Festa do Avante, realização cultural do povo

Podemos ter opiniões diferentes, militar até em diferentes partidos, mas não nos pode ser possível, enquanto país, auto-censurar uma festa que faz parte da vida de milhares de portugueses.

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Paulo Pimenta

Pode ser-se militante do Partido Comunista Português (PCP) ou não. O que é certo é que quem passa pela Festa do Avante não fica indiferente à manifestação criativa e cultural dos milhares que por lá mostram o melhor do nosso país — e fora dele. A Festa já conta com mais de quatro décadas, já foi no Alto da Ajuda e está hoje firme na Quinta da Atalaia, enraizada na vida dos portugueses. Este ano realiza-se nos dias 7, 8 e 9 de Setembro e promete um banho de cultura e comprometimento com os mais nobres desígnios culturais do país.

Não se pode ignorar a história de uma festa onde Zeca e Zé Mário Branco cantaram, onde ainda este ano Sérgio Godinho e Jorge Palma marcam presença, bem como muitos homens e mulheres que cantaram Abril e que podem, naquele palco que adopta o nome da revolução, dar vivas à liberdade. Esta festa leva muitos milhares a atravessar a Ponte 25 de Abril para poderem passar um fim-de-semana onde tudo é feito pela valorização dos saberes do nosso povo e das suas diferentes regiões que, através das várias organizações, realizam a maior mostra nacional de cultura, gastronomia, artesanato e tradições — e para onde levam também as suas aspirações.

Mesmo passados mais de 40 anos de Festa, ainda há quem a associe a um festival de verão, apenas mais um que vem abanar a monotonia do Verão português. Não podiam estar mais longe da realidade, desde logo porque é construída pelos militantes e amigos do PCP ou por amigos da festa que por lá vão passando para ajudar no que podem, para erguer as dezenas de pavilhões, dezenas de palcos e espaços dedicados a diferentes vertentes da vida nacional. É bom que se diga que ali não há voluntários, não queiramos misturar o que não é misturável, tendo em conta que há uma linha enorme que separa o voluntariado da militância ou compromisso.

É uma festa da juventude, que por ali se reúne na “Cidade da Juventude” a debater futuro, debater a vida, mas também vivê-la e sonhá-la em conjunto, ao mesmo tempo que se erguem copos ao som dos artistas que ali dão cor às tardes e noites de Verão. É uma festa onde todos têm lugar, mais espaço houvesse e mais caberiam, para celebrar colectivamente a vida de um país que ali é tão genuinamente representada.

Não faltam razões para ir até à Festa do Avante, desde o cartaz musical riquíssimo, ao cinema, ao teatro, ao folclore, à dança e à declamação. Uma programação que aposta na diversidade, mas também na intervenção, porque, afinal de contas, é o maior evento político-cultural da Europa.

A Festa conta também com uma feira do livro, com alguns anos de história, onde já foram expostos milhares de títulos de centenas de editoras. É claro que nas semanas que antecedem este evento são várias as formas que muitos utilizam para manchar o prestígio da organização e do partido que a organiza. Este ano, a polémica é sobre o livro de Luaty Beirão, que não foi contemplado na lista das obras a marcar presença. O PCP já emitiu um comunicado a explicar que a organização e consequente selecção de títulos fica a cargo de uma editora, encarregue de organizar todo o processo, mas, mesmo que assim não fosse, não achariam estranho que fosse exposto um livro de Manuel Tiago (Álvaro Cunhal) na festa do Pontal? Ou que o CDS vendesse O Capital de Karl Marx nas suas sedes?

Não criemos uma polémica onde nada existe, visto que se há algo que nunca poderemos de deixar de atribuir ao PCP é a coerência, que vê o seu reflexo prático nesta não-polémica. Podemos ter opiniões diferentes, militar até em diferentes partidos, mas não nos pode ser possível, enquanto país, auto-censurar uma festa que faz parte da vida de milhares de portugueses e que todos os anos leva para a beira Tejo o sonho de um Portugal melhor.

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