Não precisamos nem de um novo nem de um velho Salazar e de certeza não precisamos de tempo de antena a quem veicula a necessidade de uma nova ditadura.
Na semana em que Bolsonaro tomou posse, não acredito em coincidências e preocupa-me que a TVI passivamente aceite a presença de Mário Machado nos seus estúdios.
Na mesma semana em que se celebra o aniversário da fuga de Álvaro Cunhal da Cadeia do Forte de Peniche, porque não um programa dedicado à liberdade e à história da ditadura e de todos os que lutaram contra a mesma?
Saberá Manuel Luís Goucha da incompatibilidade entre ditadura e liberdade? Ter-se-á Manuel Luís Goucha esquecido de como o Estado Novo punia com prisão, internamentos em manicómios e trabalhos forçados — sem esquecer os tratamentos com choques eléctricos e os espancamentos gratuitos — quem era apenas diferente?
Os mesmos espancamentos e torturas destinados a quem não concordasse com o Estado Novo e o regime Salazarista, onde ninguém podia confiar em ninguém, onde à mesa não se falava de política com medo dos filhos, dos pais, dos vizinhos, não fosse um bufo ou um PIDE andar à espreita.
E o que dizer das prisões indiscriminadas, dos julgamentos sempre adiados e cujo fim era só um, a prisão por tempo indeterminado no Tarrafal, em Peniche, no Aljube, entre tantas outras prisões para os réus e os advogados que tivessem a coragem de os defender, assim era a justiça, nem por isso cega, e descaradamente parcial?
O povo, ignorantemente pobre, subjugado à fome, trabalhava miseravelmente em prol dos grandes proprietários, ou então fugia a pé para França, um milhão ao todo, fugindo não só da fome mas também da guerra colonial responsável pela perda de toda uma geração além-mar a troco de nada, a troco de sofrimento e sangue.
Quatro décadas de ditadura ainda bem presentes na nossa memória, mas nem por isso na memória de quem promove a presença de Mário Machado nos ecrãs de televisão.
Ficamos desde já a saber de que lado está a TVI, não necessariamente da democracia, mas de quem toma hoje posse no Brasil e, quem sabe, amanhã em Portugal.
Einstein dizia existirem apenas duas coisas infinitas, o Universo e a estupidez humana, para em seguida acrescentar não ter a certeza sobre a primeira. A ignorância, meus caros, é mesmo o maior de todos os males. Restam-nos os braços e as vozes, mas também o voto, sempre o voto, ainda o voto.