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Provedores ou centros de leitores? Ambos

Os provedores estão em vias de extinção e isso não é bom. Os “centros de leitores” estão a aparecer e isso é bom, mas não chega.

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Primeiro ninguém sabia o que era um ombudsman. Depois, todos queriam ter um. A seguir, porque é difícil dizer ombudswoman, a função passou a chamar-se Public Editor. Isto em inglês. Os franceses chamam-lhe médiateur e os espanhóis defensor del público. Em português são os provedores dos media. Agora que fui à procura deles, caí dentro do cliché da agulha no palheiro.

Em Portugal, só encontrei dois: Jorge Wemans (um dos fundadores do PÚBLICO) é Provedor do Telespectador na RTP e João Paulo Guerra é Provedor do Ouvinte na RDP. Já nem o New York Times tem um provedor. A última Public Editor foi despedida em 2017 e a função foi extinta.

Isso é bom ou mau?

Ombudsman é uma palavra sueca que significa “homem representante”. Foi criada no início do século XVIII e a Suécia foi o primeiro país a nomear um funcionário independente para, como ombudsman, investigar as queixas contra o governo e a Administração Pública. Segundo o dicionário Merriam-Webster, a palavra começou a ser usada em inglês no fim dos anos 1950 e na década seguinte estendeu-se a quem responde às queixas contra uma organização (uma escola ou hospital) e a quem zela pela ética dos jornalistas.

Os provedores são um peça vital da auto-regulação dos media — José Manuel Paquete de Oliveira, que morreu em 2016 e foi provedor do PÚBLICO até ao fim, preferia a palavra “autocontrolo”. É ele quem conta (em Comunicação e Quotidiano, Tinta-da-China) que a primeira instituição de autocontrolo criada para os media nasceu em 1906 na Suécia, mas que os primeiros provedores dos leitores portugueses só apareceram nos anos 1990.

O primeiro foi no Record (David Borges, em 1996), a seguir no Diário de Notícias (Mário Mesquita, 1997), depois no PÚBLICO (Wemans, 1997) e no Jornal de Notícias (Fernando Martins, 1998). À RTP e RDP só chegaram em 2006. “Consta que a TVI, no início das suas emissões, teve a intenção de instituir esta figura”, escreve Paquete. Mário Mesquita não se revia na pele de “fiscalizador da ética jornalística” e Paquete também não. Preferiam pensar que eram uma peça do sistema de autocrítica no jornalismo, cujo objectivo era melhorar os conteúdos.

Paquete de Oliveira cita Hugo Aznar para dizer que o trabalho do provedor é bom para os media, mas sobretudo para o público. E conclui (o ensaio é de 2010): “Uma das operações inadiáveis é incluir o público como co-responsável no processo.”

O novo slogan do New York Times diz o mesmo: “Para seguir os factos é preciso coragem. Perseverança. E você.” O Times não reinventou a roda. Há anos que se fala da importância de envolver os leitores e encarar o público como protagonista e não apenas receptor passivo.

Com a velocidade do digital e a tabloidização a crescer, hoje é preciso mais. Li há dias a Graça Franco sobre o suicídio do jornalismo e fiquei comovida. Um primeiro passo é levar os leitores a sério e encará-los como bons vigilantes, não como incómodos outsiders. Outro é recuperar os provedores, colegas sábios, amigos mas distantes, que são pagos para serem antipáticos.

Os provedores são eficazes? Se não melhoram muito as coisas, pelo menos ajudam a que não piorem (roubo a definição ao Joaquim Fidalgo, outro fundador e ex-provedor do PÚBLICO).

O primeiro ombusdman do New York Times foi contratado depois do escândalo de Jayson Blair, o jovem repórter apanhado a inventar, mentir e plagiar em pelo menos 36 artigos. Isso foi em 2003. Tal como as fake news não nasceram agora, os falsos jornalistas também não. Nem os escândalos espectaculares, como Michael Born, na Alemanha (1996) ou Patricia Smith, finalista de um prémio Pulitzer e despedida do Boston Globe (1998).

Em 2017 o New York Times decidiu que precisava de “uma coisa diferente”. Despediu a sua Public Editor a meio do mandato e criou um Reader Center. É um modelo interessante. Funciona na redacção, é gerido por uma jornalista multimédia e tem uma equipa — o mediador deixou de ser uma voz solitária. Faz sentido. O digital aproximou os leitores das redacções e uma pessoa sozinha não consegue responder a tudo. Só o provedor da RTP recebe 180 queixas por semana.

O PÚBLICO também está a criar um novo Conselho de Leitores e já há mais de 500 candidatos para dez lugares. O provedor terá aí assento garantido.

Os provedores estão em vias de extinção e isso não é bom. Os “centros de leitores” estão a aparecer e isso é bom, mas não chega. As democracias precisam de ambos: um sistema para ouvir os leitores e uma voz sábia e independente para fazer a ponte.

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