A “actriz mais famosa da China” desapareceu sem deixar rasto
Desde Junho que ninguém sabe nada de Fan Bingbing. A actriz desapareceu depois de ter sido acusada de evasão fiscal.
Fan Bingbing é uma das actrizes chinesas mais bem pagas e a mais famosa do país, segundo a revista Time. A uma carreira de sucesso na China soma participações em grandes produções internacionais como a saga X-Men, bem como trabalhos de publicidade para marcas de luxo como a Cartier e a Louis Vuitton. É uma cara reconhecível em qualquer canto do país e, no entanto, ninguém a vê desde Junho. Desapareceu sem deixar rasto pouco tempo depois de ter sido acusada, por um apresentador de televisão, de fugir aos impostos.
A actriz conta com mais de 62 milhões de seguidores na rede social Weibo, o equivalente chinês ao Twitter. Participava activamente nesta e noutras redes sociais e respondia com frequência aos seus fãs. Mas isso já não acontece há três meses, data da última publicação (e aparição de pública) de Fan, aquando da visita a um hospital infantil no Tibete.
Desde então, silêncio absoluto. Fan, de 36 anos, tinha sido escolhida para contracenar com Jessica Chastain, Lupita Nyong’o e Penelope Cruz, no filme 355, que se encontra em fase de pré-produção. Mas, tanto quanto se sabe, está incontactável.
A 6 de Setembro, um artigo no jornal estatal Securities Daily veio adensar o mistério. A notícia, rapidamente apagada, dava conta de que Fan estaria sob "custódia" estatal e a preparar-se para ser julgada, cita a CNN. Mas não se conhecem os possíveis crimes de que estará acusada e não há nenhum comunicado oficial das autoridades.
Mas há quem estabeleça uma ligação entre o desaparecimento da actriz e uma acusação feita pelo apresentador de televisão Cui Yongyuan. Em Maio, colocou a circular dois contratos, supostamente assinados por Fan, para um filme de produção chinesa: um onde se lê que a actriz iria receber 10 milhões de yuan (cerca de 1.5 milhões de dólares) e outro onde o valor sobe para 50 milhões de yuan (7,5 milhões de dólares). São contratos duplos, conhecidos na China como contratos ying-yang — um falso, com um valor baixo, para apresentar ao fisco, e um segundo verdadeiro, com o valor real auferido.
Os representantes de Fan negaram veementemente as acusações na altura, mas as autoridades terão iniciado uma vasta investigação aos contratos dos principais artistas chineses. Um produtor de um dos maiores estúdios de cinema chineses, que aceitou falar com a CNN sob anonimato, disse que a prática dos contratos ying-yang é “universal” naquela indústria. “Quase todos os contratos têm alguma irregularidade”, afirmou.
Na Austrália, um antigo colaborador de Fan, Fergus Ryan, também relaciona o desaparecimento da actriz com a denúncia de fuga aos impostos: "As provas foram publicadas à vista de todos, colocando as autoridades numa posição em que foram obrigados a ser duros com ela”.
Ryan não crê que haja motivos políticos para o desaparecimento, admitindo que tentou no passado que Fan se envolvesse mais em causas ambientais (que na China são indissociáveis de causas sociais e políticas), mas dizendo que esta e a sua entourage sempre evitaram enfurecer o Partido Comunista.
“Se és um multimilionário, claro que é algo que podes aproveitar até certo ponto, mas terás de ser muito muito cuidadoso para não se cruzar uma espécie de linha vermelha e incomodar o Partido Comunista chinês”, disse.
Em Setembro, uma universidade estatal chinesa publicou um relatório onde avaliava o nível de “responsabilidade social” de várias figuras mediáticas do país. Fan aparecia no último lugar, avaliada com zero numa escala de 0 a 100. Será mais um sinal de que a actriz caiu mesmo em desgraça perante o regime de Pequim.
O caso tem precedentes. Em 2011, Ai Weiwei, o conhecido artista plástico chinês, esteve desaparecido durante três meses até se saber que estava detido. Acabou por ser libertado após ter assinado uma confissão em que afirmava ter participado num esquema de evasão fiscal.
Têm-se também multiplicado casos de editores desaparecidos e mais tarde encontrados sob custódia das autoirdades chinesas. Em 2016, desapareceram durante cinco meses Lui Por, Cheung Chi-ping, Lam Wing-kee e Lee Bo, editores de obras críticas do regime de Pequim.