Costa: Governo será "livro aberto" sobre Tancos e há convergência com Belém
António Costa garante que o Presidente da República e o Governo estão em convergência desde o primeiro dia, no que se refere a Tancos, e que o executivo nada tem a esconder sobre o assunto. Catarinas Martins lamenta "ruído" e Assunção Cristas fala em apuramento das "responsabilidades políticas" no Parlamento.
O primeiro-ministro afirmou nesta terça-feira que o Governo será "um livro aberto" para que tudo se apure e esclareça sobre o furto de armamento na base de Tancos, tanto no plano judicial, como na comissão parlamentar de inquérito.
António Costa falava no final de uma visita aos stands das startups portuguesas presentes na Web Summit, depois de questionado sobre o facto de a comissão parlamentar de inquérito ao furto de armas em Tancos entrar já em funcionamento na próxima semana.
O primeiro-ministro afirmou esperar que essa comissão parlamentar de inquérito "seja útil e que apure tudo o que é necessário apurar".
"Se na área política há algo também a apurar, que se apure e que se esclareça tudo. Pela minha parte, o Governo é um livro aberto e não tem nada a esconder", sustentou o líder do executivo.
Segundo Costa, o Governo "desconhecia totalmente que houvesse qualquer operação" e "não houve conhecimento de nada de ilegal que tenha ocorrido a posteriori, para além daquilo que hoje é público a partir da comunicação social".
Neste ponto, o primeiro-ministro frisou que há uma investigação criminal em curso, "que se deseja que seja concluída o mais rapidamente possível, que esclareça tudo e permita desde logo identificar quem roubou".
"Esperamos que permita responsabilizar, colocar na cadeia, verificar se há cúmplices e se houve outras acções de perturbação da investigação que também sejam objecto de punição. O essencial é que tudo se esclareça", completou.
Convergência e boa-fé
O primeiro-ministro salientou também que Governo e Presidente da República estão "em total convergência desde o primeiro dia" sobre o caso de Tancos e criticou quem tem, na sua opinião, procurado distorcer as suas palavras sobre esta matéria.
"Toda a gente de boa-fé interpretou bem as minhas palavras [na segunda-feira], não dei qualquer conselho ao senhor Presidente da República e, pelo contrário, sublinhei a total convergência que temos tido sobre esta matéria", declarou António Costa.
Na segunda-feira, o primeiro-ministro referiu-se à ansiedade do Presidente da República em relação à conclusão do processo de Tancos, disse que o Governo tinha de ser mais contido sobre essa matéria, mas que a ansiedade do executivo não era menor – palavras que foram interpretadas por alguns órgãos de comunicação social, como o PÚBLICO, como uma farpa ao chefe de Estado.
O primeiro-ministro rejeitou em absoluto essa interpretação. "Não vale a pena tentar colocar na minha mente aquilo que não está na minha mente, nem distorcer das minhas palavras o que as minhas palavras não permitem que seja distorcido. Não houve qualquer manifestação de divergência com o Presidente da República. Pelo contrário, repito, o que disse é que há convergência com o Presidente da República", sustentou António Costa.
Interrogado sobre o facto de Marcelo Rebelo de Sousa não ter afastado, em tese, a existência de uma crise política na sequência do caso de Tancos, o primeiro-ministro reagiu dizendo que não comenta palavras do Presidente da República.
"Digo aquilo que sei. E aquilo que sei é que, desde o primeiro dia, Governo e Presidente da República tem tido uma posição absolutamente convergente relativamente a esta matéria. Foi assim no dia em que houve conhecimento público do assalto e tem sido assim todos os dias até ao dia de hoje. E não tenho nenhuma expectativa de que Governo ou Presidente da República passem a divergir", insistiu o líder do executivo.
De acordo com António Costa, ainda a propósito do roubo de armamento na base de Tancos, "o Presidente da República tem expressado ansiedade" em relação à conclusão das investigações e "que a ansiedade do Governo não é menor".
"Obviamente, o Governo tem de agir com maior recato, mas isso não tem a ver com a actuação do Presidente da República, mas com a actuação do Governo, porque sempre que o Governo faz comentários sobre a actuação do poder judicial é imediatamente mal interpretado como sendo uma pressão. Felizmente, o Presidente da República goza da imunidade de poder fazer esses comentários sem que seja feita essa leitura", justificou o primeiro-ministro.
António Costa aproveitou mesmo para salientar que, perante o caso de Tancos, Governo e Presidente da República "partilham a mesma ansiedade, a mesma curiosidade, o mesmo sentimento da necessidade e da urgência para que tudo seja cabalmente esclarecido".
"Pela nossa parte estamos totalmente disponíveis para colaborar com quem seja necessário colaborar, Assembleia da República ou autoridades judiciárias – e confiamos na Polícia Judiciária e no Ministério Público para que leve a cabo estas investigações", acrescentou.
BE e o "ruído a mais"
Já a coordenadora do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, considerou nesta terça-feira haver "ruído a mais" e "explicações a menos" sobre o furto e reaparecimento de armas em Tancos, garantindo que não alimenta questões "disparatadas".
"Eu não colaborarei em nada para criar ruído. Houve um roubo de armas. É grave, deve ser investigado. Devemos saber tudo o que aconteceu e não esquecer o que aconteceu no meio de um nevoeiro de coisas que serão mais graves e outras que serão simplesmente disparatadas", sustentou Catarina Martins quando questionada pelos jornalistas sobre se partilha da opinião do primeiro-ministro sobre a "ansiedade" do Presidente da República.
Na Assembleia da República, foi anunciado nesta terça-feira que a comissão parlamentar de inquérito ao furto de armas em Tancos vai tomar posse no próximo dia 14.
Catarina Martins adiantou que o BE admite questionar o primeiro-ministro sobre o assunto, caso seja necessário.
CDS e as “responsabilidades políticas
A líder do CDS-PP Assunção Cristas também reafirmou nesta terça-feira que cabe à Assembleia da República apurar eventuais responsabilidades políticas no caso do furto e reaparecimento de armamento em Tancos.
"O que me preocupa, enquanto líder do CDS, é que o trabalho de escrutínio político de tudo o que se passou em Tancos é feito através de um instrumento que nós temos que é uma comissão parlamentar de inquérito, que foi iniciativa do CDS. Este é o espaço onde nós trabalhamos, é aqui que nós temos de estar focados e empenhados em descobrir tudo o que se passou e apurar todas as responsabilidades políticas", defendeu Assunção Cristas em declarações aos jornalistas.
À margem de uma visita a campos agrícolas de Montemor-o-Velho e Coimbra, na zona do Baixo Mondego, afectados pela tempestade Leslie, a presidente centrista disse não ter "razões para duvidar das declarações de ninguém", numa alusão à posição reiterada pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, de que não sabia do alegado encobrimento relacionado com o caso de Tancos.
"O meu trabalho, o nosso espaço de trabalho, é o Parlamento, é a comissão parlamentar de inquérito. E é aí que nós apuraremos tudo", sublinhou.
Questionada sobre se poderão vir a ser pedidos esclarecimentos ao Presidente da República, Assunção Cristas não respondeu directamente à pergunta.
"No Parlamento ouviremos certamente todos os responsáveis e para nós o responsável é o Governo", argumentou a líder centrista, frisando que o executivo liderado por António Costa é quem, em primeiro lugar, tem "responsabilidades sobre a política de segurança e sobre a condução das Forças Armadas" e que cabe ao à AR escrutiná-lo.
PCP: Presidente “é muito prolixo”
O secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, comentou, em Bruxelas, que "o Presidente da República é muito prolixo", mas dá razão às diversas intervenções de Marcelo a reclamar o apuramento da verdade num “processo muito nebuloso".
"O Presidente da República é muito prolixo. Enfim, se fala muito, se fala pouco, naturalmente é questionado e procurará responder, mas ainda não fiz nenhum juízo de valor sobre se fala muito ou se fala pouco, ele lá sabe. A sua posição de exigência de apuramento de verdade, de dar curso à investigação criminal, [ele] tem referido sempre essa questão, nós identificamo-nos com esse objectivo", declarou.
Jerónimo de Sousa reforçou que o apuramento da verdade é absolutamente necessário para que o caso "não se transforme num folhetim permanente sem respostas concretas".
Notícia actualizada às 15h39 com a posição do PCP