BE mudou de léxico, escondeu o mupi e caiu nas sondagens

O caso Robles fez o Bloco entrar num período de luto e descer nas intenções de voto

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Catarina Martins e Ricardo Robles, uma dupla que não voltou a aparecer junta desde que o ex-vereador lisboeta se demitiu Mário Lopes Pereira

O mupi com o slogan “Parar os despejos, mudar a lei, combater a especulação” tinha sido lançado três semanas antes do escândalo Robles. Foi imediatamente retirado das ruas. Do léxico do Bloco saiu a expressão “especulação imobiliária”: nenhum dos 80 debates do Fórum Socialismo, no passado fim-de-semana, foi dedicado à especulação imobiliária (embora houvesse um sobre habitação).

Na rentrée do partido, Catarina Martins também passou ao lado do tema “especulação imobiliária”, referindo-se apenas, num parágrafo, “ao problema da habitação”. E se esta quinta-feira, no Parlamento, Mariana Mortágua assumiu a habitação como a primeira prioridade do Bloco para a próxima sessão legislativa, também evitou falar em “especulação imobiliária”. Depois de ser tornado público que o vereador eleito do BE para a Câmara de Lisboa, um grande crítico da especulação imobiliária, tinha estado à beira de realizar uma mais-valia de mais de quatro milhões de euros na venda de um imóvel, a expressão tornou-se tóxica.

As tentativas de contenção de danos falharam. Se o partido ainda se encontra numa espécie de “período de nojo”, o eleitorado, segundo a mais recente sondagem, penalizou-o – o BE já está atrás do CDS e umas décimas só acima da CDU. Abandonou a confortável casa dos 9% para estacionar na mais temível marca dos 7%.

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O Bloco, oficialmente, não comenta. Para o politólogo André Freire, o “episódio Robles” foi “bastante problemático e duro” para o BE, mas foi um caso de “curta duração”, “ainda que muito mediatizado” que deverá esfumar-se com o passar do tempo. Mas há o risco de voltar à ribalta e até por culpa do BE.

“Não sei exactamente que efeito terá tido sobre o conjunto dos portugueses, mas foi muito complicado para o partido e notório para os que acompanham mais de perto a política, pois contrariou uma política contra a qual o BE se batia. Embora problemático foi também um episódio de curta duração, ainda que muito mediatizado, que acho que se vai esbater com o tempo”, avalia o professor de Ciência Política no ISCTE.

André Freire acredita que o caso Robles tenha feito o BE mudar de discurso ou de políticas. “No princípio o BE oscilou, mas acabou por reagir logo a seguir. Ricardo Robles foi afastado e vai acabar por ser mitigado. Por outro lado, fez o BE pensar sobre a sua forma de fazer política, muitas vezes demasiado assertiva e a roçar o moralista.”

Embora ache que o caso se vai esbater, André Freire acha que “não está morto” e “pode voltar à ribalta se a comunicação social trouxer a público novos dados”, ou “se os outros partidos pegarem nele”. “Se o Bloco de Esquerda continuar a fazer entradas mais assertivas e moralistas, é natural que os outros partidos lembrem o episódio Robles. Isso será um problema, caso contrário vai esbater-se até às eleições do próximo ano. Já ouvi membros do BE falarem na vinda de campanhas sujas, mas não sei o que querem dizer com isso”, conclui.

O discurso de Francisco Louçã no Socialismo 2018, a admitir que as próximas eleições seriam marcadas por “campanhas sujas” – e referindo que tinham tido início neste Verão – não é partilhado por toda a direcção do Bloco de Esquerda. Afinal, depois de uma primeira hesitação e teorias da cabala, Ricardo Robles demitiu-se e Catarina Martins assumiu que a Comissão Política, ao ter mantido a confiança política em Robles na noite em que rebentou o escândalo, tinha cometido “um erro de avaliação”.

O Bloco espera que daqui a um ano a questão esteja esquecida e as sondagens que evidenciam a queda possam ser invertidas. Espera também que o novo vereador, Manuel Grilo, número três da lista, se consiga impor no executivo camarário. Rita Silva, que era a número dois, recusou substituir Robles por ser contra o acordo com o PS. Contactada pelo PÚBLICO, Rita Silva não quis comentar nem a queda das sondagens nem o Verão tremendo. “Já disse o que tinha a dizer na altura e não quero falar mais sobre isso”, afirmou.

E o que disse na altura (31 de Julho), numa publicação no Facebook, a também dirigente do colectivo Habita (uma associação que se bate pelo direito à habitação), foi um conjunto de críticas muito duras à política de habitação levada a cabo pela autarquia alfacinha, que acabam por sobrar também para o BE. “A Câmara Municipal de Lisboa tem aderido, ao longo dos anos, ao papel de empreendedora de negócios na cidade, em detrimento do seu papel regulador e redistributivo”, criticou.

Mais: “O governo de Lisboa, com vários anos de PS, promoveu, e continua a ter como eixo central da sua política, processos de neoliberalização da cidade e a subordinação a grandes interesses imobiliários (…) A habitação e a cidade enfrentam hoje problemas profundos, com a total subordinação ao mercado, ao valor de troca, onde dimensões fundamentais da nossa vida, do nosso habitar, se reduzem a negócio especulativo a processos de exclusão e de desigualdade.”

Foi a última vez que alguém do BE falou de forma tão dura sobre a política de habitação em Lisboa. Ricardo Robles desapareceu de circulação e não foi visto na rentrée do Bloco onde era presença habitual. Dentro do partido, há quem defenda a criação de uma malha mais apertada para os candidatos – provavelmente a debater na convenção marcada para Novembro – para evitar que casos como o de Robles se repitam. Mas não há medidas concretas ainda sobre a mesa.

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