Eleições simultâneas são “indutor de participação”
O investigador João Cancela, co-autor do estudo A abstenção em Portugal: diagnóstico e soluções, considera que o cenário de voto obrigatório ou remoto não é “muito plausível”.
Quais as principais conclusões do estudo?
Ao contrário das décadas anteriores, as gerações menos propensas a votar não são apenas as mais jovens (menos de 30 anos), mas também o grupo dos 30 aos 44 anos. Isto indicia que muitos dos eleitores que se têm abstido nas primeiras eleições em que podem votar nunca chegam a adquirir o hábito de participar. [Outro] ponto a reter é que, nos debates sobre a participação eleitoral, os valores de abstenção devem ser devidamente contextualizados, apresentando de forma clara as limitações das metodologias.
Como evoluiu a abstenção em Portugal em comparação com outros países?
Se, nos primeiros anos do regime democrático, as eleições portuguesas apresentavam valores de participação dos mais altos entre os países democráticos, nos últimos anos essa posição inverteu-se, apresentando hoje valores comparativamente baixos no plano europeu. Mesmo descontando que a participação efectiva dos residentes em território nacional possa estar algo subavaliada devido ao grau de actualização dos cadernos eleitorais (por óbitos e migrações) a queda é expressiva. Esta evolução assemelha-se mais às de novas democracias que emergiram no espaço de influência soviética do que às das democracias estabelecidas na Europa ocidental.
Que medidas poderiam combater a abstenção em Portugal?
A obrigatoriedade da participação ou o voto remoto electrónico não se afigura muito plausível, por constrangimentos políticos e constitucionais (no que toca à obrigatoriedade do voto) e por questões relacionadas com a integridade da eleição e a garantia da confidencialidade (voto remoto). Sabemos que a realização de eleições no mesmo dia é um indutor de participação. As eleições para o Parlamento Europeu de 1987 realizaram-se em simultâneo com as legislativas e foram, por larga margem, as mais participadas em Portugal (no que toca a europeias). Medidas já adoptadas na Dinamarca, Nova Zelândia, Noruega ou EUA, que poderão ser equacionadas no caso português, incluem a flexibilização do exercício do voto antecipado, [com] possibilidade de voto em locais como centros de dia ou universidades. A intervenção junto de grupos específicos, como os mais jovens, antes de atingirem a idade de voto, pode fazer a diferença.