Cartoon
Com papel e caneta, Camdelafu quer mudar a Venezuela
Em criança, esperava, ansiosa, que chegasse domingo para poder devorar os cartoons que lhe chegavam no jornal. Sem saber, desenhava assim o seu futuro. Hoje, com 27 anos, Camila de la Fuente, nome de ataque Camdelafu, dedica-se à ilustração, animação, pintura, jornalismo e, claro, ao cartoon político e social — e é de lápis afiado que observa a situação da Venezuela, o seu país de origem, a partir do México, o país para onde se mudou quando, há uns anos, sentiu as grilhetas a apertarem-se.
Nascida em 1992, o mesmo ano em que Hugo Chávez tentou chegar ao poder através de um golpe de Estado, a jovem mal se lembra de outro cenário. "Ele estava lá, muito presente, desde o dia zero da minha vida. Não me lembro de outro contexto político na minha vida: o mesmo regime perpetuou-se e isso influenciou a minha maneira de pensar", diz a jovem por escrito ao P3. Encontrou na arte uma forma de, diz, tornar a sua "vida normal", mas sempre aguerrida. Na Universidade de Monteávila, envolveu-se no movimento estudantil, participou em todos os protestos de 2014 "activamente". Mas a "gota de água" deu-se quando começou a trabalhar profissionalmente como cartunista nos média e viveu, na pele, a violência contra as manifestações estudantis. "Senti-me em perigo e decidi sair do país." E, a verdade, é que também ficou muito "frustrada" ao ver que, no fim da onda de indignação, "nada mudara".
Vive no México desde então, um habitat "óptimo" para uma cartunista política (entretanto, formou-se também em jornalismo), mas continua a ter "coração e mente" na Venezuela — daí colaborar com o portal de notícias venezuelano RunRun, mas também com órgãos como Telokwento e El Universal México. E é também directora de comunicação da agência Carton Club, que reúne alguns dos mais importantes caricaturistas de América Latina.
Confessa que gostava de estar, por estes dias, no seu país. A viver em directo este acontecimento "histórico", como descreve o momento em que o líder da oposição, Juan Guaidó, se declarou Presidente interino e anunciou um "governo de transição" à revelia de Nicolás Maduro. "É o momento com que os venezuelanos sonharam durante todas as suas vidas", considera. "Estamos a lutar contra uma ditadura poderosa que não aceita derrota. (...) Queremos justiça e nunca estivemos tão perto de o conseguir."
Entre a felicidade e o nervosismo de que "nada funcione", assiste à distância e agarra-se ao seu superpoder: o cartoon. "Eles são a tradução gráfica do que vivemos na Venezuela, um testemunho vivo que serve de exemplo para que outros países não cometam os mesmos erros." É que a arte, diz, é uma "arma poderosa": "Sempre gostei de desenhar e apercebi-me que podia gerar uma mudança positiva na crise do meu país através da minha paixão. Eu podia enfrentar o poder com uma caneta e um papel, em paz, e a minha representação da ideia deixaria uma marca mais poderosa que qualquer bala atirada por um governo. Os cartoons políticos atacam com inteligência, cultura e humor. São o contrapeso do poder que mantêm a democracia viva."
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