Trump renova ataques contra os media após envio de bomba artesanal para a CNN
Presidente dos EUA condenou o envio de engenhos explosivos a figuras do Partido Democrata e à CNN, mas disse que ambos têm responsabilidade no clima de divisão no país. FBI investiga envio de pacotes suspeitos a Joe Biden e Robert de Niro.
Poucas horas depois de ter condenado, na Casa Branca, o envio de pacotes com engenhos explosivos para várias figuras de topo do Partido Democrata e para a CNN, o Presidente dos EUA renovou os seus ataques contra os media durante um comício no estado do Wisconsin e, mais tarde, no Twitter. Numa semana em que se ouvem apelos ao fim do "clima de ódio" no país, Donald Trump voltou a apontar o dedo acusador aos jornalistas, dizendo-lhes que "acabem com a constante hostilidade e os ataques".
As primeiras críticas contra os media foram lançadas logo na noite de quarta-feira, quando ainda estavam a surgir notícias de que mais pessoas ligadas ao Partido Democrata tinham recebido pacotes suspeitos, para além das cinco já conhecidas: o ex-Presidente Barack Obama; a antiga secretária de Estado Hillary Clinton; o multimilionário George Soros; a congressista Maxine Waters; e o antigo procurador-geral Eric Holder. Todas estas personalidades têm em comum o facto de estarem ligadas ao Partido Democrata e de terem um passado de desavenças públicas com o Presidente Trump.
Esta quinta-feira, o FBI avançou que está também a investigar o envio de pacotes suspeitos endereçados ao antigo vice-presidente Joe Biden e a Robert de Niro. O actor tem-se destacado entre os opositores de Trump pela violência dos seus ataques – em Junho, na cerimónia de entrega dos prémios Tony, recebeu uma ovação em pé ao dizer "Fuck Trump!" E, num vídeo publicado em 2016, chamou-lhe "porco", "rafeiro", "estúpido", "cão" e "artista que não paga impostos", entre outras ofensas.
"As palavras têm influência"
O envio de bombas artesanais a várias personalidades ligadas ao Partido Democrata está a ser visto como o culminar de um ambiente de extrema divisão no país.
Do lado do Partido Democrata, mas também nos maiores jornais e cadeias de televisão, a maior dose de culpa é atirada para cima de Trump, a quem acusam de fomentar o ódio com os seus constantes ataques contra os media. Num tweet escrito no ano passado, o Presidente norte-americano chamou aos media "o inimigo do povo americano".
Mas o Partido Republicano considera que a culpa está do outro lado, e que o "clima de ódio" agravou-se quando alguns responsáveis do Partido Democrata, como a congressista Maxine Waters e o antigo procurador-geral Eric Holder, começaram a apelar a uma contestação mais forte contra os responsáveis da Casa Branca e os candidatos republicanos – incluindo deixá-los "desconfortáveis" em locais públicos.
Foi neste clima que o Presidente norte-americano comentou o envio de engenhos explosivos, numa declaração na Casa Branca, ao fim da tarde de quarta-feira. Nesse momento, Trump apelou à união no país contra acções que descreveu com "desprezíveis", mas ficou aquém do que era esperado no Partido Democrata e nas redacções da CNN, do New York Times ou do Washington Post, por exemplo – não se referiu aos destinatários dos engenhos pelos seus nomes, ainda que entre eles estejam um ex-Presidente e uma antiga secretária de Estado, dizendo apenas que os pacotes suspeitos foram enviados "a actuais e antigos altos representantes do Governo".
Apesar de apelar à união e de prometer levar os responsáveis perante a justiça, o Presidente norte-americano foi criticado pelo presidente da CNN, Jeff Zucker, por não ter admitido que também ele pode estar a contribuir para o clima de ódio no país.
"Há uma total e completa falta de compreensão na Casa Branca sobre a seriedade dos seus ataques continuados contra os media. O Presidente, e especialmente a sua porta-voz, Sarah Huckabee Sanders, deviam perceber que as palavras têm influência. Até agora, não mostraram nenhuma compreensão sobre este assunto", disse Zucker.
Media causam "grande parte do ódio"
Seis horas mais tarde, num comício num hangar na cidade de Mosinee, no estado do Wisconsin, o Presidente dos EUA voltou a fazer um comentário crítico sobre o trabalho dos media norte-americanos, depois de dizer que "nenhum país pode ter sucesso se tolerar a violência ou a ameaça de violência como método de intimidação política, de coerção ou de controlo", e de declarar que quer ver "todos os lados a viver em paz e harmonia".
"Os media também têm a responsabilidade de marcar um tom civilizado e de acabar com a constante hostilidade e as histórias e ataques negativos – e, muitas vezes, falsos", disse Trump. Segundo o relato do Washington Post, durante o comício os apoiantes do Presidente gritaram "CNN sucks!" ("A CNN não presta").
Durante o comício – o 38.º desde que chegou à Casa Branca, em 2016, e o segundo esta semana –, Trump não levantou a voz e fez questão de sublinhar que estava a controlar-se: "Estão a ver como estou a portar-me tão bem? Estamos todos a portar-nos bem. E espero que possamos continuar assim."
Esta quinta-feira de manhã, no Twitter, o Presidente norte-americano voltou a apontar o dedo acusador aos media: "Uma grande parte do ódio que vemos na nossa sociedade hoje em dia é causada pelas notícias propositadamente falsas e incorrectas dos mainstream media, que eu chamo de fake news. Isto ficou tão mau que nem é possível descrever. Os mainstream media têm de se compor, e depressa!"
Para além da crítica aos media, o Presidente norte-americano lançou também uma crítica indirecta a representantes, candidatos e eleitores do Partido Democrata – sugerindo que tanto uns como outros têm grandes responsabilidades no clima de divisão que se vive no país.
"Não devemos maltratar as pessoas em espaços públicos nem destruir propriedade privada", disse Trump, numa referência à reacção de representantes e eleitores do Partido Democrata à nomeação e confirmação de Brett Kavanaugh como juiz do Supremo Tribunal.
Um dos alvos do Presidente norte-americano é a congressista Maxine Waters, do Partido Democrata, que também recebeu um pacote com um engenho explosivo na quarta-feira. Waters entrou em confronto com Trump no Verão, depois de ter pedido aos eleitores que deixassem os membros da Casa Branca "desconfortáveis" em locais públicos. Em resposta, o Presidente chamou-lhe "louca" e repetiu a acusação, "feita por algumas pessoas", de que a congressista é "uma das pessoas mais corruptas na política".
No último mês – com a aproximação das importantes eleições para o Congresso, a 6 de Novembro –, Trump tem-se referido com insistência ao Partido Democrata como o "partido do crime", acusando os seus representantes e eleitores de serem uma "turba" mais focada em ameaçar os seus adversários políticos do que em encontrar soluções. E cunhou um termo para ser mais facilmente partilhado no Twitter: #JobsNotMobs, que serve para destacar o sucesso da economia do país e criticar o Partido Democrata.
"Os democratas não gostam de ser tratados como uma multidão furiosa, mas é nisso que eles se tornaram. Foram tanto para a esquerda que nem sequer acreditam que estão lá – nem percebem o que está a acontecer", disse o Presidente norte-americano num vídeo publicado no dia 19 de Outubro.
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