Poupar para o futuro: uma proposta

O aumento da taxa de poupança das famílias permitiria não só aumentar a possibilidade de financiamento das empresas, mas também ajudar a corrigir a frágil sustentabilidade dos sistemas de segurança social em Portugal.

O crescimento futuro da economia portuguesa depende do investimento que agora for feito. Mas Portugal está entre os países da União Europeia em que o nível de investimento é baixo (16,2% do PIB, face a uma média de 20,5% na Zona Euro).

Apesar da recuperação verificada no investimento das empresas, em simultâneo com um longo processo de desalavancagem iniciado há mais de sete anos, a economia portuguesa pode melhorar as suas perspectivas futuras de criação de riqueza e de emprego de qualidade durante a próxima década.

Para isso é necessário aumentar o investimento de qualidade e que tenha efeitos positivos para a economia portuguesa, incluindo no combate às assimetrias regionais de modo a garantir a melhoria da qualidade de vida das populações periféricas.

Esta necessidade depara-se com a existente falta de capital na economia portuguesa, que limita o nível de capitais próprios das empresas, apesar da recente evolução positiva a este nível, e o acesso a financiamento por capitais alheios.

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O sistema financeiro nacional ainda está em recuperação da crise que sofreu, mantendo um elevado nível de crédito malparado e de imparidades, e demonstrando pouca propensão para apoiar negócios que sejam inovadores mas que não apresentam historial nem garantias reais.

As alternativas à banca tradicional, como o mercado de capitais nacional e internacional, o capital de risco ou de private equity, são limitadas para a maior parte das empresas, e estão muito longe de ter o relevo que possuem em economias como a norte-americana (onde financiam mais investimento do que o sistema financeiro tradicional, e apoiam especialmente o investimento inovador).

Mas também a sociedade portuguesa – Estado, famílias e empresas – continua fortemente endividada, apesar de existirem realidades muito diferentes.

Por exemplo, as empresas saudáveis com oportunidades de investimento concorrem no acesso às limitadas fontes de financiamento directamente com empresas “zombie”, mantidas artificialmente por subsídios e pela resistência do sistema financeiro em reconhecer imparidades. A Universidade do Minho, por exemplo, estima que uma em cada quatro empresas portuguesas, que representam 14% do emprego, são mantidas artificialmente.

Estas limitações levam a que para se conseguir aumentar o nível de investimento é necessário que a dotação de capital na economia portuguesa aumente. Mas esse crescimento não pode agravar a estabilização do endividamento externo que foi tão arduamente conquistada nos últimos anos.

Uma forma é aumentar o investimento directo estrangeiro, que tem vindo a crescer, e não só está associado a maior produtividade, melhores salários e maiores qualificações, mas também está orientado para as exportações, pelo que mesmo que pague dividendos para os seus detentores, não agrava as contas com o exterior.

Outra forma é pelo autofinanciamento das empresas através dos lucros gerados e da acumulação de capital. Apesar do crescimento das exportações e do alargamento do número de empresas portuguesas com presença em mercados externos, este modo é imitado pela pequena dimensão do mercado nacional. 

A terceira forma de financiar o aumento do investimento sem desequilibrar as relações externas é aumentar a taxa de poupança das famílias, que em Portugal é muito baixa. As famílias portuguesas poupam menos de 5% do rendimento disponível, quando a média na Zona Euro é de 12%. Além disso, a poupança é maioritariamente feita em produtos de curto prazo (depósitos) para suportar objectivos de longo prazo (reforma).

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O aumento da taxa de poupança das famílias portuguesas permitiria não só aumentar a possibilidade de financiamento das empresas, mas também ajudar a corrigir a frágil sustentabilidade dos sistemas de segurança social em Portugal.

A população portuguesa está a decrescer e a envelhecer, e a esperança média de vida das pessoas está a crescer, o que significa que se nada mudar o rácio entre o número de trabalhadores que descontam para a Segurança Social e os seus beneficiários vai reduzir-se drasticamente nas próximas décadas.

Este agravamento da situação da segurança social leva a que um jovem que esteja agora a iniciar a sua vida profissional, e que se reforme após 2060, vá receber como pensão menos de 30% do seu último salário (Ageing Group Report da Comissão Europeia, 2015). Se este jovem não começar a poupar logo desde o início da sua carreira profissional deverá ter como certo uma redução do seu rendimento no momento em que se reformar. Com esta redução de rendimento virá uma diminuição significativa do nível de vida e maiores dificuldades em suportar despesas com serviços essenciais como a saúde.

A grande importância desta dupla função da poupança, financiar reformas e investimento, requer que as autoridades portuguesas incentivem as famílias a recorrer a outros produtos de poupança para além da tradicional compra de habitação. Acresce que agora poderá ser uma boa altura para o fazer dada a expectativa de subida das taxas de inflação e das taxas de juro a médio prazo.

Recentemente falou-se publicamente em majorar os incentivos fiscais às empresas que contribuíssem para os certificados de reforma (PPRs públicos) em nome dos seus trabalhadores, mas a ideia terá sido abandonada.

Melhor do que cingir o apoio aos descontos para o sistema público, seria alargá-lo a todos os instrumentos de poupança para a reforma só mobilizáveis a longo prazo e tornar os incentivos às empresas complementares aos descontos dos trabalhadores. A empresa só beneficiaria do incentivo se contribuísse pelo mesmo valor do desconto feito pelos trabalhadores para estes instrumentos.

Desta forma, cada trabalhador que aderisse teria uma maior poupança na altura da reforma, a economia portuguesa teria acesso a uma forma saudável de financiamento e a fragilidade dos sistemas de segurança social seria mitigada. Ao mesmo tempo, esta seria uma forma de as empresas motivarem os seus trabalhadores e de reterem os seus funcionários mais competentes, com efeitos positivos na produtividade.

O texto reflecte apenas a opinião dos autores

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