O ano do óbito da privacidade – e como deixar menos pegadas online
Aquilo que as empresas fazem com os dados online foi um dos focos de 2018. Mas há vários truques para controlar a informação que deixamos na Internet.
A privacidade não morreu em 2018. Para muitos, isso já aconteceu há mais tempo. Mas a sucessão de casos fez com que muitas pessoas (de utilizadores descontentes a legisladores preocupados) lhe tenham decretado o óbito este ano.
Não são apenas os hábitos criados ao longo dos últimos anos e que levam milhões de pessoas a partilhar detalhes (por vezes íntimos) das respectivas vidas, desde as fotografias das barrigas grávidas até às festas de família, crianças incluídas. A ideia de criar uma versão da própria vida para consumo das massas nas redes sociais, é um tema de discussão há anos, tanto nos media, como nos círculos académicos.
Em 2018, porém, emergiram exemplos da enorme capacidade dos gigantes tecnológicos para analisarem dados, cruzarem informação e traçaram retratos pormenorizados dos hábitos e gostos de todos e de cada um dos seus utilizadores. Estes perfis são depois vendidos e revendidos, para fins publicitários e políticos, num percurso que é desconhecido para a maioria das pessoas.
Quando Mark Zuckerberg depôs no Congresso americano, reconheceu que a empresa recorria à técnica dos chamados "perfis-sombra" para acompanhar os utilizadores quando estes não estavam o Facebook. Mais tarde, emails revelados pelo Parlamento britânico deram um vislumbre sobre o pensamento de Zuckerberg (pelo menos, entre 2012 e 2015): o acesso aos dados dos utilizadores eram material para venda e algumas empresas (como o Netflix e o Spotify) tinham acesso privilegiado a informação.
O Facebook está longe de ser caso único. O Google é outro gigante cujos produtos e serviços (o motor de busca, o Gmail, o YouTube, os Mapas, o sistema Android) recolhem, analisam e rentabilizam informação do utilizador. No mês passado, quando o presidente da empresa, Sundar Pichai, foi questionado no Congresso dos EUA, um congressista perguntou-lhe, enquanto mostrava o telemóvel (que era um iPhone), se o Google seria capaz de saber caso ele se deslocasse para o outro lado da sala. Depende das definições, foi a resposta de Pichai.
O problema é que muitas vezes as definições padrão permitem que as empresas recolham informação parar criar um rasto digital dos seus utilizadores. E mudar as definições tende a ser pouco intuitivo. Muitas vezes obriga a passar por várias páginas, antes de encontrar o botão correcto. Além disso, as interfaces mudam com frequência. O PÚBLICO recorda alguns atalhos e estratégias para recuperar alguma privacidade online:
Mudar o motor de busca
Uma das formas mais fáceis de escapar à monitorização do Google é optar por outro motor de busca. O DuckDuckGo, é uma alternativa que tem crescido em popularidade nos últimos tempos, ao dizer que não recolhe nem partilha dados dos utilizadores. Foi criado em 2008 "com um foco na privacidade" e, por isso, não utiliza cookies, pequenos ficheiros de texto que podem servir para seguir utilizadores online.
No DuckDuckGo, o utilizador também não vê anúncios personalizados com base nas suas pesquisas no site (ou seja, se pesquisar um relógio inteligente na segunda-feira, não vai passar o resto da semana a ver anúncios de relógios). Isto não quer dizer que o motor de busca não tem anúncios. Mas o método é simples: se alguém pesquisa sobre botas, vê anúncios de botas entre os resultados daquela – e só daquela – pesquisa.
Outra grande diferença em relação a motores de busca como o Google ou o Bing (da Microsoft), é que também não regista endereço de IP dos visitantes (a série de números separados por pontos que identificam cada máquina ligada a uma rede informática, e que podem ser usados para identificar alguém).
Para quem quer outra opção, há o Ecosia, outro motor de busca focado na privacidade que vem com um contributo ambiental (os resultados das pesquisas são dados por tecnologia da Microsoft). Além de anonimizar as pesquisas feitas pelos utilizadores todas as semanas – o que significa que a informação não é guardada e não pode ser utilizada para criar publicidade direccionada, a empresa diz que as receitas são usadas para ajudar a plantar árvores em todo o mundo. Os projectos ambientais da empresa são partilhados num blogue.
Mudar o navegador
Outra solução é começar a utilizar o Firefox. O navegador (para além de não ser do Google, nem da Microsoft) tem várias funcionalidades focadas na privacidade. Por exemplo, há uma extensão – conhecida por Facebook container – que isola o Facebook do resto das actividades que alguém faz na Internet. Isto impede a rede social de continuar a monitorizar as actividades de alguém quando está a navegar outros sites.
Como outros navegadores, o Firefox também permite impedir cookies de terceiros (por exemplo anunciantes) de guardar informação do utilizador. Para pedir ao Firefox para bloquear cookies de um site específico: aceda ao site em questão, depois clique no botão do rato dentro da página e seleccione Ver informações da página > painel Permissões > Definir cookies. Desmarque a opção Usar predefinição e escolha Bloquear. Para bloquear vários sites de uma só vez, carregue no botão com três barras horizontais sobrepostas no menu, seleccione Privacidade e segurança > Histórico. No canto inferior direito, irá ver uma caixa com Excepções onde pode escrever quais os sites que não devem recolher a informação.
Se usa o Edge, o mais recente navegador da Microsoft, seleccione um ícone com reticências no canto superior direito. Escolha Mais > Definições. Em Limpar dados de navegação, escolha Seleccionar o que limpar. Coloque o visto na caixa Cookies e dados de sites guardados e seleccione Limpar.
As definições do Google
Quem não quer deixar de usar o Google, pode mudar as definições da conta Google, que muitas vezes reúne informação acumulada do YouTube, do motor de busca, da conta de Gmail, e do sistema de navegação Google Maps.
Para impedir o Google Chrome de guardar cookies, clique nos três pontos verticais no canto superior direito, escolha Configurações > Avançadas > Privacidade e segurança e opte pelas Configurações de conteúdos. Clique em Cookies e desligue a primeira opção da lista.
Para saber o que o Google sabe sobre si, pode aceder a A minha Conta. Aparece no ícone com a sua fotografia de perfil no canto superior direito da página do motor de busca. Daí, escolhe-se o separador Dados e Personalização (na tabela do lado esquerdo) > A minha actividade. Reúne os sites que visitou, quantas vezes os visitou, e que dispositivos utilizou (telemóvel ou computador) em cada dia.
Em Controlos de actividade pode definir a informação que é guardada sobre as pesquisas no YouTube, as pesquisas feitas, os locais por onde passa, e actividade de voz e áudio (quando autorizado, o Google pode gravar a sua voz e áudio nos seus serviços para melhorar o reconhecimento de voz).
Atenção ao Google Maps: os serviços de geolocalização do Google são úteis, mas as viagens que alguém faz com o telemóvel – seja de carro, a pé, ou com transportes públicos – permitem criar uma cronologia detalhada de todos os sítios por onde passou. Para evitar isto, desligue o serviço de localização quando não está a usar o GPS. Em telemóveis Android vá a Definições > Segurança e localização. Em iOS, vá a Definições > Privacidade > Localização e seleccione as aplicações que podem detectar o local onde se encontra.
Redes sociais
Tal como o Google, pode-se aumentar a privacidade nas redes sociais ao saber navegar as definições de cada site. Para alterar a quantidade de informação que mostra no Facebook, comece por clicar no triângulo branco no canto superior direito do site. Escolha Definições > Privacidade. Aí, pode escolher quem pode ver publicações futuras (pode, por exemplo, bloquear pessoas específicas de ver alguns conteúdos), quem é que o pode encontrar ao pesquisar o seu email ou número de telefone no Facebook, quem é que o pode contactar, e quem pode ver a sua lista de amigos.
Para quem não tinha preocupações com privacidade, e tinha todas as suas publicações públicas, também é possível “limitar a audiência das publicações antigas”. Isto leva a que fotografias e textos que eram públicos passem a ser visíveis apenas para amigos, ou por pessoas nelas identificadas.
Para editar a privacidade da informação geral que partilha vá à sua página de perfil e seleccione Sobre na barra a delimitar a fotografia de capa. Ao clicar em cada Evento de vida pode escolher se quer a informação pública, só para amigos, ou completamente privada.
No Twitter, pode aceder a Privacidade e segurança ao clicar no ícone da fotografia de perfil no canto superior direito e controlar quem o pode marcar em publicações, mencionar e ver de onde está a escrever. Para quem não teve cuidado com esta informação no passado, é possível escolher eliminar informação sobre a localização em publicações passadas (a empresa clarifica, no entanto, que as actualizações podem demorar). Também é possível decidir se alguém o pode encontrar ao pesquisar o email ao número de telefone que tem associado à sua conta (estas opções estão desactivadas por defeito).
No Instagram, pode escolher ter a sua conta privada ao carregar em Editar perfil > Privacidade e Segurança, e colocar um visto em Conta privada. Com a escolha, os outros utilizadores têm de lhe pedir permissão para ter acesso ao seu perfil. Também é possível proibir outros utilizadores de partilharem as suas stories (vídeos e fotografias que são apresentadas na aplicação por tempo limitado) com outros através de mensagens. O Instagram permite ainda escolher se as pessoas sabem quando é que está online no site ou se essa informação está escondida. Se o utilizador desactivar a opção para si, também deixa de poder ver o estado de actividade de outras contas.