Professores: Marcelo à espera de novo diploma do Governo no início do ano

Como o veto teve por base a questão formal da entrada em vigor do Orçamento, o executivo pode reapresentar a sua proposta de reposição parcial do tempo de serviço logo que cumpra mais uma ronda negocial com os sindicatos. Mas a luta vai continuar.

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O veto de Marcelo não causa grandes problemas a Costa LUSA/MIGUEL A. LOPES

O Presidente da República está a contar receber um novo diploma do Governo sobre a reposição do tempo de serviço dos professores já no início do ano, logo que se cumpra a norma do Orçamento do Estado para 2019 que obriga o Governo a sentar-se à mesa das negociações com os sindicatos, antes de decretar qual a solução que vai aplicar. E o executivo estará a preparar-se para reapresentar a mesma fórmula – os dois anos, nove meses e 18 dias -, assim que afaste a questão formal que levou ao veto presidencial de quarta-feira. Depois das tréguas natalícias decretadas por Marcelo, o braço-de-ferro entre Governo e professores pode voltar… e durar.

Marcelo Rebelo de Sousa vetou o decreto do Governo com um único fundamento: o Parlamento aprovou uma lei [o OE2019] que entra em vigor a 1 de Janeiro, portanto ela tem de ser cumprida quando entrar em vigor. De nada valeram, escreveu na mensagem, os “anteriores passos negociais [pois] foram dados antes da aludida entrada em vigor” do Orçamento do Estado. 

Embora a devolução do diploma ao Governo pudesse servir de pretexto para o executivo de António Costa meter o decreto na gaveta e não fazer qualquer reposição do tempo de serviço aos professores, ninguém espera que isso aconteça. Em Belém, a expectativa é que o Ministério da Educação não espere muito e possa até aproveitar a promessa dos sindicatos de lhe baterem à porta logo a 3 de Janeiro para os convidar a entrar e conversar.

Do lado do Governo, não parece haver vontade de sair do ponto de partida, ou seja, de dar mais do que o definido no decreto-lei vetado. Tem sido isso que têm defendido o primeiro-ministro e o executivo, com base numa fórmula que estabelece uma percentagem do tempo de serviço que, de acordo com o Governo, poria professores em pé de igualdade com outras carreiras da função pública, que têm progressões de dez em dez anos (nos professores é de quatro em quatro).

Mais próximos nas questões de fundo

Apesar do veto do Presidente, a vontade do Governo não parece ter mudado, até porque, lembram duas fontes do executivo, os argumentos por detrás da proposta inicial se mantêm. Uma devolução integral seria pesada para os cofres do Estado, exigindo verbas que o Estado não tem, e criaria uma desigualdade entre várias carreiras na função pública. 

Marcelo Rebelo de Sousa, sabe o PÚBLICO, é sensível a estes dois argumentos. Em Belém lamenta-se que nunca tenham sido debatidas duas questões de fundo: quanto é que custa, realmente, a reposição integral do tempo de serviço e porque é que se deve abrir um precedente em relação aos professores, se a questão se coloca de igual forma para outras carreiras especiais da função pública, como as dos polícias, militares, juízes e magistrados do Ministério Público.

O Governo tem estado a fazer uma avaliação jurídica sobre se um novo diploma teria de ser diferente do vetado e a interpretação que tem vingado é que este é um veto pela forma, pelo que, cumprida a obrigação de voltar às negociações em 2019, o conteúdo até pode vir a ser o mesmo, se, de novo, se esgotarem as conversas com os sindicatos.

Depois de mais de um ano de negociações, não há esperança de que estas sejam muito diferentes, com os sindicatos a exigirem que seja contada a totalidade do tempo de serviço e o Governo a não sair do valor a que chegou. O processo volta, assim, à estaca zero, mas já muita coisa mudou desde que, em Novembro de 2016, a Federação Nacional da Educação (FNE) lançou uma petição a pedir a reposição integral do tempo de serviço: nove anos, quatro meses e dois dias.

Desde então, a polémica foi subindo de tom, com os sindicatos a unirem-se em torno da reposição integral e a Madeira, preparando-se para eleições em Setembro próximo, a decretar uma reposição faseada até 2025 – levando os Açores atrás. No Parlamento, até o PSD mudou de posição. Se a anterior direcção de Passos Coelho optou pela abstenção face às reivindicações sindicais, Rui Rio defende desde o Verão a contagem integral, ainda que sem “pôr em causa o equilíbrio das finanças públicas”.

Foi, aliás, o PSD a propor a norma do OE2019 que agora fundamentou o veto presidencial para obrigar o Governo a renegociar com os sindicatos, mas sem nunca se comprometer com qualquer solução concreta. Rio remeteu sempre para o Governo a concretização dessa contagem integral, repisando o argumento de que o executivo prometeu o que não podia cumprir. Com o acordo na Madeira já fechado, o líder do PSD passou a acrescentar um outro argumento: o de que o Governo tem a obrigação de encontrar uma solução idêntica no continente.

Cálculos eleitorais

Foi assim que todos foram empurrando a polémica para Belém – e todos acabaram surpreendidos com o veto formal do Presidente. Que acaba por ser uma espécie de justiça salomónica: dá um balão de oxigénio aos sindicatos, que ganham novo fôlego negocial, mas não tira razão ao Governo, pois não discute os argumentos de fundo.

Agora que começa o ano de todas as eleições, o tema ameaça tornar-se escaldante. Se o Governo insistir na proposta inicial, sabe que pode contar com um de dois cenários: o Presidente pode vetar por questões de substância – o que não é muito provável, pois é sensível aos argumentos financeiros e de igualdade de carreiras –; mas, se o promulgar, o PCP e o BE irão cumprir a sua promessa de pedir a apreciação parlamentar do decreto.

Com o apoio do PSD, o mais provável é que a Assembleia venha a forçar uma proposta de faseamento da contagem integral do tempo de serviço. Entretanto, os professores estarão na rua. Mas se acabarem por vencer, a luta pode transferir-se para outras carreiras especiais. E o descontentamento de uns e de outros pode custar a maioria absoluta ao PS… que ainda sonha com ela. com Liliana Valente e Sofia Rodrigues

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