Transgénero
A vida de Alexya Salvador é um acto político
Alexya Salvador cresceu na região metropolitana de São Paulo, no seio da Igreja Católica. “Era o único lugar onde não apanhava”, conta. Na escola era discriminada e vítima de violência física por ser diferente. Naquela altura, Alexya era ainda Alexander e tentou contrariar essa diferença. Aos 19 anos ingressou no seminário com o objectivo de se tornar padre. Quatro anos depois, desistiu. Também dentro da igreja começou a ser vítima de violência psicológica e “espiritual”. Uma noite, já estudante de Filosofia em Campinas, no estado de São Paulo, cruzou-se pela primeira vez com um grupo de de travestis e pensou: “Eu sou isso.”
A transição só chegaria aos 28 anos. Pela mesma altura, Alexya e o marido, Roberto, decidiram casar e procurar uma igreja que consentisse o casamento entre uma mulher transgénero e um homem. Foi assim que encontrou a Igreja da Comunidade Metropolitana, em São Paulo, onde foi ordenada pastora há sete anos. “Nós não somos uma igreja exclusivamente para a população LGBT, somos a igreja de todos os excluídos”, explicou à Revista brasileira Fórum. Alexya encontrou um lugar onde pertencia.
Agora, quer levar a batalha da integração a outro patamar, já nas próximas eleições presidenciais, legislativas e regionais de 7 de Outubro no Brasil. Ela é candidata a deputada estadual em São Paulo, pelo PSOL (Partido Socialismo e Liberdade). “Só o facto de eu ser uma pessoa transexual no país que mais mata travestis e transexuais no Mundo é o maior acto político que eu podia exercer”. De acordo com a Associação Nacional de Travestis e Transexuais brasileira (Antra), em 2017 foram assassinados 179 transexuais, o valor mais alto da última década. A expectativa de vida de um transexual no Brasil é de 35 anos, menos da metade da média nacional, 75.
Alexya Salvador diz muitas vezes ser a candidata da contradição. É pastora evangélica cristã, mas está no extremo oposto das posições ultraconservadoras das igrejas evangélicas que têm 93 deputados no Congresso, entre bispos e pastores, e que têm atacado a comunidade LGBT. É também voz dissonante do candidato presidencial que lidera as sondagens mais recentes da corrida eleitoral, Jair Bolsonaro, rosto da extrema-direita conhecido pelas declarações homofóbicas e racistas.
Em Mairiporã, cidade onde cresceu, Alexya é hoje professora de Português e Inglês. É na sala de aula que começa o primeiro combate contra o preconceito, tanto junto dos alunos como dos pais: "Falar de género não é falar de sexo, é discutir a condição humana", disse à Reuters. Alexya encontra força na sua família: no marido, Roberto (professor como ela), e nos dois filhos adoptivos de 11 anos. Gabriel é uma criança com necessidades especiais e Ana Maria é transgénero, como a mãe. Alexya foi a primeira mulher transexual no Brasil a adoptar uma criança transgénero. “Hoje eu sei que a minha filha vai poder fazer o que eu não pude quando era uma criança na década de 80”.