Ponte ferroviária sobre o Tejo é a peça em falta no Programa de Investimentos 2030
Quase 40% dos quatro mil milhões de euros previstos para a ferrovia no Programa Nacional de Investimentos 2030, destinam-se a ligar Lisboa ao Porto em duas horas. E a criar massa crítica para encurtar as distâncias para o Montijo, Alentejo e Algarve através de uma nova ponte sobre o Tejo.
O tabu da alta velocidade vai ser discretamente quebrado no Programa Nacional de Investimentos 2030 (PNI2030), que prevê afectar 1500 milhões de euros para melhorar a ligação ferroviária Lisboa-Porto através da construção de variantes aptas para os 250 quilómetros/hora, que vão permitir ligar o Tejo ao Douro em apenas duas horas.
A receita está na construção de novos troços de “altas prestações” entre Aveiro e Gaia (51 quilómetros), entre Soure, Coimbra e Mealhada (54 quilómetros), entre Vale de Santarém e Entroncamento (32 quilómetros) e entre Alverca e Azambuja (26 quilómetros). Estas novas linhas vão permitir segregar o tráfego de longo curso do dos serviços regionais, suburbanos e de mercadorias, permitindo assim aumentar a capacidade da linha e as velocidades dos comboios mais rápidos.
Esta estratégia levará a que, por força do aumento da procura que a redução do tempo de percurso irá provocar, se prossiga no futuro com a construção de novos troços na linha do Norte até haver na prática uma nova linha (dir-se-ia que de alta velocidade, mas isso é tabu) entre Lisboa e o Porto.
O sucesso desta verdadeira coluna vertebral ferroviária, associado a melhorias na ligação Lisboa – Algarve e à procura gerada pelo aeroporto do Montijo, ditará a necessidade de uma terceira travessia do Tejo, ferroviária, que é a peça em falta no corredor atlântico.
A importância dada à linha do Norte – ou à “nova” linha do Norte – traduz-se nos 1500 milhões de euros previstos para este projecto, quando a maioria dos restantes 12 programas ferroviários propostos no PNI 2030 – saído ontem do Conselho de Ministros e que irá agora ser "submetido à Assembleia da República" – oscilam entre os 100 e os 200 milhões. Com uma excepção: o Governo insiste em candidatar pela terceira vez a fundos comunitários uma linha Aveiro – Mangualde que já foi chumbada duas vezes por Bruxelas por falta de rentabilidade. O seu custo está estimado em 650 milhões.
Já com mais sabor a novidade, contudo, está o investimento de 200 milhões de euros que prevê ligar a linha de Cascais à linha da Cintura através de um túnel em Alcântara. Uma obra para concluir até 2030, embora no curto prazo esteja prevista a renovação da infra-estrutura entre Cais do Sodré e Cascais.
A electrificação do resto da rede ferroviária tem orçados 205 milhões de euros. Destinam-se a colocar a catenária na linha do Douro desde a Régua ao Pocinho e no Oeste entre as Caldas da Rainha e Louriçal. Isto no pressuposto de que, no âmbito do Ferrovia 2020, em curso, se iniciem as electrificações dos troços Marco de Canavezes-Régua e Meleças-Caldas da Rainha, para os quais nem sequer foram ainda lançados concursos públicos.
Também no horizonte 2030 está a electrificação da linha Casa Branca-Beja e a duplicação do troço Poceirão-Bombel na linha do Alentejo. Um pouco mais a sul, pretende-se construir uma linha directa de Sines a Grândola (120 milhões de euros) que evite as pendentes da Serra de Santiago do Cacém para facilitar a circulação dos pesados comboios de mercadorias. Está ainda prevista a reabertura da linha Beja-Funcheira para abrir um novo caminho ferroviário aos comboios que, vindos de Sines, se destinam a Évora e Badajoz.
O PNI2030 contempla ainda 155 milhões de euros para o aumento da capacidade nas áreas metropolitanas, onde se inclui a quadruplicação do troço Roma/Areeiro-Braço de Prata em Lisboa e do troço Contumil-Ermesinde no Grande Porto.
Ainda na Invicta, prevê-se uma ligação ferroviária ao aeroporto Sá Carneiro através da linha de Leixões, projecto que terá a sua réplica no Algarve com uma ligação ao aeroporto de Faro.
A actual linha Lisboa-Algarve tem contemplados 100 milhões de euros para, através de intervenções na zona da serra algarvia, poder-se reduzir o tempo de trajecto para Faro.
O próprio Vouguinha não está esquecido, estando previstos 75 milhões para a requalificação do troço Espinho-Oliveira de Azeméis. Em aberto – e dependendo de estudos a cargo da Infraestruturas de Portugal e dos municípios da zona – está a eventual reconversão para via larga e ligação à rede de suburbanos do Porto, ou a manutenção da via estreita reconvertendo-a num sistema de metro ligeiro ou tram-train.
Menos visíveis para o público são os investimentos em segurança ferroviária, renovação e redução do ruído (375 milhões de euros) e em sistemas de sinalização e telecomunicações (270 milhões), bem como a melhoria das acessibilidades a terminais multimodais.
No total, são 4010 milhões de euros que estão previstos em investimentos ferroviários, um programa ainda mais ambicioso do que os 2700 milhões de euros do Ferrovia 2020, o qual, três anos depois de ter sido apresentado, se encontra com uma reduzidíssima taxa de execução, somando os projectos vários anos de atrasos. Dos 19 empreendimentos que deveriam estar concluídos ou em obras, só oito estão em execução e nenhum está terminado.
Tecnicamente, o PNI 2030 complementa e dá continuidade aos investimentos do Ferrovia 2020, mas o grau de atraso deste – e o facto do pacote de projectos ontem debatido em Conselho de Ministros estar calendarizado para uma próxima legislatura – legitima as maiores dúvidas sobre a sua concretização.