Mais de 800 militares portugueses passam o Natal em missões no estrangeiro

Não são displicentes as compensações económicas. Em situações reais e cenários extremos são feitos testes, como no caso dos novos fardamentos.

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LUSA/CEMGFA

São 857, os militares das Forças Armadas e GNR que passam o Natal em missões no estrangeiro em África, América, Ásia e na Europa, segundo dados do Estado-Maior General das Forças Armadas e da Guarda Nacional Republicana. São as denominadas Forças Nacionais Destacadas a que se somam efectivos da Guarda nas mais variadas missões em 19 países. Ambas operam no âmbito da NATO, União Europeia (UE) e ONU, ao abrigo de acordos multi e bilaterais. A sua competência é destacada por quem os comanda no terreno e elogiada como exemplo de abnegação e prestígio dos corpos a que pertencem.

“Para sermos seguros, temos de projectar a segurança e é por isso que Portugal tem feito questão de participar activamente”, explicou o primeiro-ministro, António Costa, a presença de efectivos no Afeganistão na Resolute Suport Mission da Aliança Atlântica na recente visita este mês aquele país. São 159 homens e mulheres, soldados e oficiais, que participam como força de reacção rápida na segurança do aeroporto internacional Harmid Karsai e treinam o exército afegão.

“É uma missão particularmente difícil, o que não ignoramos, peço-vos que nunca ignorem que é de elevado risco e onde a ameaça é efectiva, permanente e surge no momento inesperado”, aconselhou Costa. Uma forma de informar a opinião pública, pois os militares estão cientes dos perigos. Na classificação da NATO, a sua missão está registada com o grau de ameaça alto.

Com igual nível de perigosidade são confrontados os 167 integrantes da força de reacção rápida em missão de estabilização na República Centro-Africana sob a bandeira das Nações Unidas e que têm como segundo comandante da operação Minusca o major-general Serranho. As suas intervenções foram decisivas na resposta a emboscadas e na contenção da violência demencial dos grupos armados que tem afectado o país.

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Também com o mais elevado nível de perigosidade está classificada a Operação Inherent Resolve com guarda-chuva multilateral, que levou 32 militares a apoiar a formação e treino das Forças Armadas do Iraque. O mesmo acontece com bandeira da União Europeia na Somália na formação, treino e monitorização dos trabalhos de engenharia militar a que estão afectos, sob controlo italiano, dois portugueses.

Ainda com iniciativa da UE decorre na República Centro-Africana a EUTM, de apoio à reforma do sector de segurança, formação e treino, com 45 militares dirigidos pelo brigadeiro-general Teodoro Maio. Esta operação está classificada com o grau de ameaça médio.

Já em Kosovo, que foi palco do horror dos crimes de guerra, três oficiais portugueses estão colocados no Quartel-General de Pristina, na Kosovo Force sob comando italiano. A classificação do risco é baixa, o que atesta os efeitos da intervenção desencadeada pela NATO. Também da Aliança Atlântica é a responsabilidade da Tailored Force Presenc, na Roménia, que visa contribuir para a dissuasão no flanco Sudeste da NATO. Com um grau baixo de ameaça, estão colocados três oficiais em Craiova.

A presença de militares portugueses passa também pelo acompanhamento do processo de paz na Colômbia, com dois observadores em Medellín e Bogotá, sob os auspícios da ONU. De carácter bilateral é a fiscalização marítima levada a cabo pelo navio patrulha Zaire e o reabastecedor Berrio na fiscalização marítima das águas de São Tomé e Príncipe e na formação da guarda costeira do país.

De 80 a 94 euros diários

A Guarda Nacional Republicana tem no exterior 32 elementos nas mais diversas funções, sob a égide da ONU ou da União Europeia, passando por oficiais de ligação ao Ministério da Administração Interna nas embaixadas portuguesas em várias capitais: Luanda, Argel, Cidade da Praia, Madrid, Paris, Maputo e São Tomé. Já em Díli, a sua presença tem como objectivo a assessoria ao governo de Timor.

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Diversas instâncias europeias, como o Serviço Europeu de Acção Externa, a Academia Europeia de Segurança e Defesa, a Agência da UE para a Formação Policial, o projecto europeu Gar-Si Sahel e a missão de vigilância da União Europeia na Geórgia, têm oficiais da Guarda. Que estão igualmente presentes no Quartel-General Permanente da Força de Gendarmerie Europeia.

Esta força, que integra serviços de França, Itália, Holanda, Portugal, Roménia e Espanha, foi fundada a 17 de Setembro de 2004, e declarada operacional dois anos depois. A sua concepção tem como objectivo missões de policiamento em diferentes teatros de operações em apoio da UE, da ONU, da Organização para a Segurança e a Cooperação da Europa, da NATO ou de outras coligações ad hoc.

A primeira acção teve lugar em 2007, na Bósnia-Herzegovina, sob a égide da ONU, a que se seguiram outras intervenções em situações de crise: Afeganistão, em 2009, no âmbito da International Security Assistance Force- ISAF da NATO, e um ano depois no apoio à missão das Nações Unidas após o sismo do Haiti.

O objectivo desta força é ser projectada ao mesmo ritmo que as Forças Armadas em situações de crise, incluindo humanitárias, e as suas tarefas vão para o reforço das polícias locais ou sua substituição caso tenham sido desmanteladas.

A participação dos militares portugueses em missões no estrangeiro é objecto de um suplemento de missão. No caso das Forças Armadas, o seu valor oscila entre os 80 euros diários para os soldados e os 94 por dia para os oficiais. Na GNR não foi possível confirmar a existência desta prática nem apurar o seu valor pecuniário. Para 2019, o Orçamento de Estado para a Defesa tem inscrito 60 milhões de euros para as Forças Nacionais Destacadas, o que equivale a mais 7,5% do orçamentado para o ano que agora finda.

Do stress…

A concessão do suplemento económico não é displicente e traduz um aumento significativo da remuneração dos militares. É uma forma de compensação não apenas do risco, do afastamento do país e familiar, como do stress determinado pelo desconhecimento do destino onde vão operar e de situações agudas de guerra. Um terreno propiciador a dependências.

Um estudo recente da primeiro-tenente médico-naval Diana Terra traçou um quadro interessante. “O que parece haver em relação a dependências e, tomando em conta a idade jovem dos actuais militares em missão, é a dependência da electrónica [dos jogos] do que propriamente a relação com o álcool”, destacou a oficial à Lusa.

O universo do estudo foi a população militar no activo que participou em missões nos últimos dois anos, entre 2015 e 2017, no Kosovo, Iraque, na missão da Marinha em África – Saara Express –, na Mnusma da Força Aérea no Mali, e a Operation Sea Guardian da NATO com efectivos da Marinha Portuguesa. “São forças especiais, têm respeito pelo corpo e pela boa forma física e acham menos problemático outro escape [que não o álcool]”, justifica Diana Terra.

“Hoje em dia vêem como escape a electrónica, incluindo os jogos, estamos a assistir a uma mudança de paradigma da forma como a nossa juventude, que integra as fileiras, faz a gestão do próprio stress”, precisa. Se o consumo de substâncias ilícitas é considerado baixo neste estudo, apenas detectado em 27 militares, os quadros de ansiedade e depressão enquadram-se nos níveis da idade e género.

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Diferente é o tabagismo. “Um dos factores preocupantes que encontrámos é uma taxa de fumadores quase do dobro da população em geral”, concluiu.

… ao treino

É nas missões no estrangeiro, as únicas em que em tempo real os militares têm contacto com situações limite, que é testada alguma da tecnologia fabricada em Portugal. “A Auxdefense da Universidade do Minho [financiado pelo Ministério da Defesa], tem como objectivo o desenvolvimento de equipamentos de protecção individual avançados com elevada resistência ao impacto, corte e perfuração de componentes de equipamentos militares com excelente resistência ao impacto”, explicou em finais de Novembro, José Frangueiro, coordenador do projecto. O investigador revelou que há empresas interessadas na produção em série deste produto.

“Os novos fardamentos foram desenvolvidos primeiro em ambiente de laboratório, testados pelos nossos comandos, pára-quedistas, forças com maior grau de exigência, e agora o terceiro e último momento, na prática, no terreno, é o oitavo contingente do Iraque”, explicou o ministro da Defesa na visita ao campus de Braga.

“É o exemplo de uma aliança entre o sistema nacional de investigação e uma capacidade empresarial inovadora, que vai permitir desenvolver novas aplicações, criar novas possibilidades de exportação e o uso destes materiais para fins civis”, referiu João Gomes Cravinho. Como exemplo destes fins, o titular da Defesa admitiu a utilização para blindagens pela indústria automóvel.

Para já, certo, certo, é que os novos fardamentos já vão na bagagem das tropas que em Março próximo partem em missão para o Afeganistão.

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