Os maiores escândalos de abuso sexual na Igreja desde a eleição do Papa Francisco
Milhares de vítimas na Alemanha
Em Setembro de 2018, a Igreja Católica alemã publicou um relatório que identificou 3677 crianças como vítimas de abusos sexuais entre 1946 e 2014, a maioria com menos de 13 anos de idade.
As primeiras denúncias surgiram em 2010, na revista Der Spiegel. E em 2017 soube-se que 547 elementos do prestigiado coro Regensburger Domspatzen – dirigido durante 30 anos por Georg Ratzinger, irmão mais velho do Papa Bento XVI – foram vítimas de abusos sexuais entre 1945 e 1992.
A ministra alemã da Justiça, Katarina Barley, disse que o relatório de 2018 é apenas a ponta do icebergue dos abusos sexuais na Igreja Católica do país. Os responsáveis pelo relatório acusaram a Igreja de lhes barrar o acesso a escolas e casas de acolhimento, o que pode ter mantido em silêncio milhares de casos.
Segundo o relatório, a Igreja alemã foi transferindo os padres acusados para outras paróquias sem reportar os casos à polícia nem alertar as comunidades.
Apenas um terço dos 1670 padres implicados foram investigados pela Igreja; e os que não foram ilibados foram punidos com sanções mínimas.
Um cardeal condenado na Austrália
Em Junho de 2017, o cardeal australiano George Pell tornou-se no mais poderoso responsável do Vaticano a ser acusado – e mais tarde condenado – por abusos sexuais.
O antigo arcebispo de Sydney e de Melbourne foi denunciado pela primeira vez em 2002, mas nessa altura o queixoso aceitou que o caso fosse tratado pela Igreja Católica. O resultado da investigação não foi divulgado, mas o cardeal disse que foi exonerado.
As acusações ressurgiram em 2016, numa investigação do canal australiano ABC. A polícia abriu um inquérito e o cardeal viria a ser condenado em tribunal, em Dezembro de 2018, por cinco casos de abuso sexual de dois rapazes na década de 1990. A sentença deverá ser anunciada até ao final de Fevereiro.
Um dia depois da sentença, o Vaticano revelou que o Papa Francisco já tinha afastado George Pell do importante Conselho de Cardeais (o exclusivo grupo de nove cardeais que aconselham o Papa desde 2013).
Ponto de viragem no Chile
Em Janeiro de 2018, durante uma visita ao Chile, o Papa Francisco foi confrontado com as acusações de abuso sexual de rapazes adolescentes contra o padre Fernando Karadima, denunciadas em 2010. Na mesma altura, Francisco foi questionado sobre as acusações de encobrimento pelo bispo Juan Barros.
Numa primeira reacção, o Papa mostrou-se irritado e acusou os jornalistas de escreverem "calúnias".
Mas quando o cardeal de Boston, Patrick O'Malley, veio dizer que as palavras do Papa eram "uma fonte de grande sofrimento" para as vítimas do padre Karadima, o Vaticano nomeou uma comissão para investigar as acusações.
Em Abril, depois de receber o relatório, Francisco disse que tinha errado "na avaliação e na percepção do caso" e acusou a Igreja do Chile de "defeitos sérios" na forma como lidou com as acusações de abuso sexual.
Depois disso, o Papa pediu desculpas às vítimas e convidou três delas para uma visita ao Vaticano.
Em Maio de 2018, os bispos chilenos apresentaram a demissão, e até agora o Papa aceitou sete pedidos – incluindo o do bispo Juan Barros. O padre Karadima foi excomungado no dia 28 de Setembro de 2018.
Novo terramoto nos EUA
Em apenas dois meses, em 2018, os EUA voltaram a ficar no centro das acusações de abusos sexuais na Igreja Católica, num caso que fez lembrar o escândalo na arquidiocese de Boston, revelado em 2002 pelo jornal Boston Globe.
Em Agosto, o procurador-geral da Pensilvânia revelou um relatório em que são denunciadas décadas de abusos sexuais por membros da Igreja Católica naquele estado norte-americano.
Ao todo, foram identificadas mais de mil vítimas, violadas e abusadas sexualmente por mais de 300 padres nas seis dioceses investigadas.
E em Julho de 2018 – um mês antes da divulgação do relatório sobre a Pensilvânia –,o influente cardeal norte-americano Theodore McCarrick demitiu-se do Colégio de Cardeais e perdeu o título na sequência de acusações de abuso sexual de adultos e menores ao longo de várias décadas.
McCarrick foi julgado pela Igreja e considerado culpado. Este mês, tornou-se no primeiro cardeal a ser destituído do sacerdócio pelo Papa.
Igreja de Guam declara falência
As suspeitas de abuso sexual de menores contra o arcebispo Anthony Apuron, da ilha de Guam, começaram a ser discutidas em 2010.
Em 2016, o Papa Francisco substituiu Apuron nas suas funções, e em Março de 2018 o antigo arcebispo foi afastado na sequência de um julgamento no Vaticano.
O caso de Anthony Apuron destapou a verdadeira dimensão dos abusos sexuais na Igreja Católica de Guam – um problema tão disseminado que forçou a instituição a declarar falência em Janeiro deste ano, para se poder reorganizar e pagar mais de 600 milhões de dólares em indemnizações a 190 vítimas de abusos sexuais.
Demissão nas Honduras
O bispo auxiliar Juan José Pineda Fasquelle, conselheiro do cardeal Oscar Maradiaga, apresentou a demissão ao Papa em Julho de 2018.
Fasquelle foi acusado de tentar forçar relações sexuais com seminaristas, uma prática conhecida da Igreja local, segundo o jornal norte-americano National Catholic Register.
As denúncias foram feitas ao bispo argentino Jorge Pedro Casaretto, enviado pelo Papa às Honduras para investigar as acusações de desvio de fundos da Igreja pelo cardeal Maradiaga.
Manto de segredo na Polónia
O ano de 2013 na Polónia foi marcado por uma onda de suspeitas e acusações de abusos sexuais na Igreja Católica.
Alguns casos chegaram aos tribunais, mas o que causou mais discussão no país foi a recusa da Igreja em colaborar com as autoridades.
O então bispo de Drohiczyn, Antoni Dydycz, disse que os padres não devem ser forçados a denunciar casos de abusos sexuais por causa do segredo confessional.
Em Setembro de 2018, o bispo de Varsóvia, Romuald Kaminski, pediu desculpas a quem possa ter sido vítima de abusos na sua diocese. Na mesma ocasião, revelou que a Igreja tinha concluído um documento com casos de abusos sexuais na Polónia e sugestões para os prevenir – um relatório que ainda não foi tornado público.
Sem julgamento na República Dominicana
Em Setembro de 2013, uma jornalista da República Dominicana revelou que o núncio apostólico (embaixador) no país, o padre polaco Jozef Wesolowski, tinha sido afastado do cargo por causa de várias denúncias de abuso sexual de menores durante os cinco anos em que representou o Vaticano.
Wesolowski enfrentou um julgamento canónico e, em Julho de 2014, foi proibido de exercer funções na Igreja Católica.
No fim dessa primeira fase do processo, o Vaticano recusou-se a levantar a imunidade de Jozef Wesolowski, impedindo a justiça da República Dominicana de o levar a tribunal.
Essa protecção viria a cair em Setembro de 2014, e em Junho de 2015 o antigo núncio apostólico na República Dominicana foi acusado de posse de pornografia infantil por um procurador do Vaticano.
O início do julgamento foi marcado para 11 de Julho de 2015, mas Wesolowski viria a morrer no dia 27 de Agosto desse ano, sem nunca ter entrado no tribunal.