Festival DocLisboa diz ter sido pressionado pelas embaixadas da Turquia e Ucrânia
Programação da edição de 2018 inclui três filmes que desagradaram às representações dos dois países em Portugal: um filme em que se fala dos curdos e outro de genocídio arménio, e um documentário sobre um batalhão militar russo.
A direcção do festival de cinema DocLisboa disse quinta-feira à agência Lusa ter sofrido pressões por parte das embaixadas da Ucrânia e da Turquia por causa da programação deste ano, que começa no dia 18.
Segundo Cíntia Gil, uma das directoras do DocLisboa, o festival foi pressionado pela embaixada da Ucrânia em Portugal a retirar da programação o filme Their own Republic, de Aliona Polunina, seleccionado para a competição internacional, alegando que "dá voz a uma organização terrorista".
Na carta, divulgada pela embaixada na rede social Twitter, a embaixadora Inna Ohnivets lamenta que o DocLisboa tenha decidido exibir um filme que "é uma demonstração de apoio ao terrorismo", porque se debruça sobre o batalhão 'Vostok', "uma formação armada ilegal das Forças Armadas da Federação Russa".
"Considero que o filme de Aliona Polunina é uma prova de apoio desta à política agressiva do Kremlin a respeito da Ucrânia", lê-se na carta, enviada à direcção da associação Apordoc, que organiza o DocLisboa, e à administração da Culturgest, uma das salas que o acolhe.
Cíntia Gil revelou ainda que o DocLisboa se reuniu com uma representante da embaixada da Turquia, a pedido desta, porque nas sinopses de dois filmes (Yol: The Full Version e Armenia, Cradle of Humanity) surgem as expressões "aniquilação do povo curdo" e, referindo-se à Arménia, "local de um dos genocídios mais violentos do século passado".
"O DocLisboa não é um festival neutro, temos uma posição política e não aceitamos interferências. É a primeira vez que me lembro de este tipo de situações acontecer. Fazemos um aviso e não uma denúncia, e convidamos os responsáveis a participarem nos debates, no final de cada filme", disse Cíntia Gil à agência Lusa.
Segundo Cíntia Gil, a representante turca não pediu para retirar os filmes, mas sim aquelas sinopses que surgem na programação.
A agência Lusa tentou obter quinta-feira, ainda sem resposta, um esclarecimento por parte da embaixada da Turquia em Lisboa. Em comunicado divulgado quinta-feira, o DocLisboa recorda que foi criado para "promover e divulgar a cultura do cinema documental, na sua liberdade, diversidade e força testemunhal".
"O Doclisboa é inteiramente livre, autónomo na sua programação, e esta equipa continuará a lutar para que assim seja. Apenas temos como parceiros entidades que respeitam os valores que também defendemos, e que são os valores da democracia, da livre expressão, e da justiça", lê-se no comunicado.
A 16ª. edição do DocLisboa, festival de cinema dedicado ao documentário, decorrerá de 18 a 28 de Outubro, em várias salas da capital.