida?
Segundo o Governo, a medida tem um custo associado de 50 milhões de euros. Mas só o aumento do salário mínimo para 600 euros em 2019 já custaria 20 milhões de euros, que estão incluídos na estimativa.
Por que razão os sindicatos contestam a forma como o Governo quer aplicar o Decreto-lei?
Os sindicatos não concordam que o aumento da remuneração base na função pública – uma decisão política tomada pelo Governo – implique a perda de pontos na avaliação de desempenho. As estruturas da UGT e da CGTP defendem que todos os trabalhadores com salários inferiores a 635.07 euros deviam passam para este nível salarial, mantendo os pontos que acumularam na avaliação de desempenho. Isso permitiria que um trabalhador que este ano acumulasse os dez pontos necessário, pudesse avançar mais uma posição na escala salarial e ficar a ganhar 683 euros. Os restantes, iriam progredir nos anos seguintes, à medida que perfizessem os dez pontos.
O que poderá acontecer?
Tanto a Frente Comum (GCTP) como a Fesap (UGT) prometem contestar a medida em tribunal. A Fesap prometeu ainda pedir a intervenção da Provedora de Justiça e recorrer às instâncias europeias. A aplicação do diploma, assim como o facto de mais de 600 mil trabalhadores continuarem sem aumentos foram dois dos motivos da greve que decorreu a 14 e 15 de Fevereiro.
Qual a argumentação do Governo?
O Governo diz que esta solução acelera a progressão dos trabalhadores, porque mesmo quem não tem pontos passa para os 635 euros. O ministro das Finanças, Mário Centeno, justificou também na quarta-feira que o Governo quer assegurar a posição relativa entre trabalhadores.
E explicou que “há milhares de trabalhadores que estão hoje nos 635,07 euros que conquistaram esta posição remuneratória à custa da sua carreira e que têm de ver a sua posição relativa preservada [face] aos que também vão ser incluídos num escalão salarial para o qual não tinham pontos para progredir”. Centeno respondia ao Bloco de Esquerda e ao PCP que questionaram o “apagão” dos pontos da avaliação de desempenho.
Este deverá ser o argumento utilizado pela secretária de Estado da Administração e do Emprego Público, Fátima Fonseca, que nesta sexta-feira se reúne com as três estruturas sindicais do sector para debater a aplicação do Decreto-lei.