Tsipras enfrenta voto de confiança por causa da Macedónia
Primeiro-ministro grego deverá sobreviver a crise provocada por saída de parceiro de coligação, que se opõe a acordo com Skopje sobre o nome do país vizinho.
A Grécia está a viver uma telenovela política, com cisões nos partidos nas vésperas da votação de uma moção de confiança ao Governo de Alexis Tsipras, que no fim-de-semana perdeu o seu parceiro de coligação Gregos Independentes, cujo líder, o então ministro da Defesa Panos Kammenos, se demitiu por discordar de um acordo sobre o nome da Macedónia.
O diário grego Kathimerini descreve em editorial um clima político que “degenerou num bazar ridículo”, lamentando um “desenvolvimento perigoso para a democracia”. Vários deputados mudaram de posição, outros de partido, e os gregos, que já desconfiam dos políticos, ficam com mais motivos ainda para o fazer, defende o editorial.
A questão da mudança de nome da actual Antiga República Jugoslava da Macedónia para República da Macedónia do Norte tem provocado excessos: um antigo oficial da Marinha foi esta terça-feira presente a um juiz por ter feito ameaças de morte a vários políticos que anunciaram que iriam votar a favor do acordo sobre o nome do país vizinho.
Os opositores a este acordo não querem que qualquer nome inclua o termo “Macedónia”, já que na Grécia há uma região com o mesmo nome e, argumentam, isso abriria a porta a potenciais reivindicações de território. Na Macedónia, o problema era oposto: não eram admitidos nomes que tivessem uma indicação geográfica no nome.
Mas a oportunidade de resolver a questão que dura há décadas tem conseguido cada vez mais apoio em sectores políticos que tradicionalmente se opõem à ideia – até nos Gregos Independentes, nacionalistas, o presidente do partido escolheu demitir-se para não fazer parte de um Governo que apoie este acordo, mas o resto do seu grupo parlamentar anunciou que votará junto com o partido de Tsipras; entre eles, a deputada e vice-ministra da Protecção dos Cidadãos Katerina Papacostas (que foi uma das pessoas que recebeu ameaças de morte por isso).
Estima-se que o Governo de Alexis Tsipras consiga sobreviver ao voto, que deverá ter lugar na noite de quarta-feira. O Parlamento grego (Voulis) tem por vezes votações a horas tardias – durante a crise do euro não era raro pacotes legislativos serem aprovados noite dentro.
O Syriza (esquerda), de Tsipras, tem 145 deputados em 300, e o Governo contará ainda com o apoio de um deputado independente, quatro dos Gregos Independentes e um do centrista To Potami (O Rio) para a moção de confiança: 151 deputados.
“Dever patriótico”
A abrir o debate parlamentar sobre a moção de confiança, que começou esta terça-feira, Alexis Tsipras disse que era um “dever patriótico” assinar o acordo, que deixa a Macedónia livre para seguir a sua integração europeia e participação na NATO.
Tsipras pediu apoio para continuar até Outubro, quando terminaria o mandato do Governo, sublinhando que foi ele quem presidiu à saída da Grécia do programa de resgate da troika (Comissão Europeia, Banco Central Europeu e FMI).
O primeiro-ministro disse na semana passada que marcaria eleições antecipadas se não tivesse uma maioria de pelo menos 151 votos. Mas, sublinha a Bloomberg, tem repetido que só marcará uma votação depois de aprovar legislação para proteger proprietários de imóveis e subir o salário mínimo.
Um dos principais adversários do acordo com a Macedónia é Kyriakos Mitsotakis, líder da Nova Democracia (centro-direita), que está à frente nas últimas sondagens. “Dar amanhã [esta quarta-feira] um voto de confiança ao Governo será dizer ‘sim’ ao acordo de Prespes”, declarou, referindo-se ao nome formal do acordo entre Atenas e Skopje para o nome “República da Macedónia do Norte”, assinado na zona de Prespes. Isso seria "uma enorme concessão nacional".
“Ao mesmo tempo, será apoiar um Governo que é uma manta de retalhos sem mandato popular e uma agenda perniciosa”, declarou ainda Mitsotakis.
A questão da Macedónia envolve muito mais do que apenas os dois países: a União Europeia tem pressionado ambos os países para resolver a disputa – tem interesse em contrariar a influência da Rússia nos Balcãs.
Contradição no PPE
O facto da oposição interna ao acordo na Grécia ser protagonizada por Mitsotakis, que no Parlamento Europeu faz parte do PPE, o maior grupo, deixou Manfred Weber, o cabeça de lista do PPE às europeias, numa posição delicada: pressionado para clarificar a sua posição, Weber acabou por dizer que defendia o acordo mas que não era preciso que a oposição, ou seja Mitsotakis, o defendesse também para que fosse aprovado.
Mais tarde, Weber negou ter dado qualquer entrevista sobre a questão, levando o jornalista do Euractiv a quem fez essas declarações a publicar online o ficheiro áudio.
A votação do próprio acordo de Prespes no Parlamento não está ainda marcada, e o apoio antes certo do partido To Potami ficou em dúvida após a saída do deputado para apoiar o Governo na moção de confiança.