Morreu mais um lince-ibérico atropelado perto de Mértola
É o segundo lince a morrer atropelado no mesmo local, na estrada nacional 122, num período de meses. ICNF admite que aquele é "um ponto negro" de atropelamentos para a espécie.
Mistral, um macho de lince-ibérico, foi encontrado morto, nesta quarta-feira, na estrada nacional 122, a cerca de dez quilómetros de Mértola, distrito de Beja.
Em Maio de 2018, um outro lince, chamado Olmo, foi também atropelado naquele local, junto à Herdade da Cela, o que fez com que este tenha sido já considerado pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) um ponto negro de atropelamentos para esta espécie.
Em comunicado, o ICNF explica que aquele é “um local onde ocorrem travessias recorrentes de animais selvagens, entre áreas de habitat natural adjacente, e apresentando condições que propiciam o atropelamento”.
O ICNF revela ainda que o Mistral nasceu em 2015 no Centro de Reprodução em Cativeiro de Lince-Ibérico de Zarza de Granadilla (Espanha) e tinha sido libertado, em Maio do ano seguinte, no concelho de Mértola, no âmbito do projecto Life para a reintrodução do lince-ibérico em Portugal e Espanha.
O animal fixou-se na Herdade da Cela onde, segundo o ICNF, “manteve um território de cerca de dez quilómetros quadrados e terá acasalado duas vezes com a fêmea Moreira, sendo o provável progenitor de quatro crias”.
Nesta quarta-feira, o corpo de Mistral foi recolhido, cerca das 9h, pela equipa de monitorização do ICNF, com sede no Parque Natural do Vale do Guadiana, com sinais de atropelamento.
Sobe assim para quatro o número de atropelamentos de linces-ibéricos libertados no Vale do Guadiana, desde 2015. No final de 2014, os primeiros linces foram libertados num cercado de adaptação em Mértola e, em Fevereiro do ano seguinte, abriram-se as portas deixando-os ir para o meio natural.
Taxa de sobrevivência alta
Embora admita que “o risco de atropelamento continua a ser uma ameaça para a espécie em toda a Península Ibérica”, o ICNF sublinha que a taxa de sobrevivência dos exemplares reintroduzidos pelo projecto Life Iberlince em Portugal continua a ser alta (cerca de 75%).
Apesar de, em 2018, terem morrido também duas fêmeas afogadas em Serpa e uma outra fêmea atropelada, entre Tavira e Olhão, o ICNF faz um balaço positivo do ano de 2018 para esta espécie em Portugal, referindo os esforços de monitorização da população de linces, assim como o nascimento de 29 crias em meio natural e a estabilização de 11 fêmeas reprodutoras.
De acordo com o ICNF, o “Vale do Guadiana tornou-se uma das áreas de reintrodução com maior sucesso a nível ibérico”, algo possível “graças à colaboração de proprietários e das zonas de caça, a uma gestão sustentável do território, à abundância elevada de coelho-bravo e a uma atitude favorável à presença do predador”.
Ligação entre Portugal e Espanha
O ICNF salienta ainda a ligação da população do Vale do Guadiana com outras áreas espanholas, “fundamental para a manutenção da variabilidade genética”. Exemplos disso são Mundo, um macho oriundo de Doñana, que se reproduziu em Serpa, e Nairobi, uma fêmea também originária daquela região espanhola que se fixou em Mértola.
No sentido inverso, Lítio, um macho libertado inicialmente em Mértola, foi encontrado perto de Barcelona (depois de ter percorrido cerca de mil quilómetros), tendo sido capturado e libertado novamente no Vale do Guadiana.
Em Espanha, os atropelamentos são uma das principais causas de morte não natural desta espécie. Na Andaluzia, entre 2013 e 2017, morreram atropelados 72 linces-ibéricos, alguns dos quais tinham bagos de chumbo no corpo, o que revela tentativas de abate intencional. Um dos exemplos mais marcantes destas tentativas de abate veio a público a 30 de Dezembro último, quando foi encontrado morto em Córdova (Espanha) um lince-ibérico com mais de 300 chumbos de caçadeira no corpo.
Terminado em Dezembro de 2018 o projecto Life Iberlince para a conservação da espécie, o ICNF anunciou uma nova candidatura ao programa Life, com parceiros em Portugal e Espanha, com “algumas acções previstas que deverão contribuir para a desfragmentação de habitats e a minimização de mortalidade em estradas”.