A Maldição de Hill House e Sabrina: o terror a vazar da literatura para as séries

A Maldição de Hill House já tinha saltado da literatura para o cinema e estreia-se agora em formato de série. Também Sabrina regressa à televisão num tom mais sombrio e com questões do feminismo quotidiano a sarapintarem a narrativa sobrenatural – e com um gato Salem muito menos chistoso.

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A série de terror é baseada na obra de Shirley Jackson com o mesmo nome DR
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O género de terror, que foi ocupando o seu espaço sobretudo na literatura e nos cinemas, começa a alastrar-se de forma mais vincada no universo das séries: em Outubro, a tempo do Dia das Bruxas, estrearam-se duas. Tanto a Maldição de Hill House, criada por Mike Flanagan, como Sabrina são baseadas em livros, e são mais duas séries de terror que se juntam a outras do género que foram recentemente produzidas, como American Horror Story, Black Mirror, ou Stranger Things – e também a outras mais antigas (The Walking Dead, Sobrenatural, ou Bates Motel).

Mais do que a mística por trás da casa assombrada mais famosa dos Estados Unidos, A Maldição de Hill House trata de enfrentar os fantasmas do passado – tanto de um ponto de vista metafórico como literal –, que vão sendo revelados ao longo dos episódios na dose certa. Centrada na trama familiar, a série acompanha a vida de cinco irmãos – alternando entre o presente e o passado, quando viviam com os seus pais na mansão assombrada.

O guião foi adaptado do romance com o mesmo nome (publicado em 1959) da escritora norte-americana Shirley Jackson – a mesma autora de Sempre Vivemos no Castelo e A Lotaria –, uma obra frequentemente apontada como uma referência por grandes nomes do terror e do fantástico, como Stephen King, que já admitiu que a série produzida por Mike Flanagan “é praticamente um trabalho de génio”.

As obras de Jackson vão além do seu lado tétrico e põem as mulheres em primeiro plano, desafiando as concepções do matrimónio e do lugar feminino na sociedade. Acabavam por ser a forma da escritora norte-americana se distanciar da armadilha em que ela própria admitia ter caído, uma forma de escapar da sua vida enquanto mãe de família e dona de casa.  

A Maldição de Hill House já foi adaptada duas vezes ao cinema (em 1963 por Robert Wise e em 1999 por Jan de Bont), mas passa agora dos grandes para os pequenos ecrãs, desviando-se em grande parte do enrendo original.

Sabrina e o feminismo

Já Sabrina é uma adolescente que se vê obrigada a escolher entre o mundo dos humanos e o mundo da feitiçaria. As Arrepiantes Aventuras de Sabrina é a segunda versão televisiva da história impressa nas bandas desenhadas da Archie Comics, tal como a série Riverdale – o que leva o realizador das duas séries, Roberto Aguirre-Sacasa, a ponderar um cruzamento entre as narrativas. A nova versão de Sabrina é mais sombria do que a sua verão anterior de 1996, mais leviana (Sabrina, a Bruxinha Adolescente, protagonizada por Melissa Joan Hart).

Ainda que a relação entre o feminismo e o mundo das bruxas não seja propriamente recente, a nova série de Sabrina demarca-se da anterior pondo a tónica no movimento – ainda que haja críticas de que não o esteja a fazer da forma mais correcta, cumprindo nas palavras de ordem mas falhando no conteúdo. Logo no primeiro episódio, uma das raparigas é assediada e apalpada, o que leva a personagem a deitar uns pózinhos para criar um grupo feminista de apoio na escola, enquanto vai questionando também os dogmas da comunidade feiticeira.

É o actor Ross Lynch quem dá vida a Harvey nesta versão e as tias de Sabrina – a tia Hilda é interpretada por Lucy Davis e a tia Zelda é interpretada por Miranda Otto, a Eowyn de O Senhor dos Anéis – são agora donas de uma agência funerária. E, agora, o gato Salem surge como guia da adolescente, mas só mia, não fala e surge muito menos vezes (e com muito menos audácia) do que o antigo – o que além de uma escolha narrativa pode ser explicado pela alergia a gatos da protagonista, Kiernan Shipka (a Sally Draper de Mad Men).

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