Um distrito suspenso pela construção da Barragem do Pisão
Já lá vão quase 80 anos desde que se começou a falar na construção da barragem do Pisão. O Governo diz que não vale a pena gastar dinheiro numa obra para abastecimento público. Autarcas e associações falam desta valência, mas sobretudo da rega e também da hidro-eléctrica, do turismo, do emprego e da destruição do distrito através da desertificação.
O primeiro-ministro, António Costa, recebeu na passada segunda-feira um documento enviado por dezenas de autarcas, empresários e pelos deputados eleitos pelo distrito de Portalegre. Nessa missiva, baseada em diversos estudos, dá-se conta da iminência de o distrito baixar da fasquia dos 100 mil habitantes e aponta-se como tábua de salvação daquela que já considerada uma das zonas mais deprimidas da Europa comunitária, a construção da Barragem do Pisão, no concelho do Crato.
O documento que Costa irá apreciar e cujo conteúdo também já é do conhecimento do ministro do Ambiente, será agora alvo de estudo por parte dos membros do Governo, os quais deverão pronunciar-se em relação à obra durante o mês de Outubro.
O PÚBLICO teve acesso ao memorando entregue ao Governo e, entre os muitos aspectos analisados, há um que chama a atenção por considerar que o Alto Alentejo é neste momento “uma bomba-relógio” que pode detonar a qualquer momento caso a desertificação não seja estancada ou invertida, mediante a modernização da região e consequente criação de estruturas, como é a Barragem do Pisão.
Citando números do Instituto Nacional de Estatística (INE) de 2017, é revelado que o distrito conta apenas com 107 mil habitantes (perdeu quase 11.500 entre 2001 e 2011) e que dos 15 concelhos existentes, apenas cinco possuem mais de 5000 residentes. A estes valores juntam-se outros igualmente depressivos, como o facto de por cada 100 jovens existirem 235 idosos, para se dar uma tonalidade negra ao panorama de Portalegre e, em simultâneo, alertar para a necessidade de construir a barragem que está projectada desde a década de 1940.
No dia 19, no decurso do segundo congresso do Movimento Cidadania Melhor Alentejo, realizado em Portalegre, o ministro do Ambiente, João Matos Fernandes, não se comprometeu com a construção da barragem, afirmando mesmo que o Estado não prevê gastar dinheiro com projectos hídricos cuja única finalidade seja o abastecimento público, mas também não fechou a porta, remetendo uma decisão final para o que resultar da troca de impressões entre todos os membros do Governo chamados a pronunciar-se sobre o projecto.
Para os autarcas alentejanos, sobretudo para o presidente do Município do Crato, Joaquim Diogo, e para o presidente da Comunidade Intermunicipal do Alto Alentejo (CIMAA), Ricardo Pinheiro, é evidente que a barragem do Pisão não serve apenas para o abastecimento público uma vez que tem uma componente de regadio que abrange quase dez mil hectares e que poderá criar cerca de 500 empregos directos. Além disso, nos estudos e projectos já realizados, está sempre contemplada a construção de uma pequena unidade hidro-eléctrica.
“Pode dar origem a uma zona turística demarcada, com especial incidência no turismo de natureza e património, o qual associado à gastronomia pode gerar novas dinâmicas em todo o distrito”, refere o autarca cratense. Já o presidente da CIMAA lembra que a barragem pode também levar ao surgimento de agro-indústrias, ao fomento da agro-pecuária e silvicultura e a uma grande revitalização do ensino na região, uma vez que associados à Agricultura estão sempre estabelecimentos, como a Escola Agrária de Elvas, ou a Escola Agrícola de Alter do Chão, que potenciam a qualificação profissional das novas gerações.
Barragem ameaça ruptura
Apesar dos autarcas do distrito de Portalegre — e são os presidentes das 15 câmaras municipais e diversas associações de regantes e agricultores que têm tomada a defesa do novo empreendimento — salientarem que o abastecimento de água às populações não é o único objectivo do Pisão, é indesmentível que este aspecto pode vir a ser determinante a curto prazo. É que a Barragem de Póvoa e Meadas, uma das mais importantes no Norte Alentejano, apresenta actualmente graves danos na sua estrutura, perdendo não só grandes quantidades de água como ameaçando mesmo o colapso de alguns troços.
Neste momento, de acordo com os estudos da Águas do Norte Alentejo (ADA), as alternativas para substituir a Póvoa e Meadas no abastecimento público, são Cedillo, em Espanha, com um custo de oito milhões de euros, e o Açude do Poio, cuja qualidade da água é de muito fraca qualidade.
Os autarcas alentejanos, que afirmam não existir qualquer impedimento ambiental que impeça a construção do empreendimento no leito da Ribeira de Seda, nas imediações da aldeia de Pisão, Crato, salientam ainda a importância da barragem no complemento do regadio a cargo da Associação de Regantes do Vale do Sorraia, uma vez que a Barragem do Pisão servirá de complemento aos sistemas de rega do Maranhão e Montargil.