A nova directora da ARCO apresentou-se em Lisboa: “O futuro não é de grandes rupturas”
Maribel López diz que há que cuidar do lugar das galerias na sociedade. É esse o papel de uma feira, mostrar como o trabalho das galerias é importante para os artistas. Portugal chega à ARCOmadrid com 13 galerias, entre as quais há uma estreante.
A ARCOmadrid, a feira de arte contemporânea que abre as portas já na próxima semana na capital espanhola, vai apresentar 13 galerias portuguesas, mais uma do que inicialmente anunciado em Novembro. A Galeria Lehmann + Silva, que abriu há dois anos no Porto, também foi incluída no programa Opening, ao lado da Galeria Francisco Fino, de Lisboa, dedicado às galerias mais jovens.
Esta foi uma das novidades que a nova directora da feira, a espanhola Maribel López, trouxe esta terça-feira à apresentação em Lisboa desta edição de transição da ARCOmadrid, uma vez que partilhará ainda a direcção com Carlos Urroz, o director dos últimos dez anos e responsável pela criação da ARCOlisboa, que chegará em Maio a Portugal pela quarta vez. “Os desafios são muitos, porque hoje desenvolver uma feira de arte contemporânea com a qualidade e a exigência com que nós fazemos a ARCOmadrid e a ARCOlisboa requer muito esforço. Mas a feira é algo que está a funcionar, porque nestes anos, com pequenos passos, chegámos a este lugar muito bom, a um nível alto”, respondeu Maribel López ao PÚBLICO, quando interrogada sobre as mudanças que podiam ser introduzidas no futuro.
A ARCOmadrid, que decorre de 27 de Fevereiro a 3 de Março, abrirá com 203 galerias de 31 países, incluindo, no programa geral, as lisboetas 3+1, Bruno Múrias, Cristina Guerra, Filomena Soares, Madragoa, Monitor, Pedro Cera e Vera Cortês, bem como as portuenses Nuno Centeno e Quadrado Azul.
Maribel López, que durante anos foi responsável pelos programas com curadoria especial da feira, destacou ainda a presença da Galeria Miguel Nabinho, também de Lisboa, que regressa a Madrid passados sete anos, integrada no programa Diálogos, num projecto que junta os artistas portugueses Ana Jotta e Pedro Cabrita Reis.
O que poderá mudar na feira são pequenas coisas e Maribel López evita o discurso das mudanças: “Neste momento, creio que o futuro é mais uma questão de detalhes e não de grandes rupturas.”
À Lusa acrescentou que uma das novidades da próxima edição prevista em Lisboa “vai ser um foco em África”, com uma curadoria a cargo de Paula Nascimento, que foi responsável pelo Pavilhão de Angola na Bienal de Arte de Veneza 2013, quando o país ganhou o Leão de Ouro para a melhor representação nacional.
Entre os pormenores que a preocupam, Maribel López fala ao PÚBLICO da importância de melhorar a imagem das galerias. “A feira serve para mostrar a importância que têm as galerias para os artistas. Toda a sociedade tem muito respeito pelos artistas, mas sem as galerias isso não seria possível. Uma feira é uma forma de cuidar do lugar dos artistas de uma maneira muito indirecta. Oferecemos uma ágora para mostrar o bom trabalho das galerias na sua relação com os artistas.”
Nos últimos anos, juntamente com Carlos Urroz, Maribel López destaca a importância de conseguir apresentar galerias que desenvolvem um trabalho de investigação com os seus artistas. “Há galerias que não estavam na feira e que voltaram, demonstrando confiança no projecto, como a Esther Schipper (Berlim), a Chantal Crousel (Paris), a Thaddaeus Ropac (Salzburgo) ou a Hauser & Wirth (Zurique). São galerias que não estavam na feira quando chegámos. Pouco a pouco, fomo-las incorporando.”
A nova directora destaca também a capacidade que algumas dessas galerias têm de se adaptar a feiras diferentes. “Não é o mesmo para a Hauser & Wirth vir à ARCO ou a outra feira. Têm muitos artistas, mas a Madrid vêm só com um projecto de investigação de Jenny Holzer. É uma maneira de ajustar os seus conteúdos ao que a ARCO oferece.”
Este ano, promete a nova directora, vai ser muito visível a iniciativa Projectos de Artista, outro dos pormenores em que têm trabalhado, pedindo às galerias para fazerem um esforço para se concentrarem num artista. “São um total de 38 espaços em que se apresenta o projecto de um só artista. Estão distribuídos pela feira e têm um tamanho variável. Foi uma coisa muito intuitiva, do Carlos e minha, porque eram espaços que não eram bons para dar a uma galeria como stand, mas eram interessantes que as galerias os pudessem utilizar. Além do stand principal, 38 galerias têm este modelo dos Projectos de Artista.”
Peru, o regresso dos países
Tal como a Hauser & Wirth, também a Galeria Cecilia de Torres, de Nova Iorque, chega com um stand inteiramente dedicado a um nome histórico da abstracção da América Latina, o argentino César Paternosto, cujo trabalho mais alargado tem passado pela investigação da herança pré-colombiana, nomeadamente da civilização inca, em estreita relação com o Peru, o país convidado desta edição.
Este ano a feira regressa ao modelo do país convidado, depois de em 2018 se ter concentrado num tema. Do Peru estarão representados 23 artistas, num programa que junta 15 galerias de vários países, comissariado por Sharon Lerner, curadora de arte contemporânea do Museu de Arte de Lima. “Se alguns desses artistas vêm de Lima, muitos deles estão dispersos pelo mundo, trabalhando em cidades como Berlim ou Londres”, explicou a directora, justificando o facto de apenas metade dessas galerias serem peruanas.
No programa paralelo vão ser mostradas duas colecções portuguesas, a colecção Teixeira de Freitas, na Sala de Arte Santander, e a colecção António Cachola, esta em diálogo com a colecção Sánchez-Ubiría. As duas mostras são comissariadas pelas filhas dos coleccionadores, jovens curadoras portuguesas, Luiza Teixeira de Freitas e Ana Cristina Cachola.
Falta de transparência?
No mesmo dia da apresentação em Lisboa, o jornal espanhol El País noticiava que um tribunal espanhol tinha questionado o método de selecção das galerias na feira de Madrid, na sequência de uma queixa apresentada por uma galeria espanhola que não foi escolhida em 2016.
Sem se pronunciar directamente sobre a exclusão da galeria espanhola My Name’s Lolita Art, o juiz citado pelo jornal concluía pela ausência de transparência na selecção, a que deve obedecer um organismo público como o Ifema, a instituição que organiza as feiras de Madrid e de Lisboa. Aos candidatos que o desejem, a feira, segundo o juiz, deve permitir o acesso à forma como a pontuação final é construída pelo comité de selecção, constituído por uma dezena de galeristas que também participam na feira e pela direcção.
“A galeria excluída pode saber a nota final, se pedir, mas não como as pessoas votaram dentro do comité de selecção, porque o voto é secreto”, explicou ao telefone a galerista portuguesa Vera Cortês ao PÚBLICO, que faz parte do comité de selecção da feira de Madrid, já depois de terminada a conferência de imprensa de apresentação da feira em que esteve presente. Os critérios incluem número de exposições feitas pela galeria ou colecções em que os artistas estão representados.
“A ARCO é bastante transparente. Eu não conheço mais feira nenhuma que dê as pontuações e que disponibilize um segundo comité de apelação. Mas o Ifema, que recorreu da decisão, também já disse que não vê nenhum problema em fazer alterações.”