A noite em que a essência do futebol não entrou no estádio
Sem golos e, acima de tudo, sem adeptos nas bancadas, o Croácia-Inglaterra foi um manifesto de falta de inspiração. Para ainda sonharem com a final four, as duas selecções vão ter de fazer bem melhor.
Em Rijeka, não houve manifestações de descontentamento vindas das bancadas quando Kramaric finalizou da pior forma duas jogadas construídas com critério. E o mesmo aconteceu, do lado contrário, com Rashford, que não teve de enfrentar os assobios dos compatriotas quando falhou um par de oportunidades isolado. O Croácia-Inglaterra, do Grupo 4 da Liga A, a contar para a Liga das Nações, terminou como começou. Sem golos e sem adeptos.
Gareth Southgate, seleccionador britânico, já tinha antecipado um cenário invulgar, vislumbrando uma vantagem ligeira para a sua equipa: “Será uma experiência estranha. Uma situação destas, num jogo internacional... É uma pena, por causa dos nossos adeptos, mas isto também significa que a Croácia não terá a energia que o apoio em casa consegue garantir nestes momentos”, assinalou antes da partida.
Foi a primeira vez na longa história da selecção de Inglaterra que disputou um encontro oficial à porta fechada, mas a Croácia não pode dizer o mesmo. O desenho de uma cruz suástica no relvado, numa partida de qualificação para o Euro 2016 diante da Itália, em Split, valeu à agora vice-campeã mundial um castigo de dois jogos à porta fechada, imposto pela UEFA. O primeiro foi cumprido diante da Bulgária, em Outubro de 2015 (triunfo por 3-0, em Zagreb), o segundo ficou adiado para a noite desta sexta-feira.
O pequeno estádio do Rijeka, com capacidade para cerca de 8200 espectadores, desta vez foi demasiado grande. Durante 90 minutos, imperou o silêncio, faltou cor nas bancadas, sentiu-se a ausência dos gritos de incentivo. Foi assim aos 35’, quando Kramaric falhou a emenda a cruzamento perfeito de Pivaric, e voltou a ser assim aos 44’, quando Eric Dier, de cabeça e na sequência de um canto, acertou no poste da baliza da Livakovic.
Poucas vezes se ouve com tanta nitidez a bola a ser devolvida pelo ferro e o cenário repetiu-se aos 50’, graças a um cabeceamento violento de Harry Kane que esbarrou na trave da baliza croata. Era uma fase de maior domínio britânico, com a equipa, desta vez, disposta em 4x3x3 (em vez de utilizar o sistema com três defesas que resultou no Mundial), a ficar muito perto do golo. E só não o conseguiu porque Marcus Rashford foi medíocre na finalização: isolado por um passe de Kyle Walker, aos 54’, rematou frouxo de pé esquerdo; isolado novamente aos 57’, repetiu a dose de pé direito, para defesa do guarda-redes do Dínamo Zagreb.
Estava mais do que visto que o jogo haveria de passar à história sem muito para contar, até porque do lado contrário Kramaric voltou a concluir de forma desastrada uma oportunidade criada pela esquerda (68’). No banco, Zlatko Dalic deve seguramente ter sentido muitas saudades de Mario Mandzukic, que anunciou o adeus à selecção depois do Campeonato do Mundo, em Agosto.
Com Espanha lançada para o triunfo no grupo (lidera com seis pontos, contra um de Croácia e Inglaterra), resta às duas equipas que se anularam em Rijeka rezarem praticamente por um milagre nas duas próximas jornadas, por forma a sonharem ainda com a final four. Os croatas, pelo menos, já poderão, no dia 15 de Novembro, contar com o apoio tradicionalmente entusiasta dos seus adeptos, quando receberem a selecção espanhola. Que é como deve ser.
“Um jogo de futebol deve ser disputado perante uma multidão”. “Não vejo qualquer benefício neste cenário. O futebol joga-se com adeptos no estádio”. Palavras de Bruno Génésio e Paulo Fonseca, treinadores do Lyon e do Shakhtar Donetsk, que recentemente disputaram a 2.ª jornada da Champions, em França, também com todas as cadeiras do estádio disponíveis.