Família do bairro da Jamaica pede que pessoas se manifestem “pacificamente”

Esta sexta-feira há uma manifestação contra o racismo e a violência policial marcada para as 16h em frente à Câmara do Seixal e outra convocada pelo PNR para o final do dia, em Lisboa, de "apoio à polícia" e contra a associação SOS Racismo

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LUSA/MARIO CRUZ

Na página do Facebook A Voz da Mãe Preta, que convocou para a tarde desta sexta-feira uma manifestação em frente à Câmara Municipal do Seixal, foi colocado um vídeo da família Coxi pedindo que o protesto se faça “pacificamente”. Fernando Coxi e Julieta Joia, os pais de Hortencio Coxi, o homem que foi detido no domingo após desacatos entre moradores e agentes da polícia, aparecem acompanhados pelo filho e a mensagem dos três é a mesma: que não haja agressões nem insultos.

A PSP diz que está a preparar um dispositivo “normal” para este e para o outro protesto convocado para esta tarde: uma concentração marcada pelo Partido Nacional Renovador (PNR) de “apoio à polícia” e contra a SOS Racismo, no Terreiro do Paço, em Lisboa.

“Peço à população atenção nas manifestações que estão fazendo. Eu espero que as façam pacificamente, porque a minha religião, os mandamentos, não permitem agressão. Se houver agressão, essa situação recai sobre a minha cabeça. Para que isso não aconteça, peço, por favor, façam pacificamente manifestações. Têm direito de fazer, a lei permite isso, mas não havendo vandalismo. Por isso, espero que tudo aquilo que se passou fique assim.” A mensagem de Fernando Coxi, de 63 anos, não podia ser mais clara e os organizadores do protesto, convocado através das redes sociais, contra a violência policial que consideram ter existido no domingo no bairro da Jamaica e que garantem que existe noutros locais, explicam que ela faz parte da estratégia que estão a montar para tentar que tudo corra da forma mais ordeira possível. “Eles são as pessoas mais prejudicadas, por isso são essenciais para influenciar à não-violência”, disse ao PÚBLICO Hamilton Gaspar.

Ao contrário dos Coxi, Hamilton não mora no Jamaica, mas diz que essa nunca foi condição essencial para a organização do protesto que deve começar pelas 16h desta sexta-feira em frente à câmara do Seixal. “Vivo fora do bairro, mas o que ali se passou tocou-me, porque as coisas não acontecem apenas às pessoas que vivem ali. E o que pretendemos é que de hoje em diante as coisas corram melhor. Queremos ser tratados por igual”, disse.

Na memória de todos está presente o que se passou na segunda-feira, na Avenida da Liberdade, em Lisboa, com o protesto contra a violência policial de algumas centenas de jovens a ser dispersado pela polícia com recurso a disparos de balas de borracha. São cenas como essas que os promotores de A Voz da Mãe Preta querem evitar. Sobretudo depois de, numa reunião com responsáveis da câmara do Seixal, terem sido alertados para a possibilidade de “oportunistas” se infiltrarem no protesto para causar desacatos, explica Hamilton Gaspar. “Temos pessoas de vários sítios, até de fora do Seixal, e estamo-nos a organizar para que haja um líder de cada zona a sensibilizar as pessoas para a não-violência”, diz. “O que aconteceu feriu a nossa sensibilidade, mas em momento algum queremos combater o mal com o mal. Não vale a pena, guerra atrás de guerra não é o melhor caminho.”

Uma cena de conflito entre civis e a polícia filmada no bairro da Jamaica, no domingo, e divulgada através da Internet, está a ser investigada e gerou reacções acesas. Desde a noite de segunda-feira que se têm sucedido os actos de vandalismo, com alguns caixotes do lixo incendiados e viaturas danificadas, na zona de Grande Lisboa e em Setúbal.

Na madrugada desta quinta-feira um autocarro da TST – Transportes Sul do Tejo e mais de 30 caixotes do lixo foram incendiados, enquanto em Loures uma viatura da PSP foi apedrejada. Foi detido um jovem de 16 anos e identificados dois outros, com 13 e 14 anos, mas o porta-voz da PSP garante que, para já, não há mais a informar sobre os autores destes actos de vandalismo, uma vez que as investigações ainda decorrem.

Com reacções a surgirem de vários lados, o Instituto de Financiamento da Agricultura e das Pescas IFAP, um organismo público tutelado pelo Ministério da Agricultura, abriu um inquérito interno a uma funcionária que usou um endereço de email da instituição para enviar duas mensagens electrónicas com conteúdo xenófobo e racista à associação SOS Racismo. E o partido de extrema-direita PNR convocou também um protesto contra esta associação, que designa de “braço armado do Bloco de Esquerda.” Os apoiantes do PNR deverão concentrar-se no Terreiro do Paço às 18h e junto à sede do BE, na Rua da Palma, mais tarde. Com Samuel Silva e Inês Chaíça

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