Em Beja e Faro mais de 20% não fazem o 1.º ciclo sem chumbar
Alunos dos dois distritos do Sul do país destacam-se pela negativa. Governo apresenta indicador inédito para avaliar desempenho de escolas que tem em conta estatuto socioeconómico das crianças.
As escolas dos distritos de Faro e Beja são as que mais fracassam no objectivo de levar os seus alunos a concluir o 1.º ciclo do ensino básico em quatro anos, que é o tempo normal de frequência deste nível de escolaridade. No 1.º ciclo só são autorizadas retenções a partir do 2.º ano.
Nestes dois distritos, 22% das crianças que se inscreveram na escola pela primeira vez em 2013/14, e que em 2016/2017 deveriam ter chegado ao 4.º ano, transitando para o 2.º ciclo, acabaram por ficar a marcar passo. E isso aconteceu porque chumbaram pelo menos uma vez durante aquela que foi a sua primeira experiência escolar a “sério”.
É o que mostra um novo indicador divulgado nesta quarta-feira pela Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC), que pode ser consultado no portal InfoEscolas. Com base no percurso individual de cada aluno, a DGEEC calculou qual a percentagem dos que conseguiram concluir o 1.º ciclo em quatro anos — por escola, por concelho e por distrito.
Faro e Beja são os distritos que apresentam piores resultados, mas no conjunto dos 18 do país nenhum consegue ter um valor superior a 89% de percursos “limpos de chumbos”. Ou seja, mesmo na região com melhor desempenho, que é Braga, 11% dos alunos tiveram pelo menos uma retenção e, por isso, não o concluíram no tempo normal.
Neste novo indicador, o distrito de Lisboa está 13.º lugar: dos cerca de 23 mil alunos que deveriam ter acabado o 1.º ciclo em 2016/2017, só 82% conseguiram fazê-lo. Com 87% de conclusões em tempo normal, o Porto aparece em segundo lugar empatado com Viana do Castelo. Têm à frente Braga (89%) e atrás Vila Real (85%). No pólo oposto figuram, como já se referiu, Beja e Faro empatados nos 78% de “percursos limpos”, logo seguidos de Portalegre com um registo de 79%.
Nos dois anos lectivos anteriores o panorama foi ainda pior. Em 2015/16, por exemplo, o distrito onde se registou a maior percentagem de conclusões (Viana de Castelo) não foi além dos 87%.
O que mede o ministério?
O InfoEscolas contempla dados sobre mais de 1 milhão e 300 mil alunos e 5200 escolas. Pais, professores e comunidade em geral podem pesquisar informação distrito a distrito, concelho a concelho e escola a escola — dos resultados nas provas de aferição, às taxas de retenção e desistência.
O mais recente instrumento à disposição analisa a percentagem de alunos que terminam o 1.º ciclo no tempo normal. O mesmo exercício é feito para o 2.º ciclo — avaliam-se quantos conseguem fazer o 5.º e o 6.º ano em dois anos. Depois, calcula-se a diferença entre a percentagem de conclusões no tempo normal numa escola, concelho ou distrito e a média nacional registada entre os alunos que à entrada do 1.º ou do 2.º ciclo tinham um “perfil” socioeconómico semelhante — seja em termos de acção social escolar, constituída pelos apoios que o Estado concede aos mais pobres, seja no que diz respeito às habilitações das mães, seja pelo tipo de escola que frequentam (se é pública ou privada).
Estes dois ciclos de escolaridade nunca tinham sido analisados desta forma. É agora possível saber se uma escola (ou um concelho, ou um distrito) está a sair-se melhor do que escolas do resto do país com alunos do mesmo tipo.
Por exemplo: quando se diz que em 2016/17 apenas 78% dos alunos de Faro que entraram quatro anos antes conseguiram acabar o 1.º ciclo no tempo normal, e que o mesmo aconteceu com 84% dos alunos do resto do país que tinham o mesmo "perfil" (ver infografia), isso significa que o distrito de Faro apresenta uma taxa de sucesso que está 6 pontos abaixo da média nacional. Dito de outro modo, as escolas de Faro estão aquém do que seria de esperar face ao perfil das crianças com que estão a lidar.
Os dados relativos a 2016/17 mostram a situação, no final deste ano lectivo, dos alunos que entraram para o 1.º ciclo em 2013/14. Mas a DGEEC analisou mais duas “gerações” de alunos — os que entraram na escola em 2011/12 e os que o fizeram em 12/13.
O Ministério da Educação entende que este é um indicador robusto. Porque “leva em conta o contexto socioeconómico das crianças que a escola recebe à entrada” do ciclo de estudos e porque, “ao valorizar a conclusão do ciclo no tempo normal”, não se está a destacar as escolas que até podem ter bons resultados em termos de notas finais mas que deixam muitos estudantes pelo caminho.
Os distritos com piores desempenhos são também aqueles cujos alunos estão mais distantes dos seus colegas que, a nível nacional, têm o mesmo perfil. É o que sucede em Faro, Beja a Bragança — é aqui que é mais visível a dificuldade que as escolas têm em conseguir que as crianças ultrapassem os constrangimentos ditados pela sua origem socioeconómica, mantendo-se ano após ano a larga distância daquelas que se podem comparar com elas.
O oposto acontece em Braga, Porto e Vila Real — apresentam as melhores taxas de conclusão em quatro anos e são também os distritos que sistematicamente mais superam a média nacional.
Apenas em três dos 18 distritos se registou uma evolução positiva ao longo dos três anos em análise. Em Lisboa, por exemplo, as escolas estão recorrentemente muito aquém da média (entre três e quatro pontos abaixo da média).
No 2.º ciclo, Viseu e Braga são dos que sistematicamente se superam. Em Braga, que já no 1.º ciclo se destaca pela positiva, 95% dos alunos que deviam ter terminado o 6.º ano em 2016/17 fizeram-no. São mais 4 pontos percentuais do que a média nacional observada entre alunos com o mesmo perfil socioeconómico. Em Viseu foram 94%, também mais 4 pontos percentuais do que seria de esperar.
No extremo oposto estão sete distritos que sistematicamente ficam aquém da média — entre os quais Beja e Faro, que aparecem mal posicionados no 1.º ciclo. Em Beja 86% dos alunos conseguiram fazer o 2.º ciclo em dois anos (menos 3 pontos do que a média); em Faro, 87% (também 3 pontos abaixo da média).
O indicador agora apresentado será um dos usados no novo ciclo da avaliação externa das escolas, feita pela Inspecção-Geral da Educação e Ciência, que se iniciará em Maio. Segundo o secretário de Estado da Educação, João Costa, a inclusão será a peça-chave na análise das práticas das escolas — “não basta aprender, é preciso que todos aprendam”, afirmou aos jornalistas.