Comandante nega indisciplina na defesa de Tancos
Rondas distantes 20 horas, como as averiguações já tinham revelado, ajudaram objectivamente ao maior desacerto da história do Exército.
O coronel João Paulo de Almeida, comandante do Regimento de Engenharia 1 (RE1), a força que fazia a segurança a Tancos no dia do assalto de Junho de 2017, negou esta quarta-feira que o furto do material de guerra tenha sido facilitado pela indisciplina da sua unidade. “Confio nos meus militares, na estrutura, nos meus homens”, reiterou na comissão parlamentar de inquérito, referindo-se às conclusões do processo de averiguações e a declarações do antigo chefe do Estado-Maior do Exército, general Rovisco Duarte.
“Quando eu perceber que o Exército acha que não sou útil, saio”. Foi esta a frase mais sonante de uma audição que foi dura como se adivinhava. “Não havia indisciplina [em Engenharia 1], o nível do trabalho que o Regimento tem é prova disso”, defendeu. “Agora, naquele dia algo falhou, foi o RE1 que falhou, para além de outras questões”, admitiu. Numa referência aos efectivos de que dispunha para assegurar a inviolabilidade dos paióis e, sobretudo, à não complementaridade dos meios de segurança, da ausência de sensores à dimensão e tipologia do terreno, da não existência de videovigilância às redes devastadas pela corrosão.
“Há um evento, um incidente, alguma coisa terá falhado, fizemos a avaliação e actuámos” - assim qualificou o assalto e defendeu a sua acção correctora com a punição de três militares, um capitão, um cabo e um soldado. As penas foram ligeiras, porque considerou os antecedentes das folhas de serviço, mas o coronel, exonerado temporariamente por Rovisco Duarte, 15 dias depois reintegrado na chefia do seu Regimento e posteriormente nomeado para o curso de promoção a general, ficou marcado.
“O meu comando teve outras coisas, mas tenho consciência que um evento destes apaga o resto, fizemos dezenas de trabalhos, limpeza dos fundos das barragens e, sem disciplina, isso não seria possível”, argumentou. “Houve a intrusão nos paióis”, prosseguiu, “mas aconteceram muitas outras coisas”, insistiu. No ratio pessoal e curricular, tendo em conta os efectivos disponíveis e o resultado obtido, o coronel João Paulo de Almeida encontrou o balanço para o seu conforto.
Mas a realidade de Tancos é má. Como já fora avançado, a noite do assalto terá coincidido com um intervalo de 20 horas sem rondas, tão injustificável como provocatório, tão militarmente desacertado como grotesco. Nas averiguações efectuadas, alguns dos homens sob o seu comando diziam que a tarefa era para “dormir bem”, que o mato não permitia ver nada, e não foram observadas normas que deviam ser rotina. “Houve o não cumprimento de algumas directivas naquele dia, mas não posso concluir que não eram respeitadas as minhas ordens”, alegou o coronel.
As referências de Rovisco Duarte numa sessão da comissão parlamentar de Defesa que atribuía a situação de Tancos ao desleixo dos comandos não foram sentidas pelo coronel como setas. “Não senti que era para mim”, garantiu. Das insuficiências dos meios de controlo, como todos os oficiais até agora ouvidos pelos deputados, deu indicação aos seus superiores, ao Comando das Forças Terrestres, e estes, seguramente, mais acima, numa escalada que até agora não encontrou responsáveis. Referiu que houve melhorias, mas às 17h de 28 de Junho de 2017, meia-hora depois de ser descoberto que foram esventrados os paióis 14 e 15, os do seu Regimento, as carências históricas fizeram um drama presente que já valeu as “cabeças” de um ministro e de um chefe militar.