Quem tem medo da dita ideologia de género?

Quem pugna por uma visão sobre o mundo pautada pelos pressupostos da igualdade de género orienta as suas acções rumo à superação de assimetrias estruturais que determinam a imposição acrítica de um regime binário e heteronormativo promotor, em muitos casos, de situações de opressão, de discriminação e de violência.

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Christopher Burns/Unsplash

A pergunta impõe-se, antecedida de outra. O que é a dita ideologia de género? Uma ideologia é um conjunto de pressupostos que está na base de uma determinada visão sobre o mundo e que, nesse sentido, pode servir de alicerce a um conjunto de práticas sociais. Quem pugna por uma visão sobre o mundo pautada pelos pressupostos da igualdade de género orienta as suas acções rumo à superação de assimetrias estruturais que determinam a imposição acrítica de um regime binário e heteronormativo promotor, em muitos casos, de situações de opressão, de discriminação e de violência.

Trata-se, pois, a dita ideologia de género, de uma leitura criticamente informada sobre as relações sociais de género, norteada pelo primado dos Direitos Humanos e que visa, em primeira instância, o respeito pela liberdade, pela diversidade e pela auto-determinação das pessoas, independentemente da sua identidade de género ou orientação sexual. Consequentemente, a dita ideologia de género é tão somente uma ferramenta de reivindicação de direitos e garantias fundamentais, cujo objectivo último é aniquilar qualquer manifestação de sexismo, misoginia, homofobia e transfobia, tornando possível a transformação social assente numa perspectiva emancipatória e empoderadora.

São muitas as evidências que atestam que uma sociedade desigual no que às questões de género diz respeito é uma sociedade espartilhada. Países com elevados índices de desigualdade de género revelam, entre outros, níveis mais expressivos de precariedade social e de pobreza, piores indicares de saúde e taxas mais elevadas de criminalidade contra as meninas e as mulheres, especialmente no contexto da família. Não terá sido um acaso a definição do objectivo da Igualdade de Género como um dos 17 da Agenda de Acção da ONU até 2030, almejando o Desenvolvimento Sustentável. No âmbito da formulação deste objectivo reconhece-se a necessidade de implementar mudanças políticas e legislativas que garantam a igualdade de género em todas as esferas da vida social e que ponham termo à violência que é exercida com base nas pertenças de género.

Um acaso não terá sido também o investimento que nas últimas décadas vários estados têm vindo a fazer na promoção de estratégias, planos de acção e medidas com vista à igualdade e à não-discriminação, bem como à prevenção e ao combate à violência doméstica e de género, inclusive contra as pessoas LGBTI (lésbicas, gays, bissexuais, trans e intersexo). Recorde-se que o Estado português tem actualmente vigente, e pela primeira vez, um plano de acção para o combate à discriminação em razão da orientação sexual, identidade e expressão de género, e características sexuais, no âmbito da Estratégia Nacional para a Igualdade e a Não Discriminação — Portugal + Igual (ENIND), o qual está claramente alinhado com os objectivos da Agenda 2030. Pode ler-se na Resolução do Conselho de Ministros n.º 61/2018 que “os estereótipos de género estão na origem das discriminações em razão do sexo directas e indirectas que impedem a igualdade substantiva entre mulheres e homens, reforçando e perpetuando modelos de discriminação históricos e estruturais” (p. 2221).

Quem tem medo da dita ideologia de género é a igualdade que teme?

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