Fesap desafia partidos a chamar diploma dos salários ao Parlamento

Conflito aberto entre Governo e sindicatos sobre aumento do salário base no Estado continuou esta sexta-feira, depois de um encontro em que as posições voltaram a extremar-se.

Foto
Rui Gaudêncio

O Governo tentou convencer os sindicatos de que o aumento do salário base no Estado para 635 euros representa uma aceleração das carreiras dos funcionários públicos com remunerações mais baixas e que não tinham condições para progredir na carreira. Mas os representantes dos três sindicatos que nesta sexta-feira à tarde estiveram no Ministério das Finanças saíram das reuniões pouco convencidos e a Federação de Sindicatos de Administração Pública (Fesap) vai pedir aos partidos que chamem o decreto-lei para apreciação no Parlamento e já tem queixas às Provedorias de Justiça portuguesa e europeia prontas a avançar.

“Estão em causa questões de equidade e as legítimas expectativas dos trabalhadores. Não há justificação nenhuma para os trabalhadores perderem os pontos. No ano passado, quando o salário mínimo aumentou para 580 euros, ninguém perdeu os pontos”, critica José Abraão, dirigente da Fesap.

Em declarações ao PÚBLICO o sindicalista diz que além das queixas aos provedores, a federação vai reunir-se com todos os partidos para os convencer a pedir a apreciação parlamentar do decreto-lei que fixa a remuneração base na administração pública em 635 euros. Além disso, está prevista uma vigília, já em Março, em frente à residência oficial do primeiro-ministro.

Ana Avoila, coordenadora da Frente Comum, critica a publicação de um diploma “completamente diferente” do que tinha sido negociado com os sindicatos, que “prejudica os trabalhadores” e “rouba os pontos” da avaliação de desempenho, além de criar “discriminações”, já que permite que um trabalhador que entre agora no Estado ganhe os mesmos 635,07 euros que outro com 20 anos de carreira.

A dirigente promete dar luta ao Governo nos próximos meses. Está previsto um plenário de dirigentes sindicais na próxima semana em frente à presidência do conselho de ministros, onde será aprovada uma resolução e, mais tarde, serão discutidas quais as acções a desenvolver.

Na origem desta discórdia está a forma como o Governo decidiu aumentar a remuneração base. De acordo com o diploma publicado nesta semana, os funcionários públicos que têm um salário base entre os 580 e os 601,30 euros e que têm um impulso salarial igual ou superior a 28 euros com a passagem para os 635,07 euros, usam todos os pontos (sejam os dez obrigatórios ou menos) acumulados na avaliação de desempenho para subirem para este patamar salarial.

Quem tem um salário entre 609,32 euros e 631,64 euros manterá os pontos, porque o impulso decorrente da aplicação do diploma é inferior a 28 euros. Ou seja, transitam para os 635,07 euros e logo que tenham acumulado dez pontos na avaliação de desempenho, passam para a posição remuneratória seguinte, que corresponde a 683 euros (alguns podem subir ainda este ano).

Os sindicatos não concordam com esta solução e defendem que todos os trabalhadores deveriam poder guardar os pontos para depois progredirem na carreira e prometem contestar o diploma em tribunal e pedir a intervenção da Provedoria de Justiça.

"É inadmissível o Governo querer partir para uma futura negociação [da tabela remuneratória única], se é que o quer fazer, com a aplicação de um decreto que limpa os pontos a toda a gente", considerou a dirigente da Frente Comum, citada pela Lusa.

Já antes, a presidente do Sindicatos dos Quadros Técnicos do Estado, Helena Rodrigues, tinha criticado os “anúncios do fim da austeridade”, quando mais de 600 mil funcionários públicos continuam sem aumento. E lamentava o “apagão” dos pontos. “Temos de dizer que a avaliação de desempenho na administração pública não serve para nada, serve para enganar os trabalhadores. E ao fim de uns quantos anos eles [os trabalhadores] têm uma mudança de posicionamento remuneratório se entretanto a lei não mudar e isto não cair", salientou.

Para a secretária de Estado da Administração Pública, Fátima Fonseca, este é “um primeiro sinal de negociação de salários na Administração Pública após dez anos de congelamento”. Em declarações aos jornalistas, a responsável classificou com um “equívoco” a ideia de que o diploma tira pontos aos funcionários públicos.

“O diploma não determina a perda de quaisquer pontos, bem pelo contrário. Para alguns trabalhadores que não reúnam os pontos suficientes para poderem transitar para a nova base remuneratória, o diploma permite essa elevação remuneratória. Quase que atribui os pontos em falta para que os trabalhadores possam atingir a nova base salarial dos 635 euros”, afirmou a secretária de Estado, que convocou os sindicatos para esclarecer a forma como o diploma está a ser aplicado.

O Governo diz que a medida abrange 70 mil funcionários, mas continua sem esclarecer quantos trabalhadores transitam para os 635 euros pelo efeito das progressões (porque já tinham os dez pontos necessários) e quantos “são beneficiados por não terem os pontos”. Ana Avoila não tem dúvidas: “Cerca de 90%” dos trabalhadores abrangidos pelo diploma já estavam a receber desde o ano passado 635,07 euros por via do decreto-lei de execução orçamental que garantia a progressão para esta posição na tabela salarial aos assistentes operacionais. Porém, estes trabalhadores estavam a receber a progressão de forma faseada, estando actualmente a ganhar 607 ou 609 euros”.

Sugerir correcção
Ler 1 comentários