O que sabemos sobre os microplásticos na costa portuguesa?
É no centro do país onde se encontram mais microplásticos, de acordo com um artigo científico deste ano.
João Frias começou a ver que as praias que frequentava com a família começavam a ficar afectadas pela poluição de plástico. Isto levou-o a interessar-se pelo assunto. Entretanto, em 2015, tornou-se o primeiro aluno a tirar um doutoramento em microplásticos em Portugal. Desde então, não tem parado de estudar estas partículas milimétricas.
Actualmente está no Instituto de Tecnologia Galway-Mayo (na Irlanda) – com uma bolsa de pós-doutoramento Marie Curie –, onde está a recolher amostras da água superficial e sedimentos da baía de Galway. Na semana passada, passou pela Faculdade de Ciências e Tecnologia (FCT) da Universidade Nova de Lisboa, onde se doutorou, para nos falar sobre microplásticos.
Antes de ir para a Irlanda, João Frias estudou os microplásticos em Portugal. Num artigo científico deste ano na revista Marine Pollution Bulletin, analisou (juntamente com Joana Antunes e Paula Sobral, ambas da FCT) a situação dos microplásticos em 11 praias ao longo de Portugal continental. As amostras foram recolhidas da areia dessas praias, que foram divididas em três regiões (Norte, Centro e Sul), entre 2011 e 2013.
De todos os itens recolhidos, 99% eram de plástico e 68% eram microplásticos (destes 79% eram péletes). A classe de tamanho mais frequente de microplásticos foi quatro milímetros (47%).
“Os microplásticos são predominantes de Norte a Sul e os seus valores foram sempre superiores a 54%, tendo em consideração todas as praias”, refere João Frias. Das três regiões, destaca-se o Centro (onde se detectaram 74% de microplásticos no total das amostras da zona), seguida do Sul (60%) e do Norte (54%).
Em todas as praias analisadas foi em Paredes de Vitória que se descobriram mais microplásticos, seguida de Vieira de Leiria. “As praias de Vieira de Leiria e Paredes de Vitória são influenciadas pelo estuário do rio Mondego, em que as maiores fontes de contaminação são as águas residuais, resultando do saneamento doméstico e industrial; e escoamento agrícola”, lê-se no artigo.
“No Algarve, nunca encontrámos muito lixo. Isso tem a ver com um esforço maior das câmaras municipais para que as praias sejam mais limpas por causa do turismo”, adianta João Frias. E destaca que o plástico mais contaminado que detectaram se encontra em Sines, onde há uma refinaria. “Em relação a poluentes absorvidos pelos péletes, na zona de Sines tinha maior quantidade de hidrocarbonetos policíclicos aromáticos.” João Frias afirma mesmo que o mais preocupante neste momento é não sabermos o que acontece com os poluentes orgânicos que são absorvidos à superfície dos microplásticos.
E de onde vêm estes microplásticos? “Em termos de estatísticas globais, pensa-se que cerca de 80% do lixo marinho seja de origem terrestre e 20% de origem marítima”, responde. “Em Portugal continental, pensamos que a maioria do lixo é de origem terrestre e que nos Açores é de origem oceânica, provavelmente vinda do giro do Atlântico Norte [assunto referido noutros artigos científico de 2017 e 2018].”
Além disso, diz entusiasmado que propôs uma nova definição de microplástico num artigo recentemente aprovado para publicação na Marine Pollution Bulletin. Em 2004, o cientista Richard Thompson sugeriu que microplásticos fossem partículas abaixo de cinco milímetros de diâmetro. “A definição tem sido refinada, mas nunca estive muito satisfeito porque não existe uma definição que seja inclusiva de todos os polímeros, partículas, tamanhos e formas”, diz.
Agora a definição que propõe – e que pensa ser controversa na comunidade científica – incluirá a regularidade e irregularidade das formas e define um limite inferior (afinal, depois dos microplásticos há os nanoplásticos): “Qualquer partícula sólida sintética ou de matriz polimérica, que seja de forma regular ou irregular, que tenha um tamanho entre um micrómetro e cinco milímetros, que seja insolúvel em água e que tenha uma origem primária ou secundária, é um microplástico.”
Sobre as soluções para minimizar este problema, João Frias aconselha que andemos sempre com uma mochila ou saco de plástico (para não termos de o comprar no supermercado) ou que usemos garrafas reutilizáveis. Afinal, como diz: “Estamos mais do que a tempo [de solucionar o problema].”