Mães mais velhas têm risco muito superior de ter filhos com paralisia cerebral

Relatório do Programa de Vigilância Nacional de Paralisia Cerebral aos cinco anos de idade deixa pistas que vão ser agora estudadas

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A incidência de casos de paralisia cerebral continua a descer em Portugal Kate Krivanec

Mães mais velhas, que recorrem a técnicas medicamente assistidas, que muitas vezes resultam na concepção de gémeos, são um novo factor a ter a conta quando se olha para a realidade das crianças com paralisia cerebral nascidas em Portugal. É que o risco de uma mulher com mais de 39 anos vir a ter um filho com este problema é 52% mais elevado do que na faixa etária de referência, a dos 20 aos 29 anos. A conclusão consta do relatório Paralisia Cerebral em Portugal no Século XXI, o quarto do Programa de Vigilância Nacional de Paralisia Cerebral aos cinco anos de idade (PVNPCA5), que é apresentado esta quinta-feira na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.

“Há um aumento das mães mais velhas, e isto é um risco acrescido. Estes dados são importantes também por isto, para que quando se assuma uma decisão destas se saiba que há um risco acrescido, por exemplo, de se ter uma criança com paralisia cerebral”, diz ao PÚBLICO Teresa Folha que, com Daniel Virella, coordena este estudo. “Começa a aparecer um padrão de crianças nascidas de mães mais velhas, com maior escolaridade, com gravidez induzida e também mais gémeos”, explica.

Os dados podem ser encontrados no relatório que analisa os casos de crianças nascidas entre 2001 e 2010, olhando também, pela primeira vez, para indicadores regionais. Nos factores socioeconómicos analisados, verifica-se que nas mães com mais de 39 anos o risco de ter um filho com paralisia cerebral é 52% mais alto, uma percentagem que é ainda mais elevada (55%) nas mulheres que concluíram o ensino superior – ainda que os autores do estudo ressalvem que este último factor deve ser encarado “com prudência”, uma vez que nas informações enviadas para o programa, 59,5% foram “omissas” relativamente à escolaridade das mães. Já nos casos de gravidez múltipla, o relatório indica que “o risco de paralisia cerebral tendo nascido de gravidez múltipla foi cerca de 4,5 vezes maior do que na gravidez única.”

Um outro dado que resulta da análise dos indicadores regionais é o de que no Norte há “maior proporção de crianças com paralisia cerebral que nasceram após técnicas de reprodução medicamente assistida” (na região, 7,5% do universo de crianças com paralisia cerebral que o estudo analisa resultaram de reprodução medicamente assistida quando, a nível nacional, a média é de 4,5%) ou de gestação múltipla (13,5% contra 11,5%)”. Esta é a única região em que os dois indicadores estão acima da média, enquanto noutras zonas, no caso de nascimentos com recurso àquelas técnicas, a proporção é inferior à da média nacional, como acontece no Centro (1,5%), Alentejo (1,5%), Algarve (1,8%) ou Madeira (2,2%), região onde também há menos casos associados à gestação múltipla (6,1%). Em relação a este último indicador, o Algarve apresenta a maior proporção a nível nacional: 21,6%.

O que é que isto significa? Teresa Folha admite que ainda não é possível dar uma resposta. “Estes dados que recolhemos são, precisamente, alertas, que nos permitem ir agora à procura de respostas, para tentar perceber o que se passa”, diz.

Casos muito graves

O mesmo irá acontecer em relação a outro dado que resulta da análise geral dos dados compilados pelo PVNPCA5, e que indica que “existe uma grande proporção das crianças paralisia cerebral nascidas em Portugal que tem formas muito graves”. Os autores do relatório admitem que “a estimativa de serem 30 a 40% dos casos” até pode estar “sobrestimada”, mas insistem que “não é possível desvalorizar o grande número de crianças com paralisia cerebral (e presumivelmente também adultos) com afectação funcional grave existente em Portugal, muito frequentemente com associação de vários compromissos funcionais.” Também nesta caso, a procura de respostas vai agora avançar, diz a investigadora. “Vamos começar a fazer essa análise, olhando também para os dados europeus que já temos”, diz.

Ainda assim, a taxa de incidência de paralisia cerebral aos cinco anos nas crianças nascidas em Portugal entre 2001 e 2010 tem vindo a descer e é de 1,55 por mil nados-vivos, um valor inferior ao dos países mais desenvolvidos, que se situa entre as 1,7 e 2,2 crianças em cada mil. No PVNPCA5 estão registadas 1657 nascidas em Portugal, mas o número de residentes é ligeiramente superior – 1719 – e resulta das crianças nascidas no estrangeiro mas que residem em território português.

Os autores do estudo esperam que este retrato mais completo do país ajude a perceber a realidade e a desenhar estratégias para o futuro. Como? Teresa Folha dá um exemplo: “Os dados mostram que o acesso a meios complementares de diagnóstico não é igual” em todo o território. Melhorar a acessibilidade a algo essencial como uma ressonância magnética cerebral nos Açores, ou a um teste cognitivo no Alentejo, pode ser um primeiro passo.

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